Turma Formadores Certform 66

Tuesday, November 29, 2011

Equivocos da democracia portuguesa - 151

No mar de angústia que se vai instalando em Portugal e na Europa vemos que a descoordenação das políticas, a falta de rumo a seguir, vão delapidando o pouco que ainda existe. Por cá, depois duma greve geral que o governo tentou minimizar, aliás, sem sucesso, verificamos que o desnorte é total. No caos que é o OE para 2012, assistimos quase diariamente a avanços e recuos que já não se podem ocultar. Embora com maioria absoluta, o governo quer garantir uma base de apoio alargada e, para além disso, comprometer o PS na política seguida. Daí estas tergirvações incompreensíveis, que mostram também, um certo desnorte, coisa aliás por demais evidente desde que este governo tomou posse. A carga tributária é cada vez mais expressiva, embora não se veja cortes significativos do lado da despesa do Estado que dá de comer a muitos parasitas e incompetentes. Já não se consegue esconder o caos em que Portugal está e que vai piorar no futuro próximo. Os indicadores da OCDE ontem publicados, dizem bem da real situação em que nos encontramos. O desemprego a disparar em flecha - um em cada sete trabalhadores não terão emprego em 2013, mostrando à evidência a recessão que irá - já está - a esmagar Portugal e os portugueses. No OE 2012 não se vislumbra - como já aqui referimos por diversas vezes - qualquer estratégia, mesmo que incipiente, para o crescimento da economia. E sem crescimento não existe emprego, não existe investimento, logo, não pode existir criação de novos postos de trabalho. Neste ciclo vicioso, nesta espiral recessiva - para utilizar a expressão de Manuela Ferreira Leite - em que entramos, não se vê nenhuma luz ao fundo do túnel, apenas este bem escuro que a todos abraça. O empobrecimento dos portugueses é já por demais visível, a crise veio para ficar e não só até 2013 como o ministro da economia - o tal que nunca nos lembramos do nome(!) - (já agora cliquem no link anexo e vejam o vídeo, verão que vale a pena http://www.youtube.com/watch?v=tnePYC9OQY4&feature=player_embedded#! quis decretar. Ele, do cimo da sua pseudo sabedoria ainda não percebeu que não será assim, e se o entendeu então está a enganar os portugueses. Este é um trabalho de uma geração pelo menos e não dum par de anos, desenganem-se os que pensam o contrário. Mas o mais caricato é que ainda ninguém percebeu por que será que o governo quer ir para além do que a "troika" impôs. Não é seguramente a ida aos mercados em 2013 como o PM quis afirmar, porque nessa altura o país estará mergulhado numa das mais graves recessões da sua história, e ninguém nos emprestará nada, o que levará ao negociar dum novo pacote junto das instâncias internacionais, e disso ninguém tenha dúvidas. A coberto do acordo negociado o PSD está a implementar a sua agenda ultraliberal - como já aqui denunciamos por diversas vezes - dentro daquilo que está a ser seguido pelo directório da UE, o chamado "Merkozy" para utilizar uma feliz expressão de Freitas do Amaral. Só que agora, ao contrário do que aconteceu no passado recente, já muita gente - e gente com visibilidade - começou a ver aquilo que até aqui não viam ou não queriam ver. Porque o problema está na Europa e não nos países periféricos. (Agora os países mais emblemáticos da União estão a braços com o problema - veja-se o que aconteceu ontem com os juros da dívida italiana a que nem a mudança de governo conseguiu evitar - que o mesmo é dizer que a crise está a chegar ao núcleo duro da Europa sem apelo nem agravo). Estes foram arrastados pela fúria ultraliberal e, como pequenos, dependentes e com economias mais frágeis, não tiveram a capacidade de reagir. Ainda hoje, o Diário Económico on-line abre com um título sugestivo: "Berlim só salva o euro depois de mandar nas contas europeias". Isto diz bem da arrogância alemã, arrogância que, nunca o esqueçamos, conduziu a Europa para duas guerras mundias. E talvez, oxalá nos equivoquemos, está a preparar uma situação idêntica para o futuro próximo. Este directório que não foi eleito e como tal não tem mandato para decidir os destinos dos restantes países europeus, está a comportar-se como uma verdadeira ditadura. Como dizia Freitas do Amaral ontem: "A Europa é um conjunto de países democráticos governados por uma ditadura franco-alemã". Ao que acrescentou Mário Soares: "Se a Europa não mudar, então vai ter que haver um revolução". Não sabemos se será uma revolução ou algo mais devastador, mas sabemos que o sonho europeu está a estilhaçar-se em mil pedaços e o euro - sonho maior dos fundadores da Europa Comunitária - está em vias de desaparecer com o cortejo de problemas que daí advirão, sobretudo para os países periféricos. O sonho europeu foi o maior a que a nossa geração assistiu, e é com muita amargura que vemos que ele está a ser destruído dia-a-dia sem que ninguém - aparentemente - faça nada para o evitar.

Sunday, November 27, 2011

Conversas comigo mesmo - XLII

Da esquerda e da direita veio a mesma reacção de surpresa e de espanto, e também a mesma pergunta: "- Senhor, quando é que nos cruzamos contigo e Te manifestamos solidariedade ou indiferença?" A resposta foi um verdadeiro choque teológico, subversor para sempre do nosso relacionamento com Deus: " - A solidariedade ou indiferença que Me manifestaste foi a que manifestaste ao teu próximo..." Na verdade, ainda que o imaginemos, - Deus não habita nenhum palácio misterioso algures nos céus. Ele está sempre connosco no chão da vida. E o lugar decisivo do nosso encontro com Ele não é o templo ou o culto, mas as múltiplas misérias e carências de seus filhos, nossos irmãos. Só há duas maneiras de viver a vida: a primeira é vivê-la como se os milagres não existissem. A segunda é vivê-la como se tudo fosse milagre. Insiste-se muito hoje, na importância e necessidade de um choque tecnológico que nos capacite para um maior desenvolvimento e competitividade. Mas verdadeiramente urgente e fundamental é, também, um autêntico choque teológico que nos desperte e abra para o mistério de Deus, presente e interpelante em cada ser humano, e nos capacite, assim, para uma efectiva e salutar fraternidade. A vida é valor absoluto. Não existe vida menor ou maior, inferior ou superior... assim, engana-se quem mata ou subjuga um animal por julgá-lo um ser inferior. Diante da consciência que abriga a essência da vida, o crime é o mesmo. Porque os animais são anjos disfarçados, mandados à terra por Deus para mostrar ao homem o que é fidelidade. Urgente e fundamental é, pois, uma cultura que desenvolva em nós o sentido do respeito mútuo e da nossa interdependência, e nos abra para posturas mais colaborantes e solidárias. O imprevisto acontece e alguém te encontra. E te reencontra. Te reinventa. Te reencanta. Te recomeça. Há sempre um mas ...mas há sempre uma ligação muito forte assim como um grande compromisso para com eles todos, pois quer faça chuva ou sol, quer esteja calor ou frio quer esteja bem ou mal de saúde, quer apeteça ou não, quer tenhamos dinheiro ou não .. eles contam sempre com as mesmas pessoas ! Por muitas vezes termos de engolir as nossas próprias lágrimas. Só damos quando sentimos certezas em nossos corações!!! Obrigado, Senhor, por mais um dia vivido. Pelas alegrias que me levantaram e pelas dores que me fortaleceram, pelos sucessos e pelos fracassos que me ajudaram a perseverar. Pelos cuidados que me confortaram e pelas mágoas que me exercitaram para perdoar. Obrigado pelas horas de bem-estar. Obrigado pelos auxílios, pelos ganhos que fizeram de mim um ser mais confiante e pelas perdas que me demonstraram ser possível continuar. Pelos momentos altos que me exibiram tuas bênçãos e pelos momentos baixos que me abriram para tua protecção. Obrigado, Senhor, por jamais teres me esquecido. Obrigado, Senhor, por mais um dia vivido. Não há outro caminho para o mundo melhor que desejamos, nem para Deus, tal como nos diz, solenemente, o Evangelho. Não há vitória sem dificuldade. Não há superação sem obstáculo. Não há conquista sem esforço. Não há volta por cima sem se estar por baixo. O segredo não é que as coisas deram errado. É que elas precisavam de te trazer até aqui para que tudo comece a dar certo a partir de agora. Teria sido diferente se metade das suas palavras fossem atitudes. Ninguém merece manter o apego a coisas que não valem mais, que não servem mais, e que não levarão a sua vida para a frente. Não se apegue tanto. Olhe para você. Olhe para o próximo. Olhe para os animais. Olhe para a natureza. E promova o desapego, sempre. ‎"Preparas uma mesa perante mim na presença dos meus inimigos, unges a minha cabeça com óleo, o meu cálice transborda. Certamente que a bondade e a misericórdia me seguirão todos os dias da minha vida; e habitarei na casa do Senhor por longos dias." (Salmos, 23, 5-6) e "Vede, não desprezeis algum destes pequeninos, porque eu vos digo que os seus anjos nos céus sempre vêem a face de meu Pai que está nos céus." (Mateus, 18, 10). E, dia após dia, me levanto de todas as quedas, porque sei que se páro de lutar por mim, ninguém mais luta. "Então o Rei dirá aos que estiverem à sua direita: 'Vinde, benditos de meu Pai; recebei como herança o reino que vos está preparado desde a criação do mundo. Porque tive fome e deste-Me de comer; tive sede e deste-Me de beber; era peregrino e Me recolhestes; não tinha roupa e Me vestistes; estive doente e vieste visitar-Me; estava na prisão e foste ver-Me' ". Pensemos sobre isto, e que não fiquem apenas as palavras, mas que as passemos à prática, à acção. Se o fizermos, com certeza, viveremos num mundo bem melhor. A semana passada terminou o ano litúrgico, hoje começa o advento - o (re)encontro - preparemo-nos para tal, de coração limpo, com a pureza de sentimentos de que o ser humano é capaz, embora esqueça, dia após dia, essa faculdade que lhe foi concedida.

