Turma Formadores Certform 66

Monday, May 26, 2014

Uma Europa em desespero

Mais umas eleições, desta feita europeias, e mais uma originalidade da nossa democracia. Todos são vencedores. Os que venceram porque tiveram mais votos, os que ficaram em segundo porque perderam por poucos, os outros porque tiveram afinal mais deputados, enfim, ninguém saiu derrotado. Se a nossa democracia tem originalidades esta é a maior delas porque assim, todos ficam satisfeitos. Antes já tínhamos assistido a uma campanha, ela também "sui generis", onde o debate sobre a Europa esteve, substituído pelo ataque soes, o insulto velado, os atentados ao caráter, enfim, tudo aquilo que de mais baixo pode existir em política. Depois foram os embustes. O maior deles foi o de Marcelo Rebelo de Sousa que gelou os seus companheiros quando disse que não votava em nenhum dos que lá estavam mas que votaria na coligação apenas e só por Juncker, que, tal como Schultz, não vão a votos. Isto só faz sentido por alguém que tem ainda ambições políticas e que precisa do partido para as concretizar. O outro foi o de se tentar passar a ideia de que estas eleições seriam para eleger também o presidente da Comissão Europeia. Nada mais falso porque mesmo com a vitória anunciada do Partido Popular Europeu, isto não significa que seja das suas fileiras que sai o homem que vai substituir Durão Barroso. O Partido Popular Europeu e o Partido Socialista Europeu, no essencial, votam em conjunto. Daí não haver, geralmente, qualquer conflitualidade política. Merkel preside a um governo que é uma coligação que reúne o Partido Popular Europeu e o Partido Socialista Europeu, daí que ela saiba que é do seio desta coligação que irá sair o futuro presidente da Comissão Europeia. E convenhamos, que é a sua voz que mais vai determinar aquilo que se irá passar a seguir. Em Portugal, quem foi votar, fê-lo contra o governo ou a favor do governo. A abstenção é o que, de facto, penaliza a Europa. Entre nós, não existe grande fratura contra o projeto europeu, mesmo o PCP, que é aquele que mais é contra o projeto europeu, não deixa de jogar as suas regras. Contudo, isso já não é visível noutras paragens. Como se viu no caso da França com a vitória da Frente Nacional de extrema-direita, e na Grécia do Syriza de extrema-esquerda. Daqui se pode concluir que foram nestas eleições que os extremos ganharam terreno na Europa. Parece que os países ricos viraram à direita e os países pobres à esquerda. Mas, sobretudo, o que será bom realçar é que ganharam os votos contra a Europa em qualquer dos casos. Será um voto de protesto ou, simplesmente, as coisas estão definitivamente a mudar? Apesar da já crónica abstenção verificou-se uma grande fragmentação de votos nesta Europa que deve refletir profundamente sobre os caminhos que está a trilhar, sem o qual, será o próprio projeto europeu a ser posto em causa. A elevada abstenção diz bem daquilo que os cidadãos pensam da Europa. Definitivamente, não se reveem no projeto que vem sendo seguido o que deverá fazer pensar sobre a futura viabilidade deste projeto. Independentemente da alegria de quem ganha e do desalento de quem perde fica o travo amargo de que muito se tem que fazer. Aqueles que mais são contra o projeto europeu ganharam terreno duma forma avassaladora. Agora é tempo de pensar sobre tudo isto. E a Europa deverá pensar naquilo que está a propor aos seus membros. Aquele que foi um sonho acalentado por Jean Monnet e Jacques Delors pode vir a virar um tremendo pesadelo. Este projeto que contribuiu duma forma decisiva para a pacificação na Europa pode vir a estar em causa no médio prazo. E se isso acontecer a Europa virará rapidamente um campo de batalha no xadrez internacional como o foi no passado. (Devemos refletir sobre o porquê de o partido neonazi alemão ter elegido pela primeira vez um deputado). Por isso, para além de euforismos ou desalentos, temos que pensar em algo maior e mais abrangente. Será que ainda queremos o modelo europeu? E se sim, em que moldes? Que fazer para consolidar aquilo que parece estar prestes a desmoronar? Isto é a resposta que urge encontrar seja pelos que venceram e pelos que perderam. Para além do interesse mediato das forças políticas há um interesse maior que é a própria Europa. E para aqueles que nela acreditam estes são tempos de inquietação e de interrogação. Afinal o slogan de "Agir, reagir, decidir" que foi o mote para estas eleições, não deixa de ser ajustado. E face ao que aconteceu será necessário agir depressa, reagir de imediato e decidir bem, coisas que até agora não se têm visto. Se em termos nacionais foi dado um sinal preocupante de empastelamento político, - e isso não aconteceu só em Portugal -, em termos europeus fica-se com a sensação de desespero, de impotência, de encruzilhada. Isso não augura nada de bom no curto/médio prazo se se mantiver este cruzar de braços que tem sido o mote desde há muito tempo.

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