Tuesday, May 31, 2016
O Grito do Profeta - Em Passagem...
Conta-se que no século passado, um turista americano foi à cidade do Cairo, no Egito, com a finalidade de visitar um famoso sábio. O turista surpreendeu-se ao ver que o sábio vivia num quartinho muito simples e cheio de livros. As únicas peças de mobiliário eram uma cama, uma mesa e um banco. "Onde estão os sue móveis?" - perguntou o turista. E o sábio, rapidamente, também perguntou: "E onde estão os seus?..." "Os meus?" surpreendeu-se o turista. "Mas estou aqui somente de passagem!" "Eu também..." concluiu o sábio. A vida na terra é somente temporária... Sem dúvida alguns vivem como se fossem ficar aqui eternamente e esquecem-se de ser felizes. O valor das coisas não está no tempo que duram e sim na intensidade com que se vive. Por isso existem momentos inesquecíveis, coisas inexplicáveis e pessoas incomparáveis.
Monday, May 30, 2016
Intimidades reflexivas - 663
Reflexão... Certa vez, um homem tanto falou que seu vizinho era ladrão, que o vizinho acabou sendo preso. Algum tempo depois, descobriram que o rapaz era inocente, ele foi solto, e, após muita humilhação resolveu processar seu vizinho (o caluniador). No tribunal, o caluniador disse ao juiz: "- Comentários não causam tanto mal..." e o juiz respondeu: "Escreva os comentários que você fez sobre ele num papel, depois pique o papel e jogue os pedaços pelo caminho de casa e amanhã volte para ouvir a sentença!" O homem obedeceu e voltou no dia seguinte, quando o juiz disse: "- Antes da sentença, terá que catar os pedaços de papel que espalhou ontem!" "- Não posso fazer isso, meritíssimo! - respondeu o homem - "o vento deve tê-los espalhados por tudo quanto é lugar e já não sei onde estão!" Ao que o juiz respondeu: "- Da mesma maneira, um simples comentário que pode destruir a honra de um homem, espalha-se a ponto de não podermos consertar o mal causado; se não se pode falar bem de uma pessoa, é melhor que não se diga nada!" Sejamos senhores de nossa língua, para não sermos escravos de nossas palavras. No mundo sempre existirão pessoas que vão te amar pelo que você é, e outras que vão te odiar pelo mesmo motivo. Acostume-se... Quem ama não vê defeitos... quem odeia não vê qualidades e, quem é amigo, vê as duas coisas !!!
"Ajude o seu filho a crescer" - Túlia Victorino
Decidi hoje publicar um texto que não é da minha autoria, mas sim da Dra. Túlia Victorino. A D. Túlia (como era conhecida junto da pequena), para muitos este nome poderá não dizer nada. Contudo, esta senhora foi uma grande pedagoga com quem tive o privilégio de conviver, muito de perto, há muitos anos atrás. Apesar de vivermos relativamente perto um do outro, não sabia que já nos tinha deixado. É certo que apenas há poucos dias. Lamento ter tido conhecimento de tão nefasto facto, e assim, decide publicar aqui um dos seus inúmeros textos, a título de homenagem. Textos todos virados para a pedagogia dos mais novos, - dos jovens, mas que devem ser obrigatoriamente lidos pelos mais velhos, - os pais. Este texto tem por título "Ajude o seu filho a crescer" e é uma espécie de manual de educação e boas maneiras que devem começar a ser implementados desde muito cedo nas crianças. Este texto já tem alguns anos, mas é pleno de atualidade nestes dias que são os nossos. O texto é um pouco longo mas deve merecer a vossa melhor atenção. Ele aqui fica, com a vénia à memória duma grande senhora. O texto diz assim:
"Se o seu filho o arrelia muitas vezes, não tenha escrúpulos em elogiá-lo quando ele fizer algo acertado; se o seu filho mantém uma fala incorreta, mimada e de vocabulário pobre, não se iniba de o emendar e reforçar a palavra correta; se o seu filho é desajeitado, algo azarento, enalteça o que lhe aparece de bom, sublinhe os seus êxitos; se o seu filho dá muitos erros na escrita, não o desanime, não sublinhe o erro, mas antes elogie as frases certas e corrija as erradas garantindo que, da próxima vez, ele as acertará; se o seu filho é demasiado irrequieto à mesa, procure pô-lo atento a uma história interessante que o motive; se o seu filho parece não se interessar por nada válido, visite com ele um bairro de lata, um colégio de orfãos, um lugar com trabalho infantil (remunerado). Desde bastante novo, mesmo apenas com 2 anos de idade, a criança já pode arrumar o seu pijama, os sapatos, os brinquedos. Hábitos de trabalho, organização do tempo, responsabilização, cooperação nas tarefas familiares devem ser induzidas desde muito cedo, levando a criança a compreender que faz parte duma Família onde há direitos, deveres e muito amor e que a felicidade de todos passa pela contribuição de cada um. A criança compreende perfeitamente a diferença entre alegria e tristeza, entre amor e desamor apercebe-se, facilmente, do excesso de indulgências e super-proteção e tende a aproveitar-se disso. Então os pais devem posicionar-se de modo a merecer respeito e amor, ensinando os filhos, de acordo com a sua capacidade de compreensão, as coisas válidas e belas da vida, ensinando-as a pensar, explicando-lhes as razões das ordens dadas e motivando-as a cumpri-las. As crianças mesmo dentro duma mesma família têm personalidades e potencialidades muito diferentes, que têm de ser entendidas e motivadas diferentemente. Uma ordem vaga deixa a criança desorientada (arruma a sala!), mas uma tarefa de cada vez ajudará o menino a cumpri-la mais facilmente e a habituar-se a organizar o serviço (arranja as almofadas, guarda os chinelos, arruma os brinquedos, leva o copo à cozinha). Seja um exemplo para os seus filhos: organize as férias, as semanas, o dia, os tempos livres; distribua as tarefas pelos familiares e estabeleça regras; faça uma lista de tarefas a executar, mas não esqueça que os deveres da escola são importantíssimos e que a criança deve ter um espaço sossegado para estudar. O dia tem horas suficientes para comer, brincar, trabalhar, estudar, dormir. Não esqueça que a criança não tem capacidade de abstração e previsão e não exija nada superior às suas possibilidades físicas, intelectuais ou psíquicas. Faça no fim de semana uma avaliação das tarefas, executadas e averigue, justamente, as razões de algum não-cumprimento. As tarefas domésticas não têm sexo e os meninos ou as meninas podem fazer o mesmo tipo de tarefas, apenas atendendo à sua idade e capacidade de entendimento. Estes momentos familiares dão à criança o sentido de família, cooperação, responsabilização, utilidade e até afeto. Ajude o seu filho a aprender; visite o professor; elogie o arranjo dos cadernos, os testes positivos, o comportamento bonito que o professor lhe comunicou. Aceite os seus pontos fracos e incentive os fortes. Converse muito com o seu filho sobre livros, filmes, ecologia, poluição, solidariedade, animais. Visite, com ele, museus, bibliotecas, jardins zoológicos, botânicos, lugares históricos, serras e rios. Mas, explique-lhe sempre o que observa e ensina-o a observar a beleza e a razão das coisas. Ajude o seu filho a crescer."
Sunday, May 29, 2016
Como de costume!...
Come de costume, sim senhor! Quando cheguei ao local onde alimento o cachorro o aspecto era este. (Ver foto). Tudo limpo. Não sei se ontem, alguém lá foi deitar alguma comida seca. Se sim, nenhuma restava e não foi o cão ou os gatos que a comeram. Tudo permanece igual a si mesmo, numa interminável saga. Hoje contei com a visita de um dos gatos que logo correu para mim para comer. Ainda lá fiquei algum tempo para que ele comesse. Saciou-se à vontade. Quando de lá saí ainda ele continuava com o repasto. Pelo menos ele terá o estômago mais confortado para o dia de hoje. O outro gato e o cão não apareceram. Espero que ainda cheguem a tempo de comer alguma coisa.
Saturday, May 28, 2016
Outra vez!...
Nada de novo. Apenas a costumeira atitude de sempre. A comida roubada na totalidade. Se alguém ontem foi lá colocar alguma comida seca, como pedi, pois ela também desapareceu na totalidade. Os recipientes estão bem limpos como a foto documenta. Mais do mesmo. Hoje tinha comida seca comigo. Não a deixei lá. Para quê? Para desaparecer de imediato? Até quando isto continuará? Confesso que me sinto cansado de tudo isto. Não vi nem o cão, nem os gatos. Eles já devem ter percebido que nada encontram lá para comer. Sei que o cão aparece na hora de almoço durante a semana, porque sabe que alguns funcionários que trabalham no local, lhe trazem de comer. Durante fins de semana, pontes, feriados, férias, é o jejum total. É assim mesmo, e nada parece poder alterar estas coisas. Apenas a comida dos gatos resiste porque está escondida junto dum abrigo que o meu amigo Bruno lá colocou para eles se abrigarem. E ainda resta porque não está tão acessível como a outra.
Friday, May 27, 2016
Uma história que se repete...
De facto, esta é uma história que se repete e sem fim à vista. Quando lá cheguei há um par de horas atrás, o aspecto era o da foto. Tudo vazio. Nem sinais de comida seca ou húmida. Já agora, apelo à pessoa que vai roubar a comida para que aproveite a oportunidade para lavar os recipientes, e não deixe essa tarefa sempre para mim. Se a comida é para ele, sempre é mais higiénico; se é para os seus cães, estes também merecem um pouco mais de dignidade. Não vi o cachorro, nem os gatos. Neste período em que as empresas estão fechadas, eles nada têm para comer. Ou chegam tarde e a comida já foi retirada, ou simplesmente não aparecem porque sabem que nada lá existe. É triste mas é assim. Já agora, apelo a quem puder ir ao local deitar alguma comida seca, o favor de o fazer. Mais uma vez, já não tinha nenhuma comigo. É que no trajeto ainda apoio outros filhos do infortúnio. Antecipadamente agradeço.
Thursday, May 26, 2016
Nada restava!...
Como já vem sendo habitual, quando cheguei ao local onde alimento o cachorro, dei com tudo vazio. Quer a comida seca, quer a húmida. Completamente limpo e aspirado. Apenas a comida dos gatos restava porque o meu amigo Bruno a tem escondida. Tudo o resto tinha desaparecido. (Ver foto). Começa a ser insustentável esta situação. Apenas o amor que tenho por aquele cachorro me faz continuar, embora pense que ele não usufruiu da comida que lhe deixo. Quando viro as costas ela deve ser logo retirada. Afinal quem a tira, ao que se supõe, controla as nossas entradas e saídas do local porque temos que passar à sua porta. É a única casa nesse local, mas é um ponto estratégico apreciável. Não vi o cachorro, nem os gatos. Deixei lá a comida, embora fique com a sensação de que não estando lá quando chego, eles nem a verão. Seja como for, esta é a situação que temos e contra a qual não podemos fazer nada.