Thursday, November 24, 2011

Equivocos da democracia portuguesa - 150

O governo parece andar às curvas. Avança e recua consoante sente a contestação das populações. Foi o caso da intervenção na AR de Vítor Gaspar no âmbito da discussão na especialidade do OE 2012. Este começou por uma patética apologia dos funcionários públicos precisamente na semana em que se irá realizar a greve geral, numa clara tentativa de a desmobilizar ou minorar os seus impactos. O mesmo ministro que decretou o confisco do subsídio de Natal e de férias, tem agora o desplante de vir com falinhas mansas tentar amenisar a situação. Inclusivé, já veio anunciar que para o ano não se irão proceder a alterações salariais na função pública, num claro recuo ao que vinham afirmando no passado recente. O ministro da economia - cujo nome nunca nos lembramos! - só sabe vir à AR com uma agressividade inusitada, vinda dum mero assistente de faculdade, que ainda por cima, mal conhece o país visto estar emigrado à muito no Canadá. Miguel Relvas - o homem dos negócios em trono do BPN, ainda se lembram? - vem afinal dizer que o estudo feito para a televisão pública afinal não é tão bom assim, embora tenha sido pago com os nossos impostos, como não poderia deixar de ser. A situação já tomou tal foro que até José Manuel Fernandes já veio afirmar que "Duque foi desastrado", o que indicia que o estudo vai para o lixo porque dele pouco ou nada se aproveita. O "governador" da Madeira vai gastar 8,6 milhões de euros (!) só em fogos-de-artifício e iluminações de Natal, apesar de estar sem fundos, depois de ter levado a Madeira à bancarrota, e ainda por cima, estando a beneficiar dos dinheiros do Continente, ou seja, de todos nós. (E até, com a incompetência já habitual, o OE 2012 tem um erro que faz com que a dotação da Madeira aumente para o ano! Será erro fruto de incompetência, ou será compromisso assumido a ver se passava?) Logo numa altura em que o PSD-M faz aprovar uma lei em que um deputado pode representar 25!!! O ministro da educação vai aconselhando os jovens licenciados a procurarem outras paragens pela via da emigração, o mesmo que se tem verificado em alguns centros de emprego. No meio de tanto desaforo, o país vai-se afundando, com uma recessão cada vez maior - a revisão feita pelo governo após ter vindo cá a "troika" é disso exemplo - o que faz com que Portugal seja o único país em recessão para o próximo ano. A carga fiscal não pára de aumentar, e qualquer dia até pagaremos imposto pelo ar que respiramos. Afinal para quem tinha tantas ideias e tantos projectos para por o país a crescer - coisa que não é visível no OE para o ano -, afinal quem não votou o PEC 4 porque achava que os portugueses não suportariam mais carga fiscal, apesar das promessas (mentiras) apresentadas em campanha eleitoral temos uma mão cheia de nada. (Manuela Ferreira Leite já veio dizer que este é um governo que só sabe aumentar impostos e que o país chegou ao limite, isto é, o aumento de impostos já não significa aumento de receita). Ou melhor, temos uma mão cheia de impostos que nos esmagam, que destruíram a classe média, que provocaram um retorno civilizacional a níveis de 1974, que estão a destruir o SNS e a escola pública, enfim, estão a conduzir Portugal para a bancarrota, porque não seremos capazes de pagar, se quer, os encargos da dívida daí decorrentes. Numa altura em que, hoje, a Fitch corta o "rating" de Portugal para "lixo" e a agência chinesa Dagong o corta também passando de BBB+ para BB+ e ameaçando que reverá de novo em baixa, dada a falta de crescimento da economia, o que prova que as medidas têm sido inconsequentes e não têm convencido os mercados. E ainda acham que a greve geral não se justifica. E oxalá que fiquemos só por aí, porque o mal estar nas forças de segurança e nas forças armadas já é por demais visível e não se pode iludir. Mas se por cá as coisas apresentam este aspecto, na Europa não andam melhor. Embora se tenha assistido a mudanças de governos em Itália e Grécia, verificamos que a real situação dos dois países não melhorou. Agora temos uma mudança na Espanha e veremos o que daí virá. Porque à medida que os problemas estão a aproximar-se do núcleo duro da UE a estratégia começa a mudar. Já não são apenas os países periféricos que estão em causa, mas algo mais abrangente que já ameaça a própria França e poderá, a curto prazo, vir a ameaçar a Alemanha. Daí que cada vez mais se fale em "eurobonds" que até agora eram vistas com maus olhos pelo núcleo duro - Alemanha e França - e que dia após dia vão ganhando mais consistência, o mesmo se dizendo duma nova abordagem do BCE à situação europeia. Nada melhor para se mudar de estratégia quando vemos os nossos interesses atingidos. É o que está a acontecer na Europa que nunca soube ser solidária como um todo quando a situação assim o exigia. Mas nada que nos surpreenda, afinal, a direcção ultraliberal da UE é de sentido político idêntica à direcção política actual em Portugal, indo ambas de desastre em desastre até ao desastre final.

Tuesday, November 22, 2011

"O Último Segredo" - José Rodrigues dos Santos

'A inspectora esboçou um esgar inquisitivo. "Erros? Que erros?" O historiador susteve-lhe o olhar. "Não sabia? A Bíblia contém muitos erros". "O quê?" Tomás girou a cabeça em redor, procurando certificar-se de que ninguém o escutava. No fim de contas encontrava-se em pleno Vaticano e não queria desencadear nenhum incidente. Viu dois sacerdotes junto à porta que conduzia à Leonina, um deles devia ser o prefetto da biblioteca, mas concluiu que a distância era suficientemente grande e não corria o risco de ser escutado. Inclinou-se, mesmo assim, para a sua interlocutora e numa postura de conspirador preparou-se para a partilhar com ela um segredo com quase dois milénios. "São milhares de erros a infectar a Bíblia", murmurou. "Incluindo fraudes" '. Este é o leit-motiv do livro que hoje vos trago. O último romance de José Rodrigues dos Santos, num estilo muito próximo, criando uma polémica idêntica a que foi criada à uns anos atrás por Dan Brown com o seu famoso "O Código Da Vinci". Tal como aconteceu com este escritor, também Rodrigues dos Santos se viu alvo dum ataque de figuras cimeiras da Igreja que, normalmente e apressadamente, rejeitam tudo o que as possam pôr em causa. Se ainda existisse a "sagrada Inquisição" já sabíamos onde o escritor ía parar, e os seus livros seriam seguramente inscritos no Index para serem banidos, isto é, destruídos... queimados. Mas os tempos são outros e as coisas não se passam assim. Acho que esta atitude de figuras cimeiras da Igreja peca por desproporcionada e, tal como no livro de Dan Brown, só lhe faz publicidade - ainda por cima gratuíta - e leva a que pessoas que habitualmente não o leriam acabem por o fazer, quanto mais não seja, por curiosidade. Desde à muito que se levantam questões em torno da figura de Jesus Cristo e dos alicersses da Igreja cristã, sobretudo, daquela que tem mais impacto no mundo, a Igreja Católica. Mas, não é porque possa ser incómodo para qualquer um de nós, que a investigação não avance e torne claro tudo aquilo que nos foi transmitido pelos nossos ancestrais. Todos sabemos, e não precisamos de ser grandes estudiosos da matéria, que existem muitas pontas soltas em torno da questão do Cristianismo. E, para que não se alimentem polémicas desnecessárias, o aprofundar das questões só pode trazer benefícios à clarificação das situações, deixando de permanecer a dúvida. Este é seguramente um grande romance, mais um "best-seller" do autor, que levanta questões importantes e nos deixa a pensar. E o criar em nós interrogações já é um bom princípio. Quanto ao autor, não necessita de apresentações. Primeiro, porque já aqui fiz a sua apologia em obras anteriores, depois, porque é um pivot conhecido da RTP1 que nos entra diariamente portas a dentro no Jornal da Noite. Refiro apenas que, Rodrigues dos Santos nasceu em 1964 em Moçambique. Abraçou o jornalismo em 1981, na Rádio Macau, tendo ainda trabalhado na BBC e sido colaborador permanente da CNN. Doutorado em Ciências da Comunicação, é agora professor da Universidade Nova de Lisboa e jornalista da RTP. Trata-se de um dos mais premiados jornalistas portugueses, galardoado com dois prémios do Clube Português de Imprensa e três da CNN, entre outros. Neste seu nono romance, Rodrigues dos Santos recupera a figura do historiador Tomás Noronha, uma espécie de Sherlock Holmes dos nossos dias, em torno do qual faz desenrolar os seus enredos. Livro polémico, muito bem construído, que certamente contará, - como os anteriores -, com o favor do público. Afinal Rodrigues dos Santos é o escritor mais lido entre nós. Aqui fica a sugestão e o convite para uma leitura que será, seguramente, muito interessante. Imperdível.

