Turma Formadores Certform 66

Monday, December 27, 2010

Feliz Ano Novo de 2011


E estamos chegados ao final deste ano de 2010 que foi, a todos os títulos, um ano difícil para a maioria de nós. Foram as crises da finança, da economia, da política, enfim, houve de tudo um pouco. Mas como diz o povo, "atrás de mim virá quem de mim bem dirá", quer isto dizer que, se 2010 foi um ano para esquecer, o 2011 que por aí vem não promete ser melhor, bem pelo contrário. Será agora que as medidas inscritas no Orçamento de Estado irão fazer a sua aparição, com todo o cortejo de problemas que já estamos à espera. O desemprego a aumentar, a economia a não crescer e a divergir das restantes economias do União Europeia, a carga fiscal aumentada, no fundo, o apertar do cinto como nunca foi visto por estas bandas. Diz-se que os portugueses aprenderam a viver a cima das suas possibilidades, é verdade, mas também é verdade que, os políticos a isso insentivaram e a banca - sempre ela -, ia apregoando o crédito fácil e barato que agora é um perfeito garrote para muitas famílias altamente endividadas. A banca está no centro da crise - como todos sabemos - e foi ela que, ao fim e ao cabo, colocou muitas famílias na vereda da indigência. Ainda agora, os telefonemas dos bancos para casa dos clientes são habituais, e neles se prometem miríades de muito dinheiro já pré-aprovado. Esta é a ilusão que, mesmo nos dias de hoje, a banca vai vendendo aos incautos. Parece que não aprenderam a lição, ou talvez, ainda não houve um pulso forte por parte da regulação, para por um fim a todo este desaforo. Mas deixemo-nos de lamúrias, porque vamos ter muito tempo para o fazer ao longo deste novo ano que se aproxima, e pelo menos por uma noite, pensemos que tudo está bem, que a crise não existe, que o desemprego diminuiu, que todos nós não vamos ter que enfrentar problemas sérios em 2011. E assim, com esta pobre ilusão, vamos todos para o "réveillon" dançar e folgar, entre desejos acompanhados com uvas passas e o estalar das garafas de champanhe. Afinal, vamos ter um ano inteirinho para nos preocupar-mos. É com este espírito que vos desejo um Feliz Ano Novo de 2011. Se ele não (nos)vos trouxer tudo aquilo que desejam, pelo menos que seja mais leve no fardo que (nos)vos atribuir. Feliz Ano Novo.

Wednesday, December 22, 2010

Feliz Natal


Advento, palavra que significa vinda, a preparação da vinda do Messias. Contudo, hoje vivemos afogados na luz: nas nossas casas e nos espaços públicos, no campo e na cidade. Olhamos o céu e quase que não vemos as estrelas. Mesmo em tempo de crise, o consumo de energia eléctrica não pára de crescer. As cidades não dormem. Os homens não dormem. E, no entanto, vivemos na cegueira: temos olhos que não vêem pelo excesso de luz. O Natal é o começo da nossa libertação. Faz que seja uma luz para a nossa amargura e o nosso desânimo. Conduz-nos, guiados por ela, até àquele lugar onde nasceste e não cessas de nascer: o Presépio. Só aí poderemos encontrar-Te, fora da cidade, longe das luzes que nos cegam. É este Deus que o Advento nos anuncia - o Deus que é presença, que é luz e orientação, que é força interior e estímulo, que é conforto e esperança, que é perdão e paz - não o Deus dos presentes (de preferência caros) - para impressionar os outros. É este Deus que celebramos nesta altura, e testemunhá-lo de facto quando tentamos reproduzir na nossa vida, os sinais de misericórdia que Jesus fez e ensinou a fazer, como por exemplo, ver e ouvir os outros de modo fraternal, combater tudo o que degrada a vida humana, animal e a natureza, praticar os gestos fecundos da partilha e da reconciliação e, por fim, dar as mãos para restaurar a esperança no meio dos que sofrem. Nisto se conhecerão que somos seus discípulos. Este é o verdadeiro Natal que vamos celebrar, não o dos "shoppings" onde se celebra o consumismo mais desenfreado. Poderemos ser probes, mas se o celebrarmos condignamente, poderemos sentir-nos verdadeiros reis. Que este Natal seja - até pelas circunstâncias - um Natal mais espiritual do que material, com menos presentes, - que na maioria das vezes, para nada nos servem -, e mais carinho, nem que seja em pensamento, por aqueles que nada, ou muito pouco têm, - por vezes nem um tecto para se abrigar -, neste tempo frio e húmido; por aqueles, que embora tendo muito, se sentem sós, - mesmo quando rodeados de muita gente -; e, sobretudo, pelos ausentes, que já preencheram a nossa vida noutros tempos e que agora, deixam a cadeira vazia. Por tudo isto, celebremos um Natal diferente, um Natal de humildade e partilha, onde a memória também esteja presente. A todos um Feliz Natal.