Wednesday, May 25, 2016
"Explicar o Mundo" - Steven Weinberg
Trago aqui um livro que achei fascinante. Trata-de de "Explicar o Mundo - A História da Ciência, da Antiguidade à Era Moderna" da autoria dum laureado com o Prémio Nobel da Física, Steven Weinberg. Nesta história abundante, irreverente e irresistível, Weinberg leva-nos da antiga Mileto à medieval Bagdad e a Oxford, da Academia de Platão e do Museu de Alexandria à escola da catedral de Chartres e à Royal Society de Londres. O autor mostra-nos que os cientistas dos tempos antigos e medievais não só não entendiam aquilo que agora sabemos sobre o mundo, como não entendiam o que há a entender, nem como o aprender. Todavia, com o decorrer dos séculos, graças ao esforço para desvendar mistérios como o do curioso movimento retrógrado aparente dos planetas ou o da subida e descida das marés, a ciência acabou por emergir como uma disciplina moderna. Ao longo deste trajeto, Weinberg examina confrontos e colaborações clássicas entre a ciência e as esferas concorrentes da Religião, da Tecnologia, da Poesia, da Matemática e da Filosofia. Algumas das ideias aqui produzidas estão documentadas duma forma ágil em anexo, com uma linguagem matemática e também da geometria acessíveis a alunos do ensino secundário, daí o seu interesse também para essa franja de potenciais leitores. Sobre o autor, Steven Weinberg é um premiado físico, que para além do Prémio Nobel, detém outras condecorações de prestígio como a National Medal of Science, Lewis Thomas Prize for the Scientist as Poet, bem como, de numerosos graus honoríficos. É autor de algumas obras fundamentais como 'The First Three Minutes', 'Dreams of a Final Theory', 'Facing Up' e 'Lake Views'. Atualmente detém a Josey Regental Chair in Science na Universidade do Texas, em Austin. Este livro pode-se resumir no feliz comentário no jornal The Guardian: "Em 'Explicar o Mundo' Weinberg recorda-nos que devemos ser humildes não só a respeito daquilo que sabemos, mas de como o sabemos. É uma subtileza, mas importante." Um livro recomendável para todos os que se interessam pela ciência, mas também para jovens estudantes, que aqui podem encontrar resposta a muitas das áreas que, por vezes, se afiguram mais herméticas. A edição é da Marcador.
Tuesday, May 24, 2016
Mais uma efeméride
Hoje completaria o seu 82º aniversário se ainda estivesse entre nós. A minha Mãe já partiu há um par de anos, o que dela restam são as memórias. Memórias minhas, - seu filho -, enquanto menino, das brincadeiras que fazia comigo, mais tarde, no incentivo para as primeiras letras, os primeiros números. O saber de Mãe que acompanha o crescimento de seu filho. Modesta na vida, de trato fino e jovial - pelo menos até determinada altura da sua existência -, sempre com um sorriso pendurado na boca. (Muitos ainda a recordam assim e disso me vão transmitindo os seus ecos). Completaria hoje 82 anos, mas não o chegou a celebrar. Apenas esta memória aqui fica. Porque onde a memória perdura a morte não tem a sua vitória definitiva. Mais uma efeméride na longa lista que já possuo, nesta minha galeria de ausentes muito extensa. Feliz aniversário, minha Mãe, Maria Odette. Lá onde estiveres que estejas em paz!
Monday, May 23, 2016
Sunday, May 22, 2016
Tudo vazio de novo!...
Quando já estava próximo do local, vi o cão que logo se pôs a correr atrás do carro e a ladrar. Parei e mesmo na berma da estrada lhe dei de comer. Duas caixas de paté que ele devorou num ápice. Depois continuei em direção ao local onde lhe deito o resto da comida que não posso deixar na estrada. Vi que ele me seguia e quando lá cheguei e estava a deitar de comer que um dos gatos começou a devorar avidamente, logo ele chegou. Afastou o gato e comeu desenfreadamente. Estava visivelmente com fome. Depois de saciado foi-se embora e o gato, - que se mantinha a respeitável distância a observar -, lá veio comer. Também desenfreadamente, porque a fome apertava, certamente. Ainda lá fiquei algum tempo para ver se o gato comia. Acabei por me vir embora e ele lá continuou a comer. Devia estar esfomeado. Porque ontem, apesar de ter deixado tudo abastecido, nada existia, nem comida seca, nem húmida. Tudo limpo. (Ver foto). (Se alguém puder ir lá deixar alguma comida seca, agradecia, porque, mais uma vez não tinha nenhuma comigo). A roubalheira continua, embora hoje, o cão e pelo menos um dos gatos encheram o estômago. Estou feliz apresar de indignado com aquilo que lá continua a acontecer.
Saturday, May 21, 2016
Será?...
Será que roubaram a comida ou não? A dúvida permanece. Quando lá cheguei este era o aspeto do local. (Ver foto). Quando de lá saí tudo ficou arrumado, limpo e abastecido. A comida seca era pouca mas ainda havia. A húmida nenhuma. Nem os gatos, nem o cão apareceu. Apesar de ainda da lá ter ficado um bom bocado. Esperemos que venham ainda a tempo de comer aquilo que lhes levo com muito amor e carinho antes que alguém a retire do local.