Sunday, November 20, 2011

"A Foot In The Door" - The Best Of Pink Floyd

Foi editado à dias a última colectânea - mais uma - da obra dos Pink Floyd. Normalmente não faço a apologia destas edições, porque vejo nelas uma de duas razões: Ou se amputam grandes obras apenas para reter as partes mais populares para o público ou, em alternativa, se repescam os temas mais interessantes para dar a ideia dum artista que, por vezes, não o merece nem tem estatuto para isso. Contudo, aqui não é o caso. Esta colectânea percorre toda a obra dos Pink Floyd desde os tempos de Syd Barrett até ao seu último álbum, com um rigor e uma mestria ímpar. Retirando as partes mais ouvidas pelo público, não se deixa enredar no facilistismo deste tipo de edições, promovendo um rigor de apresentação verdadeiramente notável. Esta colectânea dá uma ideia muito precisa - para aqueles que não seguiram os Pink Floyd - da sua vasta e excepcional obra. Como é do conhecimento geral, muitos dos álbuns dos Pink Floyd, são álbuns conceptuais, isto é, têm faixas longas e com estreita ligação umas às outras. Apesar disso, esta colectânea consegue quase fazer o mesmo, só que a ligação entre as faixas salta de álbum em álbum. Embora não trazendo nada de novo à obra dos Pink Floyd, quase me atrevia a dizer que, parece um novo álbum da banda, pelo rigor do alinhamento e pela selecção cuidada. Uma colectânea a reter, a ouvir obrigatoriamente, com deleite como sempre acontece com este grupo de artistas de eleição. Já agora, permitam-me uma palavra para a capa. Ela reproduz algumas das capaz icónicas dos discos do grupo num arranjo feliz e que faz lembrar aquelas excelentes capas que se viam noutros tempos ainda com os discos de vynil. Numa altura em que o Natal já se prefigura no horizonte, esta poderá ser uma excelente prenda. E como estamos em momentos de crise, diria que é uma prenda barata mas com um significado enorme, sobretudo, para todos aqueles que fizeram dos Pink Floyd uma banda de excepção. Não a deixem passar ao lado. Vão ver que vale a pena gastar algum tempo a ouvi-la. Rigorosamente a não perder.

Thursday, November 17, 2011

Equivocos da democracia portuguesa - 149

Esta semana tem sido fértil em acontecimentos. Desde logo, o famoso "estudo" feito sobre a RTP e liderado pelo prof. João Duque. Um estudo que custou seguramente muito a cada um de nós e que agora vai parar ao lixo. João Duque, sempre sapiente do cimo da sua cátedra, parece que afinal não sabe em que país vive - ele que tanto critica tudo e tudos pelo mesmo motivo - quando propõe a extinção da RTP Informação e a fusão da RTP África com a RTP Internacional. Isso significa que, duma maneira velada, João Duque incita ao controle dos conteúdos informativos da RTP eliminando aquele que - pela sua natureza - é o canal nobre de informação. Ele que tanto criticou o governo anterior, acusando-o de controle da informação, afinal vem propôr algo mais radical que é uma espécie de "censura governamental" aos conteúdos informativos e, pelo sim pelo não, reduzir estes ao mínimo possível. Tal levou até a que um deputado do CDS - partido da coligação - viesse a terreiro criticar fortemente este "estudo". João Duque, apesar da sua pose mais ou menos liberal, não consegue esconder um certo passado mais esquerdista - leia-se PCP - mantendo uma visão, que inclusivé este partido, já à muito abandonou. "Olha para o que eu digo, mas não olhes para o que eu faço", diz o provérbio popular, e nunca como agora ele tem expressão mais ajustada. O próprio governo certamente incomodado com as repercurssões do documento, já veio dizer, através do ministro da tutela - Miguel Relvas - que não concorda com muitos dos postulados. Mas as contradições não acabam aqui. O desemprego - grande pecha da situação actual - vai aumentando paulatinamente, aparentemente sem controle, voltando a atingir novo máximo, 12,4%. Contudo, o ministro das finanças já veio anunciar, no seu ar mansinho, que a situação se vai agravar e muito no próximo ano. Significa que a situação do país está sem controle e o governo - apesar dos apoios da "troika" , em público - não consegue deslindar a situação do país conduzindo-o para um abismo que se nos afigura cada vez mais próximo. As exportações, que até agora tinham vindo a suster a situação, também elas acabaram por cair, o que significa que a breve trecho estaremos mergulhados numa situação insustentável. Pelo terceiro trimestre consecutivo, o PIB voltou a regredir, o que quer dizer que Portugal é o único país em recessão técnica no próximo ano! Para quem criticava o anterior executivo não deixa de ser curioso que agora peçam a compreensão dos portugueses. Nunca se chegou a uma situação destas desde o 25 de Abril de 1974 e, sobretudo, em tão pouco tempo. É preciso não esquecer que o governo leva cerca de seis meses de actividade. Mas, como se isso não bastasse, agora até o ministro da economia - cujo nome nunca nos lembrámos, porque será? - veio afirmar bombasticamente que a crise acaba no início de 2013. Já outros antes dele fizeram a triste figura que este está a fazer. Todos sabemos que não será assim, mesmo quando nos tentam atirar areia para os olhos. O ministro das finanças não escondeu a questão e foi mais sério nas afirmações, quando afirmou que "Portugal vai necessitar de ajuda para além de 2013". Coisa que já aqui dissemos por várias vezes, porque a situação que se tem pela frente é trabalho para uma geração. Mas a "troika" que veio cá ver como andam as coisas foi ainda mais longe. "Se houver algum precalço este trabalho foi em vão, e isso é sempre possível porque depende de factores externos". Aqui está tudo dito. Como país dependente do exterior, Portugal estará sempre condicionado pelo que lá fora acontece, e como por lá as coisas não andam melhor, o mais certo será que no fim tudo vá por água abaixo e Portugal entre numa espiral recessiva semelhante áquela que está a destruir a Grécia. Manuela Ferreira Leite já o veio dizer, e agora a "troika" não o escondeu, assumindo essa realidade com as cautelas que a situação exige para não criar alarmismos nas populações. Mas esta é a realidade. Mas então porque é que o governo está a ir muito para além do que a "troika" admite? Por uma simples razão. Em 2013 começa um ciclo eleitoral que irá terminar mais à frente com a eleição dum novo governo e dum novo PR. As autárquicas vêm em primeiro lugar e o PSD - partido com vocação autárquica - não as quer perder, porque isso será um sinal para o governo. (Lembram-se do que aconteceu em idêntica situação com António Guterres?) Assim, à que colocar tudo o que de pior tem que ser feito em 2012 para em 2013 aparecer com alguma abertura para, mais uma vez, iludir os portugueses. Este é o ciclo infernal da nossa política que vem depauperando o país. A menos que a UE nos pregue uma partida, coisa que não é difícil de advinhar, face à situação que nela se vive. Com a Grécia em frangalhos, com a Itália sem saber bem o que fazer, com uma Espanha que ameaça ser o seguinte, com o "rating" dos bancos alemães a baixar(!) - como aconteceu ontem com a Moody's ao baixar o "rating" para dez bancos alemães - é de admitir que o cenário não está fácil e que ainda muita água irá correr sob as pontes. Já se vai falando duma Europa a duas velocidades, o que seria péssimo para os países periféricos como Portugal, inclusivé com a possível saída do euro, coisa que a acontecer seria catastrófico para os países com problemas como Portugal, bem como, para o próprio euro e, quiçá, para a Europa. Neste emaranhado de problemas, ainda bem que temos um "iluminado" no governo que já afirmou que a crise ía acabar no início de 2013, só falta publicar o decreto! Ministros destes é que Portugal precisa para mostrar à Europa e ao mundo como se governa!!!

