Turma Formadores Certform 66

Thursday, July 24, 2014

CPL...Quê?...

A pergunta pode parecer provocatória mas tem fundamento. Afinal o que é a CPLP - Comunidade dos Países de Língua Portuguesa? Até agora era um espaço da lusofonia, onde os valores culturais e não só eram a pedra de toque duma comunidade que tinha na língua portuguesa o seu fator de aglutinação. Desde ontem deixou de ser assim. A Guiné Equatorial que passou a fazer parte deste grupo de países (num processo rocambolesco e sem paralelo) veio desvirtuar tudo aquilo que presidiu à sua constituição de que Portugal foi país fundador. Nesse país da África Ocidental não se fala português, mas espanhol - foi um antiga colónia espanhola - dominada por um feroz ditador (o que mais tempo está no poder em África) num país que é conhecido pela violação dos mais básicos direitos humanos, onde a pena de morte é apenas o lado mais visível da barbárie, ofuscando um pouco o país arbitrário, onde a tortura é legal, onde as populações não têm qualquer direito, chafurdam na miséria mais abjeta, enquanto o ditador e a sua família vivem na ostentação e no luxo. As arbitrariedades são coisa comum. Onde se pode ser espancado na rua por alguém que utilize uma farda - símbolo do poder - para não falar no que se passa nas esquadras e prisões que têm preenchido imensos relatórios da Amnistia Internacional. Neste processo equívoco, onde Portugal tem tido sempre um papel de opositor, não deixou de ser sintomático que esta pretensão tenha sido apoiada pelo Brasil e por Angola. Se quanto a Angola até compreendemos, porque a entrada deste país acaba por legitimar uma outra ditadura também ela prolongada em demasia no tempo de José Eduardo dos Santos, já quanto ao Brasil temos mais dificuldade. A presidente brasileira não compareceu, - tal como o seu homólogo angolano -, talvez pelo incómodo da decisão. Dilma Rousseff sabe o que é viver em ditadura, ser preso político, sofrer a tortura. Sabe o que é o "pau da arara" método muito comum de tortura nesses países. Talvez por isso não veio. Vendeu-se, como todos os outros países, por um prato de lentilhas. Por umas moedas que vêm ajudar algum banco em dificuldade, alguma economia em desespero, algumas empresas inviáveis. Mas moralmente não se sentiu confortada para comparecer. Mas se tudo isto me choca - deve-nos chocar a todos - a maneira como o ditador africano aparece na mesa, sem plebiscito, pela mão de Xanana Gusmão, foi de facto demais. Xanana é um homem que admiro muito pelo papel que desenvolveu e desenvolve em Timor Leste, e por isso mesmo, deveria ter mais cuidado com os seus gestos. Todos ainda nos lembramos da onda de solidariedade que se gerou em Portugal e no mundo para a sua libertação das cadeias indonésias. Será que Xanana já não se lembra? Com a delegação portuguesa posta de lado, humilhada e ofendida, penso que era tempo de mostrarmos mais músculo. Sei da importância dessa comunidade, sei o que representa para Portugal e para a lusofonia, mas também sei que a dignidade dum povo foi aviltada. Não percebo porque Portugal não abandonou de imediato a reunião e, quiçá, a própria comunidade que ajudou, e muito, a fundar. Sei que os caminhos da política e da diplomacia são ínvios. Sei que em política o que parece nem sempre é. Mas também sei que a dignidade dum povo deve estar acima de interesses económicos, mesmo quando se está a passar por dificuldades como nós estamos. Aceitarmos complacentes a vinda deste ditador que ao que parece até canibal é, (na pessoa dos seus opositores), torcionário que nem sequer sabe falar português é no mínimo ridículo. E quando alguns - poucos - pretendem justificar o injustificável, é bom lembrar que a pena de morte não foi abolida, foi apenas suspensa, e que dias antes da sua suspensão, pelo menos quatro prisioneiros foram executados. Isto diz bem do que estamos a falar e de quem estamos a falar. Os interesses económicos e financeiros não se podem sobrepor à dignidade dos povos. A Guiné Equatorial é um país banido da comunidade internacional, isolado por todos. Agora deixou de o ser e logo no seio duma comunidade improvável. O dinheiro do petróleo não pode justificar tudo. A partir de ontem a CPLP passou a ser uma comunidade de interesses que não, jamais, da lusofonia.

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