Monday, December 20, 2010

Conversas comigo mesmo - VI


Neste tempo de incerteza, por vezes de algum desassossego, diria mais, de grande desalento, ficamos perdidos à beira da estrada sem saber o que fazer. Mas aí, talvez as palavras dos grandes pensadores - que foram iluminando o pensamento ao longo dos séculos - nos dê a ajuda necessária para irmos em frente. Mergulhando nas suas palavras e, por vezes, nos seus exemplos, adquirimos a força e a coragem necessárias para continuar. Eu, que tanto vos tenho falado e escrito sobre a morte, - embora como diz o grande poeta Carlos Paz, "a morte ilumina a vida" -, hoje trago-vos os testemunhos da vida. Eis o que conta de si mesmo o Sufi Bayazid: "Na minha juventude eu era revolucionário e rezava assim: - Dai-me forças, ó Deus, para mudar o mundo. Mas notei ao chegar à meia-idade que metade da vida já passara sem que eu tivesse mudado qualquer pessoa. Então mudei a minha oração, dizendo a Deus: - Dai-me a graça, Senhor, de transformar os que vivem comigo dia-a-dia, como sejam a família e os amigos; e com isso já me dou por satisfeito. Agora que sou velho e já com os dias contados percebo bem quanto fui tolo ao rezar assim. E a minha oração, agora, é apenas esta: - Dai-me a graça, Senhor, de me mudar a mim mesmo. Se eu tivesse orado assim, desde o princípio, não teria desperdiçado a minha vida". Todos pensam em mudar a humanidade, quase ninguém pensa em mudar-se a si mesmo. Porque achamos sempre que os outros é que estão mal, ou porque não temos a força suficiente para isso. De acordo com a velha fórmula inscrita no pórtico do Oráculo de Delfos, estamos perante o "conhece-te a ti mesmo". No fundo estamos a andar em torno do que Sócrates já tinha afirmado: "Só sei que nada sei". A simples constatação desta verdade incontornável é um acto de humildade, porque a nossa busca por conhecimento esbarra sempre em mais e mais, dando a sensação do inatingível, da fronteira do impossível. Mas a fronteira do impossível vai-se dilatando, ora pelo conhecimento científico, ora pelo conhecimento espiritual, que leva a que nos conhecemos melhor face aos outros e ao mundo. Muitas vezes essa inacessibilidade quando é atingida torna-se em dúvida, a "dúvida metódica" que tão bem foi descrita por Jean-Paul Sartre. "Duvido de tudo, mas ao duvidar estou pensando, e se penso existo", dizia René Descartes. A dúvida como método de pensamento, que nos dá a sensação de existencialidade. Mas o simples facto de agir, o simples gesto de experimentar, o simples facto de mudar não são simples. "Age de tal modo que a máxima da tua acção se possa tornar princípio de uma legislação universal", dizia Immanuel Kant. Mas o simples facto de agir, por vezes é condicionado pelo nosso medo de errar, pelo nosso medo de falhar, na casa, na empresa, no dia-a-dia, na vida. Parafraseando Paulo Freire: "Ninguém nasce feito, é experimentando-nos no mundo que nós nos fazemos". Mas nem sempre é fácil. Para cada um de nós, e para nós face aos outros. Porque a experiência encerra em si o erro, a falha, a derrota, e nem sempre somos capazes de lidar com isso, sobretudo, num mundo cada vez mais competitivo, onde só os fortes vencem, porque são mais fortes, ou porque têm menos escrúpulos do que os restantes. Esses restantes, rastejam na ignomínia da existência menor e frustrante, não vendo quase sempre, reconhecidos os seus méritos, e podem crer que alguns os têm de facto, e muito apurados. Nem sempre as boas palavras resolvem tudo, nem sempre os grandes pensamentos filosóficos nos atenuam a dor da incompreensão. Todos nós temos necessidade de alimentar a nossa auto-estima, e o reconhecimento dos outros é, por ventura, um bálsamo para o ego. Mas esse reconhecimento nem sempre o temos na nossa vida, e isso dói, porque desde que nascemos até ao dia que morremos, somos amplamente treinados para a competição, em casa, na família, no emprego. Sem limites, sem escrúpulos, passando por cima de tudo e de todos, porque essa é a regra. O espaço para a cultura, para o pensamento superior, foi substituído pelo imediatismo materialista. Só quem tem bens é importante, a cultura é algo bizarro que, segundo alguns, não dá de comer a ninguém. Por isso, se está a assistir na sociedade e no mundo, a um nivelamento por baixo, onde a erudição vai desaparecendo, - e o pensamento também -, substuída pela bussalidade, que tende a ser o normal, numa sociedade materialista, sem valores, sem ética. Muito se tem falado de ética e de valores, mas pouco se tem feito em prol deles. A nossa sociedade é disso exemplo, mas as outras sociedades, pretensamente mais evoluídas, não são melhor exemplo para nós e para o mundo. A importância está, cada vez mais, no poderio do dinheiro, na capacidade de influenciar países ou pessoas, não no conhecimento. Como dizia Eduardo Lourenço, de cima dos seus sábios 85 anos, "o nosso mundo, na aurora de um novo milénio, segundo o calendário crístico, parece-se com um dos grandes aeroportos onde a humanidade se cruza sem se ver". Quão sábias são estas palavras, no nosso mundo de indiferença pelo outro - muitas vezes, no seio da nossa própria família - pelo desprezo dos valores dos nossos maiores, pela política do "vale tudo", se esta nos propiciar algum provento no imediato. Estes são os caminhos ínvios do ser humano, desprovido de valores, de sentimentos, reduzido (mesmo que inconscientemente), a autómatos dum jogo mais abrangente sem remorsos, sem piedade. Esta é a forma que vamos assumindo, conscientemente ou não, face à nossa fragilidade como seres humanos de passagem por este mundo. Actores circunstanciais duma representação mais vasta, onde não vislumbramos, nem o autor, nem o encenador. Ainda retomando Sartre, "antes de vivermos, a vida é coisa nenhuma". Daí a experimentação que, socialmente, nem sempre é aceite nesta caminhada, no assumir da nossa "lenda pessoal" que vamos cumprindo, - como diria Paulo Coelho -, dia após dia, nem sempre com a determinação dum César ou dum Napoleão Bonaparte, mas com a determinação do instinto animalesco de sobrevivência que a todos preenche, que vem gravada no nosso ADN. Nesta caminhada para o Natal, - já faltam poucos dias - paremos um pouco, e façamos alguma reflexão, atenuando embora minimamente, a senda consumista que, infelizmente, absorve quase na totalidade, esta época festiva.