Wednesday, November 16, 2011

Conversas comigo mesmo - XLI

"... Vigiai, porque não sabeis o dia nem a hora". Hoje retenho-me sobre o capítulo sétimo de Mateus. O encontro é o mote. O encontro, a sua qualidade, o seu valor e o sentido dependem muito da qualidade e do valor de certos encontros e, fundamentalmente, da profundidade do nosso encontro com Deus. Encontro para o qual, de muitos modos, Ele nos chama, ao longo da nossa vida. Na nossa cultura judaico-cristã, Deus é a verdade, a vida e o amor que se oferece a cada um de nós para um encontro final e decisivo. Encontro que ele não quer que falhamos e que é suma insensatez não preparar. Como o azeite para a luz que algumas das virgens - convidadas da noiva - não souberam providenciar, tentando pedir às outras mais previdentes que, contudo, não o podiam ceder porque também lhes iria fazer falta. É bom dizer que as luzes nessa época duravam cerca de quinze minutos o que implicava que se tivesse que ter alguma provisão de azeite para as continuar a abastecer. (Mais uma vez recorro ao capítulo sétimo de Mateus). É a esta luz que se deve procurar o sentido profundo da parábola que Jesus nos conta, pois, aparentemente, contém aspectos pouco "exemplares" e pouco evangélicos. Não poderia o esposo ser mais tolerante para com o atraso das insensatas? Não poderiam as prudentes ser mais compreensivas e solidárias? O que acontece é que esta parábola não se destina a classificar moralmente as relações entre as suas personagens. O seu objectivo é outro e liga-se à exortação final: "Vigiai, porque não sabeis nem o dia nem a hora!" Como na espera do noivo que se atrasou e fez com que as convidadas da noivas quase adormecessem. (Ainda o recurso a Mateus capítulo sétimo). Quando uma coisa é realmente importante na nossa vida e para a nossa vida merece-nos com certeza toda a atenção e uma cuidadosa preparação. Não será, por isso, insensatez, não cuidar do encontro mais importante na nossa vida? A Fé é também um talento que Deus nos confia em ordem a uma tarefa ou missão. E o que se pode fazer, motivado e impulsionado por essa virtude, está bem patente na vida daquela mulher que o Livro dos Provérbios tanto elogia: dedicação à família, espírito de trabalho e de serviço, abertura à comunidade humana e particular atenção aos mais necessitados, bem como à natureza e aos animais, (lembre-mo-nos do exemplo de S. Francisco de Assis). Fica pois bem claro que a fé, quando verdadeiramente assumida e vivida longe de nos afastar ou de nos alhear de quanto nos rodeia, torna-nos antes mais próximos, mais atentos e mais disponíveis, produzindo sentido de co-responsabilidade, fraternidade activa, actos de amor e de alegria, empenhamento na vida social, interesse pela comunidade de que se é membro e participação diligente nas suas actividades, conforme as circunstâncias e possibilidades reais. Pelo contrário, se não aplicamos, coerentemente, a cada área da nossa vida, aquilo em que acreditamos, a fé torna-se, então, naquele talento enterrado e improdutivo de que nos fala o Evangelho. E quem deixa que a sua fé se torne um talento estéril, tem na parábola esta bem triste classificação, "servo mau e preguiçoso..." ou pior ainda, "servo inútil".

Monday, November 14, 2011

Equivocos da democracia portuguesa - 148

"Hoje sinto uma perda discreta e progressiva do poder de quem nos governa e as causas são várias". Estas são palavras de D. José Policarpo, cardeal patriarca de Lisboa. E acrescentou: "Liberdade do poder financeira frente à economia". Todos sabemos da extrema discrição que os membros da Igreja colocam nas suas palavras e, sobretudo, as suas mais altas figuras. Quando o cardeal patriarca de Lisboa faz estas afirmações, isso significa que o debate interno já vai longo, e é preciso passá-lo, embora discretamente, para o público. E nada mais acertadas do que essas palavras. Vemos um PM agarrado às ideias de Merkel, o que levou até a vermos a discrepância das opiniões entre este e o PR. Será que Passos Coelho é uma espécie de embaixador de Merkel entre nós? Ainda não vimos uma única ideia do PM desde que tomou posse, limitando-se a reproduzir o que a chanceler alemã diz, como se fosse apenas uma espécie de relógio falante de origem alemã. Cavaco Silva volta a insistir na tónica da intervenção mais clara do BCE nas economias e não só das periféricas coisa que Merkel e Passos Coelho acham errado. Todos sabemos que o que se está a passar em Portugal vai muito para além do programa da "troika", e é isso que não se compreende. Porque ir mais além e conduzir o país para um empobrecimento gigantesco de que dificilmente sairá? Isto diz bem das fracturas que começam a existir na sociedade portuguesa - e na classe política - que leva a que o PR e o PM assumam publicamente as suas divergências. Cavaco sempre tentou proteger este governo - afinal era o seu governo, o governo do seu partido -, mas o caminho que vem a ser seguido assume-se tão radical que, nem ele, pode evitar a discordância. As manifestções de rua começam a tornar-se mais radicalizadas e os protagonistas começam a ser diferentes. Se as manifestações organizadas pelos sindicatos fazem parte do jogo democrático, já quando vemos os militares na rua devemos pensar de modo bem diferente. Temos que ficar incomodados com a situação a que o país chegou e para onde o querem conduzir, levando a um empobrecimento nunca antes visto em Portugal. Afinal, como dizia ontem Mário Soares: "Os que nos emprestaram o dinheiro não nos deram uma esmola, estão a receber o seu juro, e vão ganhar muito dinheiro com isso. Daí não ser admissível que sejam eles que vêm governar Portugal". Palavras acertivas dum homem que - também ele teve que negociar com o FMI nos anos 80 - por isso, sabe bem do que fala. No governo não se pensa assim, vigora a tese do "bom aluno" e o resultado está à vista. Na UE as coisas não andam melhor. A poderosa Merkel continua a impôr governos, - como aconteceu na semana passada na Grécia e ontem na Itália -, na tentativa de criar uma espécie de embaixadas alemães que dominem esses países e os conduzem ao sabor daquilo que ela pensa ser o melhor para a ... Alemanha! Hoje é evidente que enquanto o BCE não emitir mais moeda e não forem criadas as "eurobonds" a Europa não sairá do impasse em que se encontra. O empobrecimento dos países periféricos será uma realidade, a UE ficará cada vez mais fragilizada e o euro correrá o risco de se estilhaçar. O projecto europeu foi pensado para ser uma federação, e enquanto os seus membros não o admitirem, a UE será sempre um projecto adiado, senão mesmo, um projecto falhado. A racionalidade política está a perder-se, os mercados estão sem lei, e comandam a economia e, como dizia o cardeal patriarca, os políticos têm cada vez menos poder, passando a ser agentes de interesses de potências outras, que não dos seus próprios países. Assim, o sonho de Jean Monet quando pensou o projecto europeu, depois brilhantemente continuado por Jacques Delors, permanecerá adiado. Se algum caminho se fez, foi pressionado por políticos da velha guarda, - como Delors -, que já estão fartos de ver tanto desaforo. A confusão é muita e se não se colocarem os pontos nos iis, os países periféricos correm o risco de implosão ou de perda de soberania. Provavelmente será isso que Angela Merkel quer. E o que quererá Passos Coelho?

Sunday, November 13, 2011

"Os livros, esses animais opacos por fora, essas donzelas. Os livros caem do ceu, fazem grandes linhas rectas e, ao atingir o chao, explodem em silencio. Tudo neles e' absoluto, ate' as contradicoes em que tropec,am. E estao la, aqui, a olhar-nos de todos os lados, a hipnotizar-nos por telepatia. Devemos-lhes tanto, ate' a loucura, ate' os pesadelos, ate' a esperanca em todas as suas formas." JLP in Abrac,oFoi um grande momento este. Ainda estou a processar estas linhas!
“Não há vitória sem dificuldade. Não há superação sem obstáculo. Não há conquist...a sem esforço. Não há volta por cima sem se estar por baixo.”
Um segredo: Não é que as coisas deram errado. É que elas precisavam te trazer at...é aqui para que tudo comece a dar certo à partir de agora.
Teria sido diferente.. Se metade das suas palavras, fossem atitudes.
Ninguém merece manter o apego a coisas que não valem mais,que não servem
mais,e que não levarão a sua vida pra frente.Não se apegue
tanto.Olhe pra você.Olhe pro próximo.E promova o desapego,
sempre.