Friday, May 20, 2016
Thursday, May 19, 2016
Wednesday, May 18, 2016
As pequenas grandes coisas da vida
Um destes dias irrompeste nossa casa adentro. Em correria desenfreada como muitas vezes acontece. Logo na entrada me perguntaste pela 'mamie' (a tua madrinha). Trazias na mão um papel muito dobradinho e que não quiseste partilhar comigo. Era para a 'mamie' e pronto! Subiste a escadaria e logo correste para ela que te esperava no cimo. Alegre e prazenteira quiseste ir até à mesa mais próxima para mostrar o que trazias. E trazias um belo desenho, onde colocaste o teu nome à nossa frente. Ofereceste-lo à 'mamie' com todo o carinho e amor, de sorriso rasgado como costumas ostentar. A 'mamie' comoveu-se, mirou-o e remirou-o. Olhou para ele como se fosse um valioso tesouro. E era. Tudo o que lhe dás, ela guarda com o maior carinho. Um dia te há-de mostrar essas coisas simples e pequenas, - as pequenas grandes coisas da vida - mas valiosas para ela e para mim. Porque foram feitas por ti. Tiveram o teu cunho simples de criança. Mas feitas, certamente, com muito amor. Um amor igual àquele que sentimos por ti. Coisas valiosas essas, sim. Como valiosa és tu para nós. Coisa pequena, mas para nós enorme. Um símbolo de amor, daquele amor que sentes por nós e que nós nos esforçamos por retribuir. Talvez desajeitadamente. Afinal já somos velhos, - demasiado velhos face à tua idade -, mas ainda com um enorme amor para dar. O amor à filha que não tivemos. O amor à neta que não temos. Mas temos-te a ti. E basta! Preenches os nossos espaços, os físicos e do coração, mas também os outros, os das emoções, dos sentimentos. Este ano desenvolves-te uma relação especial com a 'mamie' - a tua 'mamie' como por vezes dizes - nesse teu vocabulário ainda simples mas aconchegante. Essa relação tem abrilhantado os dias, - os teus dias -, mas também, os dias da 'mamie'. E eu, lá ando por perto, qual inseto esvoaçando daqui para ali, para te fotografar, para te filmar, para no fundo, te eternizar para o futuro. Essa memória futura ficará registada. Ela será o ilustrar da curiosidade que um dia terás olhando para aqueles dias de quando foste uma bebé, e mais tarde, uma menina a caminho dos cinco anos. Ficará também um testemunho daquilo que sentias por nós nesses tempos e daquilo que nós sentíamos por ti. Talvez nessa altura já cá não estejamos para o ver e sentir. Mas isso não é o mais importante. Porque esse amor vai para além da barreira material e física. Esse amor prolongar-se-à no tempo, mesmo quando esse tempo já se tiver escoado para nós. Mas ele permanecerá sem barreiras porque é sincero e sai do fundo do coração. Talvez um dia percebas isto. Para além de tudo aquilo que se cruzará na tua vida, este amor ocupará sempre lá um espaço. Aquele espaço enorme, avassalador, aquele sentimento de termos vivido e conhecido a plenitude da felicidade. Esse é o amor puro e sincero. Aquele que será perene e que, estamos certos, que nunca renegarás. Esse é o amor para lá do imediato. Esse é o amor que atravessa o tempo. Esse amor é, e será sempre, incondicional. Esse amor, és tu!
Tuesday, May 17, 2016
Monday, May 16, 2016
Sunday, May 15, 2016
Intimidades reflexivas - 650
"Newton não foi o primeiro da era da razão. Foi o último dos magos, o último dos babilónios e dos sumérios, a última grande mente que viu o mundo visível e intelectual com os mesmo olhos daqueles que começaram a construir o nosso legado intelectual há menos de 10.000 anos." - John Maynard Keynes (1883-1946) num discurso na Royal Society em 1946, sobre o tema 'Newton, the Man' e que foi lido pelo seu irmão, visto Keynes ter morrido três meses antes.
Comida roubada, mas estou feliz!...
Apesar da comida ter sido de novo roubada, estou feliz! E isto porque, quando ia a entrar no local onde alimento o cachorro, apareceu-me o cão que já não via há algum tempo. Veio logo ter comigo para comer. Depois lá seguiu a sua triste vida errante. Quando mais à frente cheguei ao local onde coloco a comida, esta tinha sido toda roubada, inclusive a comida seca que o meu amigo Bruno Alves Ferreira lá coloca e que já não tinha para substituir. (Ver foto). Enquanto arranjava a comida, logo um dos gatos por lá apareceu. Devia estar com muita fome pela maneira como comia, quase não deixando que lá coloca-se mais. Ainda lá fiquei mais algum tempo para dar tempo a que ele comesse. Acabei por vir embora e ainda ele lá ficou, aparentemente insaciável. Pelo menos ele e o cachorro, hoje tiveram uma refeição. Só por isso estou muito feliz.
Saturday, May 14, 2016
Não sei!...
Tenho dificuldade em perceber o que hoje encontrei. Talvez a comida tenha sido roubada de novo pela disposição dos recipientes e pela forma tão limpa como os encontrei, coisa bem pouco habitual. Mas não posso afirmar. (Ver foto). Ontem não fui lá, daí não ter termo de comparação. Apenas um dos gatos por lá apareceu. Primeiro, distante. Depois, lá se foi aproximando. Completamente encharcado lá tentou comer. Acabou por desistir, ou porque a minha presença o incomodava, ou porque não gostou da comida. Seja como for, lá ficou ainda comida, espero que não seja retirada de novo. Do cão nem sinais. Já não o vejo há algum tempo.