Saturday, December 18, 2010

O fenómeno WikiLeaks!


À dias, Julian Assange, o homem que dá a cara pelo WikiLeaks, enfrentou os tribunais britânicos, acusado de ter molestado sexualmente duas mulheres. Muitos não sabem que, da primeira vez, a juíza do ministério público britânico achou que não havia matéria para ir a julgamento, vai daí, substitui-se a juíza por outra, que acha o contrário! Ainda falam da justiça portuguesa!!! A prisão e chamada à justiça de Assange, aparece aos olhos do mundo, como uma tentativa de silenciar o homem que tem mostrado a podridão em que se tornou a política mundial, com vista a obter os maiores dividendos possíveis. Contudo, não deixa de ser estranho que, os EUA, com a sua conhecida paranóia de segurança, tenha tido tão pouco cuidado em acautelar informação classificada, que pode por em causa o relacionamento entre os Estados. Apesar de tudo isso, e talvez por isso, a prisão de Julien Assange assume contornos do mais vil atentado ao direito de expressão levado a cabo nos tempos modernos. Todos sabemos que a informação que está a ser disponibilizada está a criar alguns engulhos à diplomacia norte-americana, mas a culpa não parece ser do WikiLeaks, mas sim, de quem não soube, ou não quis, acautelar tão melindrosa informação. Julian Assange, acabou por sair em liberdade condicional sujeito a fiança, ficou com o passaporte apreendido, estando em prisão domiciliária com uso de pulseira electrónica. Mas isto, por si só, não basta para calar o WikiLeaks. Achamos que este site não estará dependente de uma única pessoa, porque seria fácil concluir, que mais cedo ou mais tarde, ele seria neutralizado. Aliás, mesmo durante o processo de detenção, a informação continuou a sair, ainda com mais ritmo, visando vários agentes políticos e não só, pelo mundo inteiro, não tendo Portugal escapado às revelações. Pensamos ser importante apoiar todos aqueles que se esforçam por tornar o mundo mais transparente, trazendo junto dos povos a informação sobre situações que são "cozinhadas" nas suas costas, e que de outro modo, nunca chegariam à opinião pública. Os povos têm o direito de conhecer aquilo que, em seu nome, é negociado nos bastidores. Pensamos que por vezes, a diplomacia tem que seguir caminhos que não podem vir para a praça pública, mas daí até enganarem ou distorcerem as informações para as populações que deviam servir, isso não. Vão-se servindo, isso sim, da boa fé dos povos, inclusivé daqueles que os elegeram, para fins pouco claros, ou simplesmente, para fins de promoção pessoal. O WikiLeaks promete revelações ainda mais importantes e incómodas, vamos esperar para ver o que ainda vem por aí.

Thursday, December 16, 2010

Clube Bilderberg ou a Nova Ordem Mundial?