Saturday, November 12, 2011

Conversas comigo mesmo - XL

Cumpre-se hoje, dia 12 de Novembro, o primeiro mês de existência da Inês. A Inês do meu contentamento começa a coleccionar o tempo. Este é o primeiro mês de muitíssimos que desejo que tenha. A flor do meu jardim de Outono está mais bela e formosa do que nunca. As feições vão ganhando forma mais expressiva, os olhos ávidos vão buscando com cada vez mais clareza, as imagens do mundo que será o seu. Os sentidos vão-se apurando, enfim, a mais bela flor do meu jardim de Outono vai-se aprimorando. Vou vê-la com regularidade, porque me é difícil estar longe, embora esteja perto. Mas para mim, é também a deliciosa descoberta de ver os mistérios da vida a desenrolarem-se perante os meus olhos. O seu crescimento começa a ser notado, a sua força e determinação também, e assim espero que continue pela vida fora. Daqui a algum tempo será o celebrar da primeira papa, do primeiro dente, do primeiro passo, das tentativas atabalhoadas de se manter erguida. Enfim, o desenrolar e o desenvolver da vida na sua plenitude. Cada vez mais, e paralelamente a tudo isto, a Inês vai penetrando mais fundo na minha vida. Vai ocupando o espaço no meu coração dum lugar que antes de o ser já o era. A Inês do meu contentamento está a preparar-se para palmilhar a estrada da vida e cumprir assim a sua lenda pessoal. Inês ser de luz, cada vez mais gloriosa, vai cantando laudas ao mundo embrulhada no nome de rainha que ostenta. Vai cantando louvores ao mundo com a sua beleza, com a sua força, com a sua determinação. "Não nasceste em vão, ergue-te e prepara-te para a vida", são ainda as palavras sublinhadas pela sempre grandiosa música de Mahler a ecoar nos meus ouvidos. A mais bela flor do meu jardim de Outono celebra hoje o seu primeiro mês de vida. Duma vida que se deseja longa e preenchida, uma vida solidária com o mundo que a rodeia. Não basta passar pela vida é necessário deixar nela a sua marca e estou certo que a Inês do meu contentamento não me defraudará neste desejo que tenho para com ela, não me desiludirá nas muitas expectativas que deposito na sua existência. Se à uns meses atrás a minha vida mudou muito face à expectativa da vinda desta bela flor do meu jardim de Outono, desde à um mês ela tomou uma abrangência que pensava que jamais teria. A Inês do meu contentamento vai gravando o seu nome a fogo no meu coração, um fogo que não queima porque é um fogo de amor, um fogo que não arde porque é um fogo de paixão. A mais bela flor do meu jardim de Outono já é dona do meu coração e da minha vida à muito, mesmo sem o saber e sem ter ainda consciência disso. Um dia, quando muitíssimos meses - muitos anos, seguramente! - tiverem passado por cima dela, espero que leia aquilo que escrevo e que o compreenda. Que sinta o mesmo carinho que sinto por ela quando alinho estas palavras no papel, que sinta o mesmo amor que sinto por ela quando, letra após letra, vou preenchendo este espaço - vou sujando o papel alvo - na expectativa de que no final façam algum sentido. E se na altura achar que tudo isto não passa duma tonteria, pois só me resta pedir-lhe perdão com humildade pelas tolices que por vezes o coração nos impõe, pela estultícia deste pobre escriba que nada mais pretende do que celebrar a sua Inês, a mais bela flor do seu jardim de Outono quando já, lá ao longe, se aproxima inexoravelmente o seu Inverno. A Inês será sempre a Primavera florida da minha vida, será o calor do Verão que me aquecerá no meu Inverno profundo, será a celebração da vida naquilo que ela terá de mais puro. A Inês do meu contentamento continuará a sua caminhada, quando eu já por aqui não andar, mas estou certo que será sempre a luz do meu caminho, do caminho que terei que percorrer um dia como todos nós. O primeiro mês será a epifania do seu primeiro passo, passo firme e determinado, para a vida que a espera. Parabéns Inês pela tua primeira etapa. Cá estarei para celebrar outras que hás-de conseguir com o mesmo empenho com que celebro esta. A Inês do meu contentamento veio, pela primeira vez, a minha casa à uns dias atrás. Ainda sem a percepção do mundo que a cerca teve o primeiro contacto com um lar que a recebe com muito amor e carinho, com os seus animais que a hão-de acarinhar como ela os há-de acarinhar a eles, porque será, seguramente, uma defensora deles e dos seus direitos. A Inês do meu contentamento fez a primeira aparição entre nós, a primeira de muitas certamente, trazendo a sua luz que brilha com intensidade. Mas, pela primeira vez, queria aqui trazer uma outra personagem de que gosto muito. A Inês do meu contentamento tem um irmão, o Tiago, e trago-o hoje aqui, não só pelo carinho que com ele também compartilho, mas pela harmonia que é bonita de ver entre estes dois seres. Prova disso, é a foto que junto e que diz bem da ideia de candura que a inocência das crianças nos transmite. Como dizia Fernando Pessoa: "... O melhor do mundo são as crianças". Não sei se é assim, mas sei que, a Inês criança, a Inês amor, será a mais bela flor do meu jardim de Outono. Deste jardim que tem um jardineiro exigente mas, mesmo assim, ela sobressai (sobressairá) poderosa de todas as outras. Não sei se é o rigor da análise que me dita estas palavras, se é o coração que me tolhe os sentidos, mas estou em crer que é a primeira que me impele a vontade. Contudo, e como tenho vindo a dizer ao longo do tempo, ainda resta um segredo para ser desvendado. O que está oculto brevemente será revelado, - proclamo com insistência -, mas até lá só resta a especulação e a contemplação desta bela criança, a Inês do meu contentamento, a mais bela flor do meu jardim de Outono.