Friday, May 13, 2016
Thursday, May 12, 2016
Sobre a infidelidade e outras estórias
Poderá parecer estranho o tema que vos proponho hoje, mas não será tanto assim. Resolvi escrever sobre ele, por uma situação que me chegou às mãos duma pessoa muito amiga, que está a passar por momentos menos bons. Só que por vezes, essas situações são potenciadas por nós próprios sem que disso nos apercebamos. Mas tornemos isto mais claro, sem falar em nomes, obviamente. Nós todos conhecemos casos de mulheres que tentam controlar os maridos, namorados ou amantes, tentando vasculhar o que eles procuram na internet, as mensagens que mandam e a quem as mandam nos telemóveis. (Cumpre informar que o mesmo se passa com os homens, não pensem que são só as mulheres que o fazem). Mas o fruto proibido é sempre o mais apetecível - é dos livros - e, normalmente, estas pessoas que se sentem controladas têm a tendência de ir mais além, quanto mais não seja para se sentirem donos do seu próprio destino. E de degrau em degrau, de desconfiança em desconfiança, de 'voyeurismo' em 'voyeurismo', as relações vão-se degradando, ou se tal não acontece, é para salvar as aparências, porque o peso social ainda é muito, mesmo para esta nova geração que tem uma mentalidade bem diferente da minha. Quando tal acontece, - e por incrível que pareça -, as relações vão-se degradando ao ponto do insustentável. E, caso curioso, normalmente quem controla, é mais infiel do que quem é controlado, talvez por isso, e sabendo o que faz por trás das cortinas, tenta evitar que o mesmo lhe aconteça. (No fundo é a sua própria insegurança que dita o seu comportamento). A desconfiança num casamento - de facto ou não - é o pior que pode acontecer. Um casamento não pode ser uma prisão para um cônjuge, (ou para ambos), porque então essa relação não é saudável e está condenada ao fracasso. E muitas vezes, essa paz podre mantém-se, ou por incómodo social como atrás já afirmei, ou porque a situação de um dos cônjuges, ou de ambos, seria insustentável se ficassem sozinhos. Assim, em nome da conveniência, assobia-se para o lado, e faz-se de conta que nada se passa. Esta situação é até tola porque, mais do que a internet, não é possível controlar uma pessoa vinte e quatro horas por dia, e podem crer que há mais 'perigos' no dia a dia do que na internet. Contudo, estes casos são mais comuns do que aquilo que julgam. E como disse atrás, são transversais a homens e mulheres, e será difícil saber qual dos géneros é mais assintoso na matéria. Se a relação de muitos jovens já é muito complexa, mesmo no namoro, dificilmente se endireitará em relação mais séria. A maneira fácil como se troca de parceiro, onde o interesse pessoal se sobrepõe até ao interesse superior das crianças - quando existem filhos no casal - que são sempre descartáveis na maioria dos caos, a forma, por vezes, irresponsável como se toma a relação apressada como definitiva para uma vida, vai um pouco em contra ciclo com aquilo que aqui disse. Mas mesmo nos tempos que correm estas situações são mais recorrentes do que se pensa. E é bom não esquecer que a tentativa de controlo do outro é meio caminho andado para a rutura. Porque como diz o povo, 'só fala quem tem que se lhe diga' e normalmente quem tenta controlar tem algo a esconder e não quer que lhe façam o mesmo. Não pretendo ser conselheiro de ninguém, mas à pessoa que me procurou, aqui fica o que penso. Nunca se esqueçam que um casamento tem que ser baseado na responsabilidade e confiança e que esta estratégia saloia de controlo, não passa disso mesmo, uma refinada parvoíce.
Wednesday, May 11, 2016
Nos caminhos da memória
Passam hoje seis anos sobre a data do falecimento do meu sogro António Martins. Seis anos é já algum tempo, embora pareça que foi agora. Depois de largo sofrimento nas três semanas que passou hospitalizado, ele partia. Sofrido, mas quero crer, que em paz. Seis anos já passaram, apenas a memória resta, como há-de acontecer com todos nós. E enquanto houver memória a pessoa não morre definitivamente. Descansa em paz, António Martins!