Prometi que vos trazia alguma informação sobre este clube restrito e discreto (porque não dizer, secreto) que reúne as mais influentes pessoas do mundo dos negócios, finança e política. O livro, já disponível em português à algum tempo é da autoria de Daniel Estulin e tem como título "Toda a Verdade sobre o Clube Bilderberg". E não pensem que se trata dum thriller de ficção, não, trata-se isso sim, de pura realidade substancialmente documentada. O autor convida-nos a entrar num mundo de intrigas e secretismo e passar a saber o que nunca antes foi revelado! Desde que se reuniram pela primeira vez no Hotel Bilderberg, em 1954, os homens mais poderosos do mundo cumprem anualmente este ritual e durante um fim-de-semana planeiam os destinos da Humanidade, estejam eles relacionados com questões económicas e políticas ou com relações internacionais. Intitularam-se o Clube Bilderberg e este é constituído por nomes tão sonantes quanto Bill Clinton, Tony Blair, Paul Wolfowitz, Henry Kissinger, David Rockfeller, entre outros. Mais de cinquenta encontros foram realizados, mas a imprensa nunca teve acesso nem às conclusões nem à ordem de trabalhos destas reuniões. De que falam os homens mais poderosos do mundo? Que influências têm estes sobre os nossos destinos? O autor responde-nos exactamente a estas questões, e a muitas mais, provando-nos que este Clube tem ramificações bem enraizadas por todo o planeta. Mas não pensem que neste Clube não aparecem os portugueses. Já por lá passaram Mira Amaral, Medeiros Ferreira que, - segundo o jornal i, terá indicado um "pivot" em Portugal que é, ainda hoje, Francisco Pinto Balsemão - e Marcelo Rebelo de Sousa. Mas Cavaco Silva, António Guterres, António Costa, Manuela Ferreira Leite, Joaquim Ferreira do Amaral, Vitor Constâncio, José Sócrates são também personalidades que por lá passaram. Na última reunião, este ano, que teve lugar na costa de Barcelona, mais concretamente em Stiges, no fim-de-semana de 3 de Julho, contou com a participação de Paulo Rangel e Teixeira dos Santos. Ao que parece, são convidados sempre dois portugueses, normalmente, um do PS e outro do PSD. Que curiosa coincidência! Para além da "teoria da conspiração" que está patente em todo o livro, não deixa de ser interessante que, após a sua leitura, fiquemos com a sensação de estarmos todos a participar num jogo viciado, mesmo quando exercemos o nosso direito de voto. (Caso estejam indecisos sobre a leitura deste livro, leiam as páginas 151 (terceira parte) sobre o que pensa David Rockfeller sobre a China; 151 (capítulo dezassete) sobre o tratamento dado aos jornalistas que desafiam a cobertura dos eventos deste grupo; e, a 211 (capítulo vinte e cinco) sobre os tentáculos em que, quem tenta dar visibilidade a estas reuniões, se pode ver enredado; depois fica a decisão de quererem descobrir o resto ou não). (As páginas citadas são desta edição que agora vos apresento). Um livro interessante e perturbador. O seu autor Daniel Estulin, é um jornalista premiado que à quinze anos investiga os segredos e as tramas que envolvem o clube Bilderberg. É autor de "La Verdadera Historia del Clube Bilderberg" (2005), um best-seller traduzido em 34 línguas e publicado em mais de 49 países. A edição é da Publicações Europa-América na sua colecção Biblioteca das Ideias. Um livro a ter em atenção para além de tudo aquilo que se fala na comunicação social "oficial" que pretende desvalorizar o carácter sigiloso (secreto?) deste grupo de poderosos do mundo que consegue reunir gente da esquerda e da direita unidos num propósito comum.

Tuesday, December 14, 2010

Equivocos da democracia portuguesa - 62


Neste final de ano, continuamos com notas em que a democracia portuguesa se tornou fértil. Desde logo, Passos Coelho a dizer que está disponível para governar com o FMI!!! Frase infeliz dum jovem político que ainda não aprendeu que em política as palavras devem ser medidas e pesadas. Esta frase causou desconforto mesmo no seio das hostes laranja. É caso para perguntar, se com esta falta de maturidade poderá vir a ser o futuro primeiro-ministro? Por aquilo que já vimos, cremos que haverá quem diga que sim, mas depois não se venham lamentar. Mas a nossa democracia continua a ser rica em equívocos, agora com a falta de açúcar. Esta situação levou a que, sobretudo alguns dos agentes políticos mais truculentos, não se cansaram de ampliar - com a sempre inestimável ajuda da comunicação social - que as coisas estavam tão mal, que até agora (logo na época natalícia) havia falta de açúcar!!! É certo que ele escassiou, mais pela corrida desenfreada aos postos de venda, do que pela falta real do produto. Esta é uma situação que, infelizmente, se repete sempre no final do ano, com este e/ou outros produtos, onde se criam condições para o ajuste de preço, levando as pessoas a comprar o mais possível, não se importando a que preço. (Até no anterior regime isso acontecia, o que levou Salazar a instituir os famosos grémios, mesmo assim, não evitando a escassez regular de bacalhau, - só para dar um exemplo -, que era um negócio chorudo para a famíla Tenreiro). Como ontem, um dos principais refinadores dizia, nunca houve falta de produto, embora algum dele tivesse sido desviado para outros países, sempre a pensar no ajuste de preço, e no lucro desenfreado. Mas logo, os nossos agentes políticos - alguns diga-se em abono da verdade - vieram dizer que isto tinha a ver com as medidas restritivas do governo. Patranha para enganar meninos. Faz-me lembrar a minha avó, de saudosa memória, que tinha vivido as duas guerras mundiais, que armazenava tudo o que podia em casa, como arroz, massa, açúcar e sei lá mais o quê, sempre com o argumento de que vinha aí uma guerra e haveria escassez dos produtos. Mas os tempos são outros, e o nível cultural também, e temos que nos deixar de ir a reboque de instigadores da desgraça, que mais não fazem do que defender interesses, nem sempre muito nobres. Outro assunto que tem vindo a abalar o mundo informativo nos últimos tempos, prende-se com o chamado "caso Wikileaks" - que abordaremos noutra altura - e que agora também nos vem tocar. É óbvio que a diplomacia se faz de muitas coisas, nem sempre claras e públicas, mas essenciais para o equilíbrio mundial. O que nos causa estranheza é a facilidade como estas informações aparecem, e logo, oriundas dos EUA onde as normas de segurança são muito apertadas. Será que alguém está interessado nisso? Talvez sim, mas quem fica mal nesta fotografia são, desde logo, os próprios EUA, ao deixarem que informação classificada seja tão mal protegida. Mas, pelo menos, soubemos que temos um 007 entre nós, que é nada mais nada menos, do que o presidente do Millenium BCP, temos um Presidente da República vingativo, um Primeiro-Ministro carismático e determinado e um Ministro dos Negócios Estrangeiro amigo dos EUA. Vamos estar atentos para ver o que ainda virá por aí. Neste mundo conturbado, onde tudo parece um imenso jogo de xadrez, - (leiam os livros de Katherine Neville, que já foram objecto de análise neste espaço) -, onde os governos mais parecem que não governam, mas são controlados à distância por terceiros com fins menos confessáveis. Cada vez se olha com mais atenção para o chamado "Clube Bilderberg", - assunto a que voltaremos mais à frente - embora este faça tudo ao seu alcance para passar discreto e desapercebido. Será que neste mundo, cada vez mais de sombras, não passamos de meras marionetas num jogo mais vasto? Vivemos um mundo sem ética, esta já foi enterrada à muito, até passou a ser "démoudé". Reflictamos um pouco sobre tudo isto, e tentemos olhar com distanciamento, para o mundo que nos cerca. Talvez cheguemos a alguma conclusão.

