Equivocos da democracia portuguesa - 105
À medida que o tempo avança vai-se percebendo melhor o que aconteceu com a assinatura do "segundo" acordo com a "troika" que saiu da reunião do Ecofin. Parece certo que os países do norte impuseram a redução dos prazos para Portugal, para justificar junto dos seus eleitores a ajuda, e porque sentem apreensão sobre a possibilidade de Portugal não cumprir o acordado. Aliás, algumas críticas já surgiram desse campo, nomeadamente, quando afirmam que acham estranho Portugal ainda não ter nomeado um alto-comissário independente para ir preparando os "dossiers", dada a fase de campanha eleitoral entre nós. Mas a situação torna-se ainda mais preocupante quando vemos a Irlanda que ainda não tem um ano do acordo que fez com as mesmas entidades e já está a pedir um reforço do empréstimo. Depois do colapso anunciado da Grécia, as dificuldades estão a bater à porta da Irlanda. E Portugal como vai ser? Esta é a interrogação que todos colocamos. Somos dos que acham que os portugueses devem estar informados e avisados das dificuldades que virão por aí. Mas não concordamos com este "terrorismo informativo" que está a assustar as populações. Pensamos que por vezes, a comunicação social deveria ser um pouco mais positiva para que as pessoas encarassem com mais naturalidade as dificuldades por que vão passar. Sabemos que isso não vende, mas pensamos que seria bem melhor para o nosso país. Das dificuldades ninguém nos livra, então, porque deveremos estar ainda a assustar mais as populações sobre algo que é inevitável, em vez, de lhes darmos o lado mais positivo e a coragem necessárias para enfrentar o problema? Dos políticos nem uma palavra, a menos que isso sirva para achincalhar o adversário, mas quanto ao essencial, parece que nenhum está interessado em falar. Mas para aqueles que acham que o problema é só português deixem que vos digamos que ontem, a AMF (Autorité des Marchés Financiers) - que é a congénere da nossa CMVM - afirmava em relatório que "a crise da dívida soberana na Europa agravou o risco do sector financeiro". E para aqueles que diziam que Portugal seria o único país em recessão na Europa e no mundo, e o único que voltaria a ela depois de lá ter saído, não devem ter ficado muito confortáveis quando, também ontem, souberam que a Dinamarca também entrou em recessão. (Curiosamente a comunicação social não lhe deu nenhum destaque, porquê?). A Dinamarca!!! Para quem conhece este país como nós, seria impensável vermos a Dinamarca a entrar em recessão depois dela ter saído no 3º trimestre do ano transacto. A diminuição do PIB, que a tal conduziu, foi induzida pela diminuição do consumo e pela diminuição do investimento em activos fixos. Quem diria? Isto só vem provar que a Europa está mal, está a atravessar grandes dificuldades e está a ser incapaz de ser solidária o suficiente para obstar a esta situação. A crise portuguesa não é só nossa, vem influenciada pelo exterior por mais que desagrade a alguns que agora chegaram à política. Daí, quando vemos alguns candidatos a afirmar que "a "troika" quer a queda do governo", quando vemos o líder do PSD precisar de invocar o FMI para se legitimar, algo vai mal na política portuguesa. A ideia peregrina do alto-comissário (a que a UE deu eco, como atrás referimos) para preparar os dossiers para a aplicação do programa da "troika" é também algo de bizantino. Sócrates e até Portas convergiram na afirmação de que o alto-comissário seria o governo saído das próximas eleições. Um dirigente do PSD - António Martins - dava a entender, em entrevista à SIC, que Passos Coelho não tem falado acertadamente, mas justifica que isso deriva da sua inexperiência. Se é inexperiente, como pode vir a ser o PM em conjuntura tão difícil? Assim vamos, Portugal e todos nós, neste carrocel de insultos em que a campanha eleitoral se transformou, porque se calhar, nada mais tinham para dizer, numa campanha vazia de ideias e de sentido. Estas eleições poderão vir a tornar-se num dos maiores embustes da nossa democracia, porque quem for eleito - seja lá ele quem for - terá que aplicar um plano já anteriormente definido, isto é, o plano da "troika". E não basta vir com a ideia de que se vai renegociar tudo, ou sequer, uma parte substancial. As eleições apenas servem para sabermos qual o rosto que vai aplicar este programa e nada mais. O resto é "folclore" e o esbanjar do dinheiro dos contribuintes - de todos nós - numas eleições sem sentido, para a qual fomos empurrados pela ignomínia de alguns e irresponsabilidade de outros.
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