Intimidades reflexivas - 645
"O homem é um animal irracional, exactamente como os outros. A única diferença é que os outros são animais irracionais simples, e o homem é um animal irracional complexo. É esta a conclusão a que nos leva a psicologia científica, no seu actual estado de desenvolvimento. O subconsciente, inconsciente, é que dirige e impera, no homem como no animal. A consciência, a razão, o raciocínio são meros espelhos. O homem tem apenas um espelho mais polido que os animais que lhe são inferiores." - Fernando Pessoa (1888-1935)
Tuesday, May 10, 2016
Sobre o financiamento do ensino privado em Portugal
Temos vindo a assistir nos últimos dias a uma polémica que, embora aparentando ter algum sentido, dele carece em toda a sua amplitude. Trata-se da polémica sobre o financiamento do ensino privado que foi revogado pelo ministério da Educação, embora não em toda a sua extensão é bom que se diga em abono da verdade. Antes de avançar, quero aqui fazer a minha declaração de interesses. Primeiro, quero aqui afirmar que durante a minha juventude, fiz todo o meu ensino secundário num colégio privado. Colégio esse de que guardo as minhas maiores memórias. Segundo, que estou em profundo desacordo com aquilo que se passou com a governação anterior de Passos e Portas. Terceiro, não sou a favor da atuação da Fenprof e do seu líder Mário Nogueira que até, em algumas ocasiões, acho que tem prestado um mau serviço ao país. Depois disto, passemos ao assunto. O governo anterior aprovou uma lei em Julho de 2015, que beneficiava claramente o ensino privado em detrimento do público, criando condições para muitos professores verem afastada a possibilidade de continuar a exercer a sua profissão em Portugal. E estes, - tal como muitos outras pessoas neste país -, apenas recebeu de Passos e Portas, o apontar do dedo para que fossem tratar da vida noutras paragens, ou seja, buscar os caminhos da emigração, e já agora, 'que deixassem de ser piegas'!... Assim, quando vejo associações de pais, numa histeria coletiva inconsequente, queria aqui lembrar que os famosos postos de trabalho que se perdem, afinal já se perderam no ensino público e nunca se viu estas associações virem a terreiro defender os professores. Depois fica a lei aprovada em fins de legislatura, à pressa como tantas outras, para servir clientelas em busca de votos que afinal não foram suficientes. É que, como bem dizem as associações de pais, os cidadãos têm o direito de optar pelo caminho que acham melhor para a educação dos seus filhos, mas também é certo, que a fazê-lo, o devem assumir com os seus proventos e não com os meus impostos e doutros portugueses que vêm no ensino público um caminho de maior igualdade de oportunidades. Se não existirem escolas públicas nas proximidades, ainda poderei aceitar uma alternativa via ensino privado e até perceber a sua manutenção. Mas quando tal não é o caso, (e não o é em muitas situações), tal não pode, nem deve, acontecer. Se os pais acham que o ensino privado é a melhor solução para os seus filhos, ótimo, mas deverão ser eles a arcar com o financiamento e não todos os restantes portugueses. Como atrás disse, fiz toda a minha escolaridade secundária no ensino privado, numa altura em que as escolas públicas eram bem poucas e muito afastadas. Foi uma opção da minha família, que assumiram pagando muito por isso, mas não impondo a fatura a terceiros. Nessa altura, quem ia para o ensino privado, ajudava a financiar esse ensino, e as sociedades que estavam por trás dessas escolas, tinham que ter o seu fundo de maneio para tal. Nunca a custo de todos nós, coisa que na época não acontecia. O que estes pais estão a pedir é que, acham que os seus filhos devem frequentar o ensino que acham que tem mais qualidade, mas todos nós temos que pagar para isso. É como eu achasse que devia ter um Ferrari, mas que o seu financiamento deveria ser assumido pelos meus vizinhos. Isto é absurdo. Toca as raias dum certo mau gosto, e acho que o ministro atuou, e bem, sobre este caso. Quanto à afirmação de Passos sobre o ministério ser controlado por Mário Nogueira e a Fenprof, é mais uma afirmação gratuita de quem não se consegue ajustar à oposição e tudo faz para não deixar de ser assunto em Portugal. Aqui, e por diversas vezes, afirmei que a Fenprof e o seu líder Mário Nogueira, podem ter servido bem os professores, - embora isso careça de confirmação -, mas foi, em muitas alturas, um péssimo agente contra a qualidade do ensino em Portugal, optando por uma via facilitista que pretendia encobrir o défice cultural de muitos professores que por aí andam. Disse-o e mantenho. Mas não tomemos a nuvem por Juno. Independentemente de os agentes do ensino terem, também eles a sua estratégia, não me parece correto que se pense que o financiamento do ensino privado era a maneira de contrariar o óbvio. Não. Eu como muitos outros cidadãos, não queremos que os nossos impostos sejam utilizados dessa forma. Que, ao fim e ao cabo, a fatura seja duplicada. Não estamos em tempo disso, e tal é inaceitável. Se quiserem que os vossos filhos frequentem o ensino particular, pois muito bem, mas não venham de fatura na mão para que seja eu a pagar. Isso nunca. Quem quer ter determinados benefícios deve pagá-los, ou simplesmente, não ter atitudes ridículas como aquelas que temos visto nos últimos dias.
Monday, May 09, 2016
9 de Maio - O Dia da Europa
Há dias para tudo, e hoje é mais um. Celebra-se neste 9 de Maio o Dia da Europa. No atual contexto da Europa não sei se é um dia para grandes festejos, mas certamente será um dia para grandes reflexões. Longe vão os tempos da Europa solidária e amiga, a Europa sonhada e desenhada por Jean Monet. A Europa de Delors, de Brandt, de Miterrant, de Palme, de Andreotti, de Papandreou, de Gonzalez ou de Soares. Hoje a Europa foi abocanhada por um grupo de ultraliberais que fazem da Europa uma coutada. Sempre preocupados com os países mais pobres e pequenos, como o nosso, mas que olha para o lado quando se erguem muros onde estes não deveriam existir. Uma Europa que permite que cada vez mais a ideologia nazi se imponha, é ver o que se passa na Hungria, na Polónia, na Eslovénia e até em países mais próximos de nós, como é o caso da Áustria ou mesmo da França, com o partido da extrema direita francesa a ser o preferido dos franceses. Esta é a Europa dos muros, da xenofobia, do racismo, dos países ricos a imporem regras absurdas aos pobres, não percebendo que assim estão a por em causa a própria coesão da Europa e até, no limite, a democracia. Não há, de facto, muitos motivos para se celebrar o Dia da Europa, pelo menos desta Europa que temos hoje. E se faltasse ainda motivo para olhar de diversa maneira, pois que se inspirem no seu hino, tirado do 'Hino à Liberdade' da nona sinfonia de Beethoven. Ele também um defensor da liberdade, tendo pago o preço das suas ideias no seu tempo. Tudo motivos para pensarmos que o Dia da Europa deveria ser diferente. Eu, que sempre fui um defensor da adesão e manutenção na Europa e no euro, começo a ficar triste, desiludido até, com aquilo que vejo. Apenas espero que esta horda ultraliberal seja varrida dos corredores de Bruxelas rapidamente, para que a verdadeira Europa surja. Solidária e humanista como aquela que foi sonhada pelos seus pais fundadores.