Monday, December 13, 2010

No 102º aniversário de Manoel de Oliveira


Sábado passado, dia 11, comemorou-se o 102º (!) aniversário de Manoel de Oliveira. Um homem de extraordinária longevidade, com uma capacidade de trabalho única, que ainda trabalha e que diz que "com esta idade tenho que andar depressa, porque não irei estar por cá muito mais tempo, e ainda tenho vários projectos em mente" (!). Isto são homens duma outra fibra, bem diferente, ao que parece, daquela que é atribuida ao comum dos mortais. Manoel de Oliveira, um portuense de gema, começou a afirmar-se sobretudo no outono da sua vida. Para além de "Aniki Bobó" que aparece nos anos gloriosos do cinema português, ele só mais tarde veio a ter o reconhecimento internacional que hoje tem. Nisso é muito semelhante ao percurso de José Saramago que, editou o "Levantados do chão" já com cerca de 58 anos de idade. Mestre Oliveira é mais conhecido e celebrado no exterior do que entre nós, mantendo assim, a sina dos artistas portuguesas quando avaliados pelos seus compatriotas. Ele próprio reconhece que os seus filmes não são vistos em Portugal, contudo, mestre Oliveira é uma referência internacional desde à muito tempo, o cineasta mais velho em actividade. Naturalmente, e como é comum entre nós, quando Manoel de Oliveira morrer, vão-se fazer grandes laudas à sua vida e obra, muitos "intelectuais" do burgo - que nunca viram um filme dele - vão dissertar sobre os seus filmes com o seu "profundo conhecimento" de intelectuais de pacotilha. Serão editados em DVD os seus filmes, que serão adquiridos pelos bem-pensantes de cá que, como acontece com os livros, é bonito ter e mostrar, como símbolos de cultura!!! Isto faz-me recordar quando, já lá vão alguns anos, me cruzei com um amigo que me disse, entusiasmado que ia ver as "Bodas de Fígaro" de Mozart. Sabendo que a música não era o seu forte, muito menos a ópera, questionei-o sobre isso mesmo. A resposta foi sintomática, "vou lá estar, na primeira fila, porque estou ao lado do presidente da Câmara, mais umas tantas individualidades, o que seria bom para a minha carreira". Aproveitou para me pedir que lhe fizesse um resumo da estória, porque ele não a conhecia, para não ficar mal junto dos seus pares (!). Esta é a nossa brilhante intelectualidade. Se calhar é por isso que somos o país que somos, por mais esforços para mudar de rumo. Mas enfim, é de mestre Manoel de Oliveira que estamos a falar, porque este é que é o assunto de hoje. Pois parabéns mestre, e que esta data se repita por muitos anos, são os meus sinceros votos. São de portugueses cultos e esclarecidos, como mestre Oliveira, que este país precisa desesperadamente. E para aqueles que ainda duvidam da sua vitalidade aqui fica um endereço do youtube - www.youtube.com/watch?v=NDFDpXITOoA (basta clicar em cima) - para verem o que um espírito jovem é capaz de fazer, neste cinzentismo que continua a ser este país e a sua pseudo-intelectualidade. Só lhe peço perdão, mestre, pelos votos tardios, mas como diz o ditado, "mais vale tarde do que nunca".