Thursday, November 10, 2011

Equivocos da democracia portuguesa - 147

Aquilo que à uns meses atrás parecia ser exclusivo da política portuguesa e do governo de então, afinal é mais profundo, como por variadas vezes aqui o dissemos, embora os políticos - hoje no governo e então na oposição - negavam na sua ânsia indomável para "ir ao pote". O governo foi subtituído mas as dificuldades continuaram, ou melhor dizendo, agravaram-se e continuar-se-ão a agravar enquanto os responsáveis políticos não perceberem que enquanto não puserem a economia nacional a crescer estão perante uma batalha perdida. A rua já começou a falar com a greve dos transportes, - a forma mais eficiente de parar um país -, e outras se desenham no horizonte, vindo a culminar com a greve geral de 24 do corrente. As forças militares e paramilitares não escondem o seu desconforto, - atente-se nas declarações recentes de Vasco Lourenço e de ontem de Otelo -, e perante isto o governo parece que não tem nada a dizer aos portugueses de cima da sua maioria. Passos Coelho parece que ainda não percebeu que as maiorias também se abatem e já o devia ter entendido porque em Portugal tal já se verificou. Mas o desnorte é imenso e o prometido diálogo com a oposição - leia-se o PS - sobre a austeridade que está a ser implementada não passa duma falácia, tal como, a política que estão a seguir depois de terem sofragado um programa em campanha eleitoral que nada tem a ver com aquilo que estamos a passar. E quando o líder socialista tenta evitar o corte de um dos subsídios face à folga existente no OE, logo Miguel Relvas aparece a dizer que não. (Num coro estranho a que se juntou, logo de seguida, Marques Guedes, num discurso verdadeiramente ensaiado). Tudo isto é uma vergonha a que estamos a assistir e uma trapassa, coisa já habitual entre nós - infelizmente - entre o programa que se apresenta e a política que se segue quando se é governo. O "governador" da Madeira continua com as suas diatribes, agora foi o dar tolerância de ponto aos funcionários públicos para assistirem à tomada de posse dele mesmo pela... televisão! Isto é Portugal no seu melhor. Mas afinal o problema que era só de Portugal e de Sócrates, como muitos diziam, mesmo figuras com elevada responsabilidade do Estado, vemos agora que não era assim, os problemas da Grécia estão a levar a uma crise sem precedentes, a Irlanda vai recuperando, embora o caso irlandês saia da alçada dos restante por ser meramente financeiro, Portugal que está na situação em que está, e agora a Espanha que começa a ver-se acossada, a Itália que está na eminência da derrocada - com a imposição da saída de Berlusconi de cena - por imposição da UE, com a França a fazer profundas reformas para evitar que a sua economia deixe de ser AAA, enfim, o problema era (é) mais vasto do que aquilo que por cá alguns pretendiam fazer crer. Temos vindo a referir neste espaço que podemos estar na eminência duma quebra profunda das economias a nível global se estas não forem capazes de criar uma estratégia comum, entrando numa espiral recessiva que conduzirá a um retrocesso civilizacional de mais do que uma década. Curiosamente, ontem vimos este mesmo postulado defendido pela directora-geral do FMI, Christine Lagarde, que veio avisar - mais uma vez - para o perigo que tudo isto representa se não formos capazes de por de lado as nossas divergências. Assim se prova que quando alguns achavam que não se deviam criticar os mercados, porque eles sempre têm razão, agora já pensam o contrário, dando-se até ao luxo de irem à ONU porque o que vêem nos jornais sobre Portugal não lhes agrada e querem melhorar a imagem do nosso país. Porque não o fez antes mas só agora que o seu partido é poder? Cavaco Silva deve muitas explicações aos portugueses. Já aqui o dissemos, por mais de uma vez, que o PR é o mais partidário de sempre, um verdadeiro PR de facção. E será bom que não esqueçamos isso, caso contrário, até pensamos que - pelo comportamento - temos um PR que não o actual. Cavaco devia ter feito muito mais e não fez, como anteontem Soares dos Santos (presidente do grupo Jerónimo Martins) disse: "Temos um presidente que não faz nada"! Entretanto, os presidentes dos principais bancos já fizeram chegar a Olli Rehn uma carta a dizer que evite que o governo português intervenha nos bancos, bancos que estão mais em dificuldade caso a Itália venha a ter problemas - como tudo leva a crer - do que a Grécia. Nesta confusão, o directório Sarkozy/Merkel que criar uma UE a duas velocidades, afastando os países periféricos do euro. Esquecem que quando criaram o euro, deram um paso importante no caminho da federalização da UE, embora o queiram renegar agora. E também esquecem que, enquanto não criarem as obrigações europeias (eurobonds) não sairão desta encruzilhada. Tudo isto, contudo, parece difícil com o directório ultraliberal que hoje impõe os caminhos ao resto da união. A menos que a isso sejam obrigados! É caso para dizer que quando se perdem os anéis que se salvem os dedos. Contudo, a incongruência destas ideias é enorme porque, não devemos esquecer, que foi este directório com as suas hesitações, que conduziram a UE para a beira do precipício em que se encontra. A crise está longe do fim, e se os países periféricos vão (estão) a passar por dificuldades, não é seguro que os mais ricos lhe passem ao lado. Ainda muita água há-de correr sob as pontes e então veremos o que ficará de tudo isto.

Tuesday, November 08, 2011

"Pensa num Número" - John Verdon

"Pensa num Número" é o "thriller" de estreia de John Verdon e uma revelação internacional. O "thriller" revelação deste ano é publicado pela Porto Editora. O sucesso de "Pensa num Número", aclamado pela crítica internacional e com direitos de tradução vendidos para vinte e quatro países, fica a dever-se, sobretudo, ao suspense do enredo, ao realismo das descrições e às fortes personagens, como o assassino capaz de descodificar o pensamento das suas vítimas e o detective que, segundo o Washington Post e o New York Times, rivaliza com Sherlock Holmes e Poirot. Na sinopse do livro lê-mos: "Pelo correio chega uma série de cartas perturbadoras que terminam com uma declaração inquietante: 'Pensa num número qualquer até mil, o primeiro que te vier à cabeça... Repara agora como eu conheço bem os teus segredos'. Estranhamente, aqueles que obedecem constatam que o remetente de tais cartas previu com precisão a sua escolha. Para Dave Gurney, um inspector de homicídios recém-reformado da Polícia de Nova Iorque e amigo de um dos alvos das missivas, o que primeiro lhe pareceu um caso estranho depressa se transforma num complicado quebra-cabeças que levará a uma investigação em grande escala na busca de um pérfido assassino em série. Convidado como consultor pelo gabinete do procurador, em pouco tempo Gurney consegue alguns avanços na descoberta de pistas que a polícia local negligenciara. Ainda assim, diante de um adversário que parece ter o dom da clarividência e antecipar-se a todos os passos, vê os seus melhores esforços dissiparem-se como areia por entre os dedos. Terá encontrado, ao fim de vinte e cinco anos de carreira exemplar, um adversário capaz de o vencer? Considerado pela crítica internacional uma obra-prima do suspense, "Pensa num Número" dá-nos a conhecer uma personagem fascinante, capaz de rivalizar com Sherlock Holmes ou Poirot". Ao olharmos para estas palavras ficaríamos com a sensação de que estávamos perante um livro fascinante. Não creio ser o caso. Embora o livro esteja muito bem escrito, a história bem ordida, penso ser excessiva a comparação com clássicos do "thriller" citados. Ao fim e ao cabo, "Pensa num Número" é o romance de estreia do seu autor, - John Verdon -, embora, curiosamente, já se encontre publicado em vinte e quatro países. John Verdon trabalhou durante vários anos como director criativo em agências de publicidade de Manhattan. Logo após o 11 de Setembro de 2001, mudou-se para uma pequena localidade no norte do estado de Nova Iorque, onde se dedica à escrita a tempo inteiro. Não deixo de achar interessante este livro, mas aguardarei o desenvolvimento em futuras edições para fazer um juízo mais ajustado. Para já, fica a nota dum livro interessante, mas não ao ponto de o emparelhar ao lado dos grandes livros e dos grandes autores do género. Veremos o que as obras futuras do autor nos revelarão.

Sunday, November 06, 2011

Conversas comigo mesmo - XXXIX

"Se não poderes ser uma estrada sê apenas uma senda se não poderes ser o sol, sê uma estrela
não é pelo tamanho que terás exito ou fracasso. Mas sê o melhor, no que quer que sejas!.." Quem escreveu isto foi o grande pintor espanhol Pablo Picasso. Mas isto é aquilo que é a senda de cada um de nós se quiser ir em frente na vida. O amadorismo é algo que não cabe no meu horizonte. E será bom que os mais jovens comecem a pensar que só assim encontrarão um rumo na sua vida, num mundo em crise onde a competição é a palavra de ordem. E não vale a pena desesperar, as coisas são como são. Mesmo quando o desalento impera nada melhor do que pensar que no mundo em que vivemos a lei do mais forte e o instinto de sobrevivência são as palavras de ordem. E porque não ter um espírito positivo e pensar que se existir guerra, que seja de travesseiro. Se existir fome, que seja de amor. Se for para aquecer, que seja o sol. Se for para enganar, que seja o estômago. Se for para chorar, que seja de alegria. Se for para mentir, que seja a idade. Se for para roubar, que seja um beijo. Se for para perder, que seja o medo. Se for para cair, que seja na gandaia. Se for para ser feliz, que seja o TEMPO TODO. À que colocar um ponto final em todas vírgulas que nos incomodam. E devemos sempre pensar que não temos inimigos... temos apenas concorrentes que gostariam de ser iguais a nós. Com espírito aberto, à que lutar por dias melhores, com pensamento positivo pensando que o amanhã será melhor do que o hoje, na busca do nosso caminho por vezes encoberto pela bruma, como se fosse um nevoeiro espesso e denso, que nada deixa ver. E temos que ter sempre a ânsia de aprender. Aprender com os seres que nos cercam e que por vezes ignoramos. Aprender com a abelha a constância no trabalho e no colectivo; com a águia o desejo de alcançar metas altas e belas; com o burro a paciência, a humildade e a bondade; com o cão a fidelidade, a lealdade e a amizade; com a formiga a diligência no trabalho e a força para vencer obstáculos; com o gato a prudência, a limpeza e a vigilância; com o mosquito a persistência que o leva a insistir sem desanimar; com a ovelha a mansidão e o desejo de viver em fraternidade; com o rato a esperteza e a agilidade no quotidiano; com o pelicano a dedicação, o amor e a solidariedade; com o golfinho a simpatia, a inteligência e a afectividade. Como vemos, na natureza bela que nos cerca podemos aprender de muitas maneiras, assim o queiramos e estejemos de espírito aberto para isso. Nos dias que correm, talvez tenhamos que regressar às origens, duma certa forma, à simplicidade que esquecemos, à pureza que ignoramos, à singeleza que, por vezes, abominamos. Mas os tempos ditam-nos que tem que ser assim. Por isso, devemos abrir-nos ao mundo que nos rodeia. Devemos abrir-nos aos sinais do mundo.