Sunday, May 08, 2016
De novo!...
Voltou a acontecer o inevitável. De novo a comida foi toda roubada! Já não sei o que fazer, nem como proceder. Moro demasiado longe para lá passar amiúde como fiz noutros tempos em que vivia mais próximo. Toda a comida tinha desaparecido, inclusive a comida seca que o meu amigo lá teria colocado. Nem essa escapou. Já agora, apelo a quem puder passar por lá para levar comida seca, ficava-lhe muito grato. É que já não tinha nenhuma quando cheguei ao local. Apesar da chuva, os dois gatos lá me esperavam. Vieram comer juntos, coisa que vi pela primeira vez. Pelo menos esses, se comerem depressa, verão os seus estômagos cheios. (Ver foto). O cão não o vi. Já não o vejo vai para algum tempo. Talvez já tenha desistido de por lá aparecer. Afinal sempre que chega não deve ter nenhuma comida. Estou muito triste com tudo isto. Sinto-me impotente para alterar o rumo das coisas. Definitivamente!...
Saturday, May 07, 2016
Tenho dúvidas!...
Quando cheguei ao local onde alimento o cachorro o aspeto era o da foto anexa. Fiquei com dúvidas se a comida tinha sido roubada ou não. Embora houvesse lá muita comida seca, (esta poderia ter sido colocada durante a noite como muitas vezes o meu amigo faz), quando vem ou vai para o seu turno de trabalho. Seja como for, fiquei com dúvidas, mas nada posso inferir. Lavei os recipientes, - porque parece que se não for eu a fazê-lo ninguém o faz -, e abasteci-os de comida. Espero que apareçam para comer e ainda tenham tempo para isso. Do cão e dos gatos nem sinais.
A reestruturação da dívida portuguesa
Muito se tem falado da reestruturação da dívida portuguesa. Uns que a exorcizam de imediato, outros que fazem dela a sua bandeira política. Mas afinal de que estamos a falar quando falamos de reestruturação da dívida? Tal acontece quando um país com insípido crescimento económico, com uma débil criação de riqueza nacional, se vê a braços com uma dívida gigantesca e com um serviço da dívida esmagador. Não significa, como por vezes se ouve por aí, o não pagar a quem nos emprestou, que seria o pior que nos poderia acontecer. Esta situação não é nova em Portugal. Já várias vezes trouxe à colação o que se passou em finais do século XIX, quando Portugal se viu confrontado com uma situação em tudo idêntica à atual. E desde muito jovem, ouvia os meus avós traçar laudas a Salazar 'por ter batido o pé aos estrangeiros que queriam mandar em Portugal'. Os meus avós nada sabiam de reestruturação de dívidas nacionais, nem conheciam os seus impactos no país. Mas eles, como muitos portugueses, sentiram isso como 'uma ofensa à Pátria', como então se dizia. O que de facto se passou, foi que essa dívida contraída junto do Banco de Inglaterra no século XIX - leiam 'Os Maias' de Eça de Queiroz - e, sobretudo, o serviço da dívida associado, estavam a esmagar o país, tal como acontece hoje. Salazar reestruturou-a, já no século XX, contra a vontade das forças económicas de então, e alargou o seu prazo. Esta dívida só veio a ser paga na totalidade em Janeiro de 2011!!!... Portugal pagou a dívida, mas aliviou a pressão dos credores, obtendo prazos mais largos e juros mais baixos, mais conducentes com a realidade do país. Isto é a reestruturação da dívida. O que é mais curioso é que, aqueles que se opõe são pessoas próximas da direita, onde ainda militam alguns simpatizantes do antigo ditador português; e, os que a defendem são pessoas da esquerda, uma esquerda que nem quer ouvir falar de Salazar, mas que neste capítulo se revê na sua estratégia. Política à parte, esta reestruturação é inevitável, caso contrário, a sua pressão, evitará um crescimento económico sustentado que se deseja, a riqueza nacional criada será cada vez mais insípida, (o que agravará ainda mais a dívida), vendo esta aumentar paulatinamente, porque não a conseguimos controlar, visto que tudo o que criamos vai para o serviço da dívida e, mesmo assim, fica aquém das necessidades. Daí que a reestruturação da dívida seja algo que, contra ventos e marés, vamos ter que enfrentar mais cedo ou mais tarde. O não o fazer será arrastar Portugal para o empobrecimento crónico donde terá muitas dificuldades em sair.
Friday, May 06, 2016
Intimidades reflexivas - 642
"Não precisa ser homem, basta ser humano, basta ter sentimentos, basta ter coração. Precisa saber falar e calar, sobretudo saber ouvir. Tem que gostar de poesia, de madrugada, de pássaro, de sol, da lua, do canto, dos ventos e das canções da brisa. Deve ter amor, um grande amor por alguém, ou então sentir falta de não ter esse amor.. Deve amar o próximo e respeitar a dor que os passantes levam consigo. Deve guardar segredo sem se sacrificar." - Vinicius de Moraes (1913-1980) in 'Procura-se um amigo'.