Saturday, December 11, 2010

Equivocos da democracia portuguesa - 61


Temos assistido nos últimos dias a mais um carnaval político na nossa terra. Agora é a "compensação" que Carlos César, o presidente do governo regional dos Açores, anunciou sobre os cortes anunciados e inscritos no OE aprovado recentemente. É obvio que, embora compreendamos o que Carlos César quis fazer, subscrevemos o que Sócrates e parte da oposição afirmaram sobre este tema ontem no debate quinzenal na AR. Para além da discussão jurídica - que ainda nem sequer começou - há uma questão política que é avassaladora. As normas do Governo e da AR são soberanas para o território nacional, o que desde logo implica, uma certa solidariedade política em torno de tão gravosas medidas. Não faz sentido que, uma parte do território nacional não as siga, dando assim azo a um precedente que pode ser perigoso. Como é óbvio, em democracia os votos contam, e esta é uma estratégia que irá ajudar, e muito, Carlos César. Mas quando o país está na situação em que está, temos que pensar para além do voto, do interesse partidário, do interesse meramente pessoal. Para além do desrespeito face aos orgãos de soberania, - PR, Governo e AR -, é a afronta que se faz ao portugueses, que segundo César, à-os de primeira e segunda categorias. Foi lamentável esta decisão, agravada pelo desconhecimento do PM - que a acreditar em algumas fontes - nunca foi consultado. Quando as regiões autónomas são pobres e dependem de dotações do governo central, é incrível assistir a coisas destas. E sobretudo, porque tais medidas podem por em causa o próprio OE, com as consequentes derivas daí resultantes. Na política não pode valer tudo, já o afirmamos por diversas vezes, nem a qualquer preço. Se a maioria dos portugueses vai fazer um esforço tremendo em 2011, ( e subsquentes ), porque razão os açoreanos não o devem fazer? Tenhamos algum pudor. A nossa democracia já anda pelas ruas da amargura, não a empurremos mais para o lamaçal, para depois nos virmos a arrepender - tardiamente - e acabar "a chorar sobre leite derramado". Carlos César tem um lugar importante e com visibilidade, daí o dever ter mais cuidado com as suas atitudes.

Wednesday, December 08, 2010

Conversas comigo mesmo - V


Estamos a chegar ao Natal. A nossa esperança chama-se Jesus. (Para os que professam o cristianismo, dentro da tradição judaico-cristã que professamos, mas poderia ser Maomé, Buda ou outro líder espiritual porque no essencial, todos eles professaram o bem da humanidade, foram os homens que dividiram aquilo que Deus quis que fosse uno). O amor é a ponte que une o ínfimo ao infinito. A vida não nos é roubada na morte, porque ela nunca foi nossa, nunca possuímos a vida como um bem pessoal que conquistamos por direito. Foi-nos dada para a restituirmos, para a darmos. E esta lei é tão forte como a morte. A vida para o outro está inscrita em cada um de nós, é a luz e a seiva do nosso coração. E está em cada um de nós como em mais ninguém. Há laços que nos vinculam para a eternidade e é preciso bem mais do que a morte para os quebrar. A morte mata apenas o que conhecemos como vida, não as relações. Se da nossa vida na terra só podemos levar aquilo que demos, compreendemos que Deus, ao dar-nos mãos, mostrou ter para connosco tanta bondade e tanto amor como se nos tivesse dado asas. Lidamos mal com as palavras gastas, mas há palavras que são faróis da vida. A esperança leva dentro a confiança e a Fé. Nada do que fomos e demos será perda. Será apenas diferente. Será regresso a Casa, depois do que experimentámos no fio da vida, entre momentos de alegria e de dor, de riso, de prazer, de esforço, vitórias e fracassos. Mais do que fim, será princípio, em comunhão com o Amor inteiro, com aquele mais que nos faltava quando, por aqui, fomos felizes. A nossa confiança tem nome de ressurreição e garantia de pessoa: Jesus Cristo. Ainda que eu falasse línguas, as dos homens e as dos anjos, se não tivesse a caridade, seria como bronze que soa ou como címbalo que tine. Ainda que eu tivesse toda a fé a ponto de transportar montanhas, se não tivesse a caridade, eu nada seria. Ainda que distribuísse todos os meus bens aos famintos ainda que entregasse o meu corpo às chamas, se não tivesse a caridade, isso nada me adiantaria. A caridade jamais passará. Quanto às profecias, desaparecerão. Quanto às línguas, cessarão. Quanto à ciência, também desaparecerá. Pois o nosso conhecimento é limitado, e limitada é a nossa profecia. Mas, quando vier a perfeição, O que é limitado desaparecerá. "Agora vemos em espelho e de maneira confusa, mas, depois, veremos face a face." (1º Cor. 13).