Friday, November 04, 2011

Equivocos da democracia portuguesa - 146

O ministro da educação já informou que a informática do 9º ano vai ser banida das escolas no próximo ano. Assim, pensa poupar mais uns quantos milhões de euros. Depois do grande investimento feito pelo governo anterior esta medida é no mínimo insólita e diz bem dos ziguezagues do governo. Como já aqui dissemos noutra altura, em Portugal não há continuidade de políticas, assistindo-se aos avanços e recuos consoante a força política no poder. Para este governo ultraliberal, a cultura é algo que incomóda, talvez até assuste. Já tínhamos visto isso no passado e pensavamos que não voltaríamos a assistir ao mesmo no presente. Afinal tivemos um 25 de Abril em 1974! Já agora, deixamos uma sugestão ao governo. Porque não encerrar todas as escolas, acabar com o ensino, e assim poupar em infraestruturas, em professores e até... no ministério, no ministro e no seu séquito? Para ampliar a "trapalhada" em que o governo está metido o PM acabou por anunciar que se prepara para renegociar a dívida com a "troika", embora o tivesse negado sempre desde o início. Mas o mais grave é que tal informação tenha sido produzida num país estrangeiro - Paraguai - e no âmbito da Cimeira Ibero-Americana cuja ligação ainda não se vislumbrou. Paulo Portas que tanto criticou o PM anterior pela relação que tinha com Hugo Chavez que muitas portas abriu, vem agora dizer que fez um sem número de negócios e até, no calor do discurso, desejou, publicamente, as melhoras ao presidente da Venezuela!!! O problema das Scut's continua adiado, agora foi Cavaco a pedir esclarecimentos! O plafonamento das autarquias anunciado com pompa e circunstância, afinal parece que já não vai adiante! Em suma, a "trapalhada" institucionalizada. Mas não se espantem com aquilo que por cá se passa, afinal na UE assistimos a coisas que não lhe ficam atrás. Desde logo, aquela que o PM grego, Georgios Papandreu, tomou após a cimeira com a UE que lhe resolveu o problema interno, que foi o propor um referendo. Mas afinal que tipo de referendo? Se for para manter a Grécia no euro, tal será positivo certamente, se for para buscar apoio para um novo pacote de austeridade, contará com a oposição dos gregos com toda a certeza. Ninguém ainda entendeu o porquê de tal atitude. Nós também não, embora possamos compreender, mas se tivermos informações adicionais que ainda não dispomos. Entretanto, este simples gesto da Grécia veio mergulhar a restante Europa numa crise sem precedentes, afectando todos, especialmente, aqueles que como Portugal e a Irlanda estão a obter ajuda. As bolsas tremeram, os mercados afiaram as facas, enfim, o caos instalou-se de novo, se é que algumas vez abrandou. Parece que retornamos ao início da crise, mas agora, com ondas de choque muito mais violentas e avassaladoras. O PM grego tem todo o direito de referendar os assuntos que dizem respeito à Grécia, embora ainda não conheçamos todos os contornos que levaram a tal situação. Será que existiu algo dentro da cimeira da UE que Papandreu não gostou? Ou será que existe algo dentro do seu país que ele quer clarificar? Seja como for, o anúncio foi surpreendente, e até ao que se diz, o seu ministro das finanças não sabia de nada. Por agora, o que se sabe, é que a UE suspendeu a tranche que devia ser enviada até que os gregos se pronunciem. Mas depois duma conversa com o "par romântico" - Sarkozy e Merkel - em Cannes, antecedendo a cimeira do G 20, tudo mudou, e agora parece que nem referendo vai haver!!! A "trapalhada" virou instituição na UE como nos estados membros de que Portugal é um bom exemplo. Isto diz bem do desnorte, da falta de rumo, que é patente em toda a UE. É caso para dizer que "casa onde não à pão, todos ralham e ninguém tem razão".

Thursday, November 03, 2011

Conversas comigo mesmo - XXXVIII

Por vezes, como diz o acertado aforismo, a árvore impede-nos de ver a floresta, ou seja, quando se dá importância demasiada a coisas pequenas, perde-se de vista o essencial. Foi o que aconteceu aos escribas e fariseus, em relação à Lei de Moisés. Por isso tinha sentido a pergunta que fizeram a Jesus: "Qual o maior mandamento da Lei?" A originalidade da resposta de Jesus não está, evidentemente, no anunciar os dois mandamentos tão conhecidos: "Amarás o Senhor teu Deus com todo o teu coração, amarás o teu próximo como a ti mesmo". A originalidade está em equipará-los um ao outro e pô-los no centro de tudo. O resto da Lei e dos Profetas é a manifestação e consequência desta orientação fundamental da vida. Jesus não confunde o amor de Deus com o amor aos homens. Para Ele, o primeiro e principal continua a ser amar a Deus, buscar a sua vontade, escutar a sua chamada. Contudo, não se pode amar verdadeiramente a Deus nosso Pai, sem amarmos, de facto, os seus filhos, nossos irmãos. Esta verdade é, diariamente, esquecida por todos nós. Quantos de nós olham para o seu semelhante, por vezes, ao nosso lado, em sofrimento, e nós ignorá-mo-lo? Quantos de nós face ao sofrimento dum pobre animal indefeso, o ignora, muitas vezes, o maltrata ainda mais, e ele também é criatura de Deus, como nos diz S. Francisco de Assis? Quantos de nós respeitam a natureza, também ela a manifestação de Deus? Quantos de nós respeitam o planeta e tudo o que nele vive, nossa casa comum, também ele revelação de Deus? E contudo, até nos dizemos cristãos e, como tal, somos lestos em apontar o dedo a terceiros quando achamos que não procedem com a sua Lei! Vemos rapidamente o cisco no olho alheio, mas temos dificuldade em ver a trave no nosso. Por isso, estes dois mandamentos são sempre inseparáveis, e constituem a prioridade fundamental da nossa vida cristã, a prioridade das prioridades, sempre urgente e insubstituível. Mas para além de ser um mandamento, deveria ser um código de conduta para todos nós face ao outro e ao mundo, porque afinal, até nos dizemos cristãos... O essencial é colocar um ponto final em todas as vírgulas que nos incomodam. Numa sociedade baseado na casta - mesmo que a reneguemos -, onde os títulos, o nome de família, a riqueza material, são os deuses em que adoramos quotidianamente, reflectimos sobre todos os que estão revestidos de autoridade ou exercem cargos nas comunidades cristãs encontram um oportuno convite a fazerem um exame às suas atitudes e às intenções que os animam no exercício das funções que desempenham. Mas uma vez recorro à Bíblia: "Aquele que for o maior entre vós será o vosso servo". Mas não apenas esses que citamos atrás têm o dever de reflexão, pois o divórcio entre a Fé e a vida, o desfasamento entre o que dizemos e praticamos; o buscar em tudo a afirmação de si mesmo e o prestígio pessoal; o ser muito exigente com os outros e muito condescendente consigo próprio; o servir-se dos outros ou dos cargos que se ocupam para a satisfação dos próprios interesses ou ambições. Tudo isto não é o monopólio de nenhum grupo ou classe são antes, tentações e armadilhas em que todos podemos cair, e caímos... Alguns dirão: "Bem prega Frei Tomás: Olhai para o que ele diz mas não para o que ele faz". Mas para o cristão, Jesus Cristo é o único Mestre. É d'Ele que temos de aprender sempre o que é viver fraternalmente, o que é a autoridade e como exercê-la, o que é a coerência entre a mensagem que se apregoa e a vida que se leva, entre os valores que se defendem e os actos que se praticam. Se nos consideramos seus discípulos não podemos seguir a outro mestre, embora, quase nunca seja assim. Quantas pessoas que conhecemos, que frequentam a Igreja - e criticam os que não vão lá! - o fazem por maniqueísmo, mais do que por devoção? Quantas pessoas utilizam o ritual para apaziguar - temporariamente - a sua consciência? Quantos o fazem para colher dividendos sociais? Quantos se dizem humildes no templo e tiranos no dia-a-dia? Quantos aceitam a humildade como forma de vida? Quantos renegam os títulos, as honrarias, para se aproximarem do seu semelhante, do seu irmão? E apesar disto, temos sempre a tendência de afirmarmos que somos cristãos...