Sunday, December 05, 2010

Conversas comigo mesmo - IV


Um convite que não podemos recusar: viver para os outros. A morte não é apenas um problema, é um momento-chave da vida, que todos somos convidados a viver. A morte é apenas a penúltima palavra sobre nós, pois coloca um ponto final na nossa vida na Terra, tornando assim essa vida completa. Pela nossa morte "encerramos" o processo de construção da nossa própria identidade. Termina a vida em liberdade, que nos permite ser o que seremos. Interrompe-se a relação com os outros, mas não termina, por completo e para sempre, a possibilidade dessa relação. Com a morte abre-se uma outra dimensão da vida, em que o que somos e a nossa relação com os outros atinge a dimensão do infinito amor de Deus. A última palavra sobre nós, o núcleo da nossa esperança, é a ressurreição. A ressurreição é a transfiguração de nós mesmos numa outra dimensão de nós, onde seremos plenamente nós mesmos, por pura dádiva de Deus. A esta dimensão a tradição cristã chamou "céu". Não a podemos realizar nós mesmos, podemos, isso sim, prepararmo-nos para a acolher ou recusar. Na dimensão da vida de Deus, seremos dados à vida - uma vida diferente da que conhecemos biologicamente - para darmos a vida, tal como a demos, no nosso caminho terreno. Se aceitamos o desafio de viver eternamente para os outros, teremos vida eterna, numa doacção que não conhecerá nem limites nem fim. Por isso, o desejo que nos pode animar eternamente é o desejo de vida eterna do outro, não tanto da nossa. O desejo da vida para o outro, sobretudo do mais necessitado, pobre e excluído, é caminho que nos prepara para a vida eterna. Não vivemos, por isso, para "conquistar um lugar no céu", mas para que os outros tenham esse "lugar". E só se houver, ainda que pequenino, esse desejo de vida eterna para o outro, é que Deus poderá completar o nosso mísero amor com a plenitude do seu. Jesus Cristo inaugurou esta nova dimensão da vida, ressuscitando de entre os mortos, porque viveu a vida dando vida numa doação total, até à morte numa cruz. A morte, por Jesus, é ela mesma uma dádiva livre e gratuita da vida. Essa entrega é o fundamento da esperança de que seremos dados à vida, para além da morte, nessa nova dimensão, a dimensão plena do amor de Deus. Podemos assim compreender que uma vida dada livremente pelo outro, pelos rostos que nos interpelam, quando acontece a morte, essa mesma vida faz com que a morte não possa mais roubar-nos a vida. Esta adquire eternidade. Foi uma vida dada. Deus "soma luz à luz". A morte não é, definitivamente, a última palavra sobre nós. À dor da ausência sobrepõe-se necessariamente a força da esperança. Uma esperança enraizada no nosso mais profundo ser que nos impele a permanecer no caminho. O ser humano é, por natureza, um ser de esperança que não abdica diante da adversidade. A esperança fundamenta-se em alicerces diferentes mas nem todos iguais ou válidos.

Saturday, December 04, 2010

"O Fogo" - Katherine Neville


Em 1998, "O Oito", de Katherine Neville, revolucionou o panorama dos romances de intriga e redefiniu as normas universais do "suspense". Vinte anos depois, "O Fogo" dá continuidade à história. 1822, Albânia: trinta anos após a Revoliução Francesa, está iminente a guerra da independência grega. Ali Paxá, o mais poderoso governante do Império Otomano, encarrega a sua jovem filha Haidée de levar para fora do país uma peça crucial do tabuleiro de Xadrez de Montglane. Perseguida por inúmeros inimigos, Haidée viaja através de Marrocos, Roma e Grécia até ao centro do Jogo cujos segredos têm origem na cidade de Bagdade, mil anos antes. 2003, Colorado: Alexandra Solarin desloca-se ao refúgio ancestral da família, nas Montanhas Rochosas, para o aniversário da mãe. Há trinta anos, Cat Velis e Alexandre Solarin, os seus pais, acreditavam ter espalhado as peças do Xadrez de Montglane por várias partes do mundo, enterrando-as e ocultando assim os segredos do poder que quem as possuísse deteria. Mas, ao chegar ao seu destino, Alexandra descobre que a mãe desapareceu e que uma série de pistas por ela estrategicamente deixadas só podem indicar que algo de muito sinistro foi posto em marcha. a peça mais importante do tabuleiro de xadrez de Carlos Magno reapareceu... Misturando um estilo requintado com uma narrativa absorvente em que o "suspense" nunca pára, Katherine Neville consegue mais uma vez tecer uma cativante história de acção, intriga e mistério. Katherine Neville nasceu em St. Louis, Estados Unidos, em Abril de 1945. Especialista em Administração e Gestão de Empresas, foi vice-presidente do Bank of America e consultora para a implementação de sistemas informáticos em organizações da área financeira e das energias, como a IBM e a OPEP. Viveu em seis países e em três continentes, e em metade dos estados dos EUA. Dessa vasta experiência nasceu " O Oito" (1988), - ver o nosso comentário editado em 29 de Agosto de 2010, neste mesmo espaço - que se tornou rapidamente num dos maiores bestsellers mundiais. Vinte anos depois publicou "O Fogo", sequela do primeiro, que a Porto Editora agora apresenta aos leitores portugueses. Para quem quiser obter mais informações sobre a autora podem consultar o site http://www.katherineneville.com/ . Nesta época natalícia que agora começa, onde pensámos sempre qual, ou quais, os presentes para comprar aqui fica uma excelente escolha. Contudo, não se esqueçam de ler primeiro "O Oito", caso contrário, poderão não entender algumas passagens da história. Este, acabou de ser reeditado, com o novo da sequela "O Fogo". Aqui fica a sugestão.

Thursday, December 02, 2010

Conversas comigo mesmo - III


De que nos vale escondermos a morte? Houve um tempo em que a morte nos era próxima, fazia parte da sociedade e da família e, embora não fosse uma boa amiga, não lhe desviávamos os olhos à passagem. Harmonizava-nos com os ritmos da natureza e no horizonte tudo parecia presença dessa imensa pequena palavra: Deus. Era-nos, então, mais fácil encontrar a paz na ideia de morrer. Víamo-la como natural, embora tão misteriosa quanto a ideia de nascer. Hoje, escondemos a morte; só nos ecrãs é que a expomos sem pudor. Mas este excesso contínuo de imagem de morte provoca exactamente o efeito de desgaste e a indiferença em relação à vida. Convoca a nossa indiferença face à injustiça e à guerra, à pobreza e à aflição de tantos seres humanos, que nos rodeiam. Diariamente e, aos poucos, vemos a morte à distância, com a infantil ilusão de quem vê imagens de ficção ou observa um assunto que apenas a outros diz respeito. No mais, impomos-lhe o silêncio, escondemo-la, ignoramo-la, afastamo-la, tiramo-la de casa, remetemo-la para os hospitais como se fosse contagiosa ou simplesmente nos obrigasse a aceitá-la - em data próxima ou distante - como o mais radical e decisivo dos encontros. Por isso estamos sempre a surpreender-nos com aquilo de que, no fundo, estávamos à espera. Num instante, anunciada ou de surpresa trágica, ela aí está naqueles que nos morrem. E, anunciada ou de surpresa, chegará a nossa vez. Será privado e íntimo esse encontro. Estar "às portas da morte" significa aproximar-me do "a-Deus". Este "a" significa abertura, acolhimento, aproximação do amor de Deus. Significa também a saudação de despedida àquele que parte. Sendo possível, será bom saber que temos os nossos por perto, aqueles com quem partilhámos os dias, a dizer-nos "estou contigo", "isto não acaba aqui", a acenar, com saudade, sinalizando um imenso amor no cais da nossa partida. a morte é sempre vivida por quem permanece vivo, como experiência misteriosa que abre as portas do infinito, porque quem parte, esse rosto agora transformado em máscara, por força de uma ausência que dói, de uma partida sem retorno, abre-nos ao mistério e à transcendência. Esse é o facto mais importante que decorre da nossa relação com a morte: pensar a minha vida como vida para o outro. Carregar o luto é carregar a "santidade do outro" ausente e abrir ainda mais as portas ao outro presente, o único caminho verdadeiramente humano.

Wednesday, December 01, 2010

Equivocos da democracia portuguesa - 60


Temos, como já o dissemos por diversas vezes, alguma admiração e até expectativa sobre Pedro Passos Coelho. Por ser um líder jovem, com uma outra visão da política, e com novas ideias que permitam fazer um "refresh" da política e dos políticos que foram cristalizando ao longo dos anos. Contudo, começamos a ficar preocupados com aquilo que vemos e ouvimos nos últimos tempos. Vemos com alguma surpresa, o constante alterar do discurso, o dar o dito por não dito, dentro daquilo que tanta escola tem feito na nossa democracia. Antes foi o "aprova" / "não aprova" do OE, agora é a ânsia de chegar ao poder a qualquer preço, ele que tinha sempre dito que daria tempo ao tempo. Na semana passada, numa infeliz entrevista o Expresso, Passos Coelho não resisitiu às perguntas muito asservas e inteligentes da jornalista. Chegou ao desaforo de dizer que está preparado para governar com o FMI!!! Até Marcelo Rebelo de Sousa achou um pouco de mais. Quando os actuais responsáveis têm no discurso oficial a não entrada do FMI, esta afirmação causa, não só perplexidade, mas sobretudo, muita preocupação. Na actual conjuntura, quando os seus pares dizem que é melhor deixar passar a "tempestade", quando os consultores económicos do partido vêm dizer que um governo do PSD não faria diferente do actual de Sócrates, Passos Coelho já fala em oito anos(!) para o seu projecto. Mas vai mais longe, quando diz que mesmo que tenha uma maioria absoluta convidará para o governo o CDS/PP! Julgamos que estará a pensar em alargar a base de apoio do futuro governo, mas daí a atribuir pastas a outro partido vai uma grande distância. O PS diz que estamos perante um líder "imaturo", não queremos comentar o qualificativo, mas, de facto, parece haver algum amadorismo, alguma impreparação para quem quer ser o futuro primeiro-ministro. Para dar uma ideia de como se vive este sentimento com um misto de euforismo e preocupação, mesmo dos mais comprometidos com o PSD, diremos que, na semana passada almoçamos com uma economista muito comprometida com o partido. Durante o almoço ela afirmou se temos alguma confiança no actual líder, com esta deriva de discurso que todos os dias nos surpreende. Não deixa de ser sintomático da reserva que existe, mesmo dentro do PSD, e logo, dos mais comprometidos. Como já o dissemos por várias vezes, a actual situação do país não depende tanto do governo, porque seja ele qual for, terá que aplicar as mesmas medidas. O problema é mais profundo do que uma simples troca de rostos na governação.