Wednesday, November 02, 2011

Breves notas sobre o Dia de Todos os Santos e algumas confusões associadas

Celebrado há mais de mil anos no mundo católico, o Dia de Todos os Santos é uma das datas mais tradicionais e significativas do calendário religioso. Realizado todos os anos a 1 de Novembro, como testamento ao significado espiritual das divindades católicas, a data é tradicionalmente feriado em Portugal e dia de contacto com o "mundo do além". Porém, o feriado que ontem ocorreu pode acontecer pela última vez precisamente este ano. No âmbito das opções estratégicas do Governo de Pedro Passo Coelho, que pretende eliminar alguns feriados de modo a aumentar a produtividade nacional, a Igreja Católica terá concordado que o feriado do Dia de Todos os Santos seja um dos sacrificados pela nova política. O Dia de Todos os Santos tem sempre associado o Dia dos Finados e às festividades anglo-saxónicas do Halloween, cuja popularidade tem vindo a espalhar-se um pouco por todo o mundo. A celebração do Dia de Todos os Santos no dia 1 de Novembro tem a sua origem numa declaração feita pela Papa Gregório III (731-741), na Basílica de São Pedro, quando exaltou e exortou os católicos a rezarem pelas relíquias e almas dos santos no além. "Para os apóstolos, para todos os santos, mártires e confessores e para todos os justos iluminados espalhados pelo mundo". A criação pela Igreja Católica de um dia anual para lembrar todos os santos tem uma razão prática. Nos primórdios da fé católica enquanto instituição precoce, os crentes deviam celebrar um santo por dia. Porém, com a "explosão" no número de santos, sobretudo após o período de perseguição no tempo dos romanos, houve necessidade de criar uma data que servisse para rezar por todos os santos. Desde então que a data se tornou uma das principais celebrações do calendário católico e assim se manteve até aos dias de hoje. Em Portugal, país onde a Igreja Católica tem historicamente uma enorme influência, o Dia de Todos os Santos converteu-se num feriado de grande importância espiritual. Está também associado a uma das datas mais trágicas da história nacional, o terramoto de 1755, que aconteceu precisamente no dia 1 de Novembro, quando milhares de lisboetas se encontravam nas numerosas igrejas espalhadas pela cidade. Como consequência do terramoto surgiu, igualmente, uma das tradições nacionais, nomeadamente lisboeta, associada com o Dia de Todos-os-Santos que nos últimos anos praticamente desapareceu: o pão-por-Deus. Exactamente um ano após a catástrofe do terramoto, as crianças que ficaram numa situação de enorme precariedade saíram à rua, pedindo pelas portas de Lisboa e das localidades à volta "pão-por-Deus", restos de broa e comida para mitigar a fome. A tradição manteve-se, ganhou contornos festivos, mas desapareceu a partir dos anos 80, sobretudo com o aparecimento de outras festividades, como o importado "Halloween". Associados ao Dia de Todos os Santos encontram-se duas datas amplamente celebradas e que muitas pessoas confundem com o dia principal: o "Halloween" e o Dia dos Finados. Uma celebração predominantemente anglo-saxónica, o "Halloween" celebra-se na noite de 31 de Outubro e tem alegada origem no festival gaélico "Samhain", relacionado com o fim das colheitas e agradecimentos aos entes espirituais, com o nome a advir da expressão escocesa "All-Hallows-Even" (que significa, antes da noite dos santos). As máscaras e as abóboras são dois dos maiores símbolos do Halloween. As festividades foram levadas para os Estados Unidos por imigrantes, onde a evolução acabou por trazer algumas das tradições mais ligadas à "Noite dos Mortos", como as abóboras iluminadas, as máscaras alegóricas, ou a prática de ir de porta em porta pedir doces. As festas ganharam fama e espalharam-se pelo mundo, muito devido ao seu apelo místico e pagão, como contrabalanço da solenidade do Dia de Todos os Santos e o Dia dos Finados. O Dia dos Finados celebra-se a 2 de Novembro e alguns especialistas alegam que as origens, tendo em conta as devidas distâncias, são semelhantes às do "Halloween", tendo em conta os evidentes pontos de contacto, na lembrança dos "espíritos do além". A data surgiu como forma de relembrar todos aqueles que, apesar de não terem atingido a "iluminação no além", a sua alma continua a ser acarinhada por todos os crentes católicos em comunhão. Tradicionalmente, visita-se as campas dos entes queridos para se deixar velas e assistir a celebrações litúrgicas. Há alguma confusão com o dia 1 de Novembro, uma vez que no feriado a maioria das pessoas aproveita para ir ao cemitério. Uma prática que pode ter acontecido, pela última vez, este ano.

Tuesday, November 01, 2011

Elegia aos "meus ausentes"

"Negro é o pano que cobre que cobre o meu coração, como negros são os sentimentos que me vestem na morte dos dias. Negras as forças que me movem contra a vida, contra o Amor e a felicidade, contra prazeres e euforias. Negra é a tinta com que escrevo estas palavras e a névoa que do olhar dos vivos me vem encobrir; no meu mundo de bréu transporto o negro fado de toda a luz desejar e nenhuma luz atrair. Negro é o meu manto, assim como o meu trono. Sou rei de uma dor negra, oferenda mortal que não posso rejeitar; negra é a passadeira que se estende até ela e o sonho em que todas as noites me venho aconchegar. Negra é a espada em que desfilam os meus pensamentos. Espada que dá vida às palavras que não me atrevo a pronunciar. Apenas a morte as pode ouvir, quando me acaricia o rosto na negra tempestade, porto em que minha alma vim abrigar. Vou queimar as mãos, para que esta espada atormentada não volte a marcar o papel". Com estas palavras um amigo descreveu os seus sentimentos. Nunca pensei vir a utilizá-lo neste espaço, mas estou a fazê-lo pela eloquência das palavras e dos sentimentos que são também os meus. Neste dia dos ausentes que hoje comemoro - mais um - vêem-me à memória muitas recordações de tempos idos, de outros tempos e outros espaços, onde a felicidade reinava. Hoje sinto-me só, profundamente só, quando reabro a minha "caixa de Pandora" e dela saem todas as recordações, todos os fantasmas que vêm assolando o meu imaginário de à uns anos para cá. Nesta solidão acompanhada - provavelmente a pior das solidões - fundo-me com as sombras, com a negritude do meu coração sofrido e sofredor. "Ouve o que o coração te diz, sente o que ele sentir, pergunta o que ele perguntar, e pede, mas pede, só o que fizer o teu coração sorrir...", diz um outro amigo, mas convenhamos que não é fácil. Quando a felicidade já não passa duma quimera, por longínqua, quando a confusão dos sentimentos para além de ajudar, apenas servem para confundir e baralhar, sinto-me só, infeliz, numa solidão com que o destino me premiou. Troféu azedo, troféu negro, dum negro profundo como sinto o meu coração, onde as memórias vão preenchendo os espaços vazios, onde os ausentes fazem a sua aparição, marcam a sua presença. "A rua está deserta, alguém gritou o teu nome, na minha cabeça ressoou como um trovão. Fui para a rua, e...", e apenas o vazio - tal como a rua deserta - apenas recordações, memórias de tempos idos, apenas fantasmas... Hoje mais do que nunca, os ausentes marcam posição, ocupam espaços, fazem parecer normal a anormalidade em que vivo. "Mesmo que tivesse nas minhas mãos todo o perfume das rosas, toda a beleza do céu, toda a pureza dos anjos, toda a inocência das crianças, toda a grandeza do mar, toda a força das ondas, mesmo que eu tivesse todas as coisas belas da vida e todos os belos lugares do mundo nada teria sentido se eu não tivesse o presente mais valioso que o Ser Humano pode ter...a Amizade!!! Eu só tenho a agradecer por TODOS VOCÊS EXISTIREM NA MINHA VIDA...! PESSOAS LINDAS....", mais uma amiga a dar o seu contributo, porque hoje decidi fazer este espaço de amigos - amigos mais próximos ou mais afastados - mas AMIGOS à mesma. Por momentos, senti-me menos só, enquanto alinho letras umas atrás das outras, procurando que no fim façam algum sentido, tendo a leve sensação de companhia, de pureza, de conforto, de presença. Mas, quando acabar de dispor estas letras no papel, a solidão regressará de novo - talvez até duma forma mais sofrida, mais dolorosa - porque, por breves instantes, estive aqui convosco, presentes e ausentes, numa comunhão de espírito que muito me ajudou, para logo ficar de novo só, porque as palavras acabaram, e os espaços começaram a ficar vazios de novo, os espectros chegaram outra vez, enfim, ... os meus ausentes vieram confortar-me, talvez, por me verem tão sofrido, tão ferido, tão só. Vinde, trazei o calor das memórias da minha meninice, trazei a alegria da minha juventude, trazei a determinação doutros tempos, talvez assim, me sinta menos só, menos perdido neste mar de tristeza, sempre renovada, neste dia... o dia dos meus ausentes!