A crise sistémica que anda por aí
Todos vamos ouvindo - umas vezes mais claramente, outras mais em surdina - que o nosso sistema financeiro está em crise. Nada de mais verdadeiro. Depois do BPP e do BPN, (que foram os primeiros sinais de que algo estava mal terem colapsado), logo apareceu com estrondo o banco dos bancos - o BES - com o seu cortejo de surrealismo que ainda não terminou. O mesmo se diga do seu sucessor - o chamado banco bom batizado de Novo Banco - que parece que ninguém sabe bem o que fazer com ele. Depois aconteceu o recambolesco caso do BANIF, (que ainda não foi explicado na sua verdadeira amplitude), enquanto outros se perfilam na linha de resgate que a todos nós irá custar muito. Mas este novo alinhamento que é percetível e que é falado à boca pequena, vai para algum tempo, assume hoje uma visibilidade notória quando o ex-ministro das Finanças, João Salgueiro, admite que, para além do Novo Banco, também o Millenium e a CGD poderão vir a seguir o mesmo caminho, juntamente com um outro 'pequeno banco', para utilizar a expressão de João Salgueiro. Nada de novo, nada que já não fosse conhecido ou pressentido para quem faz desta atividade profissão. Não é tão difícil assim ler os sinais, embora para a maioria das pessoas, tal não seja tão claro assim. Como já por diversas vezes afirmei neste e noutros espaços, o sistema financeiro português está caduco, podre, porque se foi acomodando a um olhar para o lado dos poderes instituídos, - que levaram à impunidade durante demasiado tempo -, que lhe foram dando apoio, senão duma forma explícita, fizeram-no duma forma implícita. Sempre com o receio duma possível crise sistémica, lá se ia remendando aqui e ali, para evitar que os buracos não alargassem em demasia. Só que esses remendos foram executados em pano demasiado podre, e os buracos foram-se alargando, não sendo já possível, ignorar esta situação. E chegados aqui, estamos perante um problema muito sério. Se por um lado, a chamada 'espanholização' da banca tem sido fortemente contestada, - e bem -, o certo é que, alternativas não são visíveis no horizonte. O problema é tanto mais sério quando vemos que a banca nacional se afunda em tragédia a seguir a tragédia, pondo em causa um sistema financeiro que deveria ser português. Porque um país sem sistema financeiro é um país sem independência nacional, por mais que nos digam o contrário. Assim, neste emaranhado a que chegamos, só a nacionalização da banca me parece ser a saída mais plausível. (Cumpre aqui fazer uma declaração de interesses de minha parte. Não sou um defensor duma banca nacionalizada, e isso já deu muito maus resultados num passado não muito longínquo. Mas também não sou defensor duma espécie de balda institucional em que vale tudo, onde as pessoas que gerem a banca nem sempre são as melhores, onde as regras impostas são sempre torneadas sem que quem as determina pareça ter voz ativa no caso). Daí a criar-se os 'donos disto tudo' é um passo. Já o foi no passado, poderá sê-lo no futuro. Só que até agora, os 'donos dito tudo' eram portugueses, e no futuro serão estrangeiros. Face a esta sibilina questão, o controlo da banca pelo Estado parece ser inevitável, nem que mais à frente, se pense em vendê-los a privados, como acabou por assumir João Salgueiro na entrevista que hoje deu na Antena 1. Só que não podem ser vendidos a esmo, sem que se escrutine quem os pretende adquirir, caso contrário, e a prazo, estaremos no mesmo ponto de encruzilhada em que agora nos encontramos.
Thursday, May 05, 2016
Intimidades reflexivas - 641
"... Em todos os manicómios há doidos malucos com tantas certezas! Eu, que não tenho nenhuma certeza, sou mais certo ou menos certo? Não, nem em mim... Em quantas mansardas e não-mansardas do mundo Não estão nesta hora génios-para-si-mesmos sonhando?" - Álvaro de Campos (heterónimo de Fernando Pessoa) in 'TABACARIA'.
Mais um apelo extremo
Dois amigos contactaram-me para tentar ajudar a uma situação dramática sobre uma cadela que poderá vir a ser abandona hoje. A mensagem é a seguinte:
"Os pais de um colega meu querem abandonar a cadela. Ele tem até amanha para arranjar um sitio para ela ficar. Não nos pode ajudar? Ela é super querida e não estamos a conseguir ninguém para ficar com ela permanentemente ou temporariamente ate arranjar mos outro dono. Pf ajude nos, estamos desesperados."
Ao que julgo saber, tal prende-se com um senhorio que está no meio da polémica, mas que, legalmente, não pode impedir o inquilino de ter o cachorro. Depois, a pessoa que o pretende abandonar pode incorrer num crime contra animais que poderá trazer-lhe dissabores. No meio de tudo isto está a cadela que pode vir a enfrentar uma situação dramática nas próximas horas. Agradecia ajuda ou partilha. O contacto da pessoa é Miguel Ferreira com o número 915612080. Segue foto em anexo.
Wednesday, May 04, 2016
Morrer é mais difícil do que parece - o texto de Paulo Varela Gomes
Um texto de Paulo Varela Gomes publicado na revista Granta a 10 de Abril de 2015, que muito me sensibilizou, que muito me incomodou. A morte é algo para o qual nunca estamos preparados. é algo doloroso e profundo. Aqui fica o texto que merece uma leitura atenta. Porque, por vezes, só valorizamos o essencial da vida, quando ela está prestes a nos deixar. Um texto para refletir e para sermos capazes de ser pessoas melhores ao longo da vida que nos foi dado viver. Eis o texto:
"Tenho um cancro de grau IV. De cada vez que abro o teclado do computador na intenção de escrever, ocorre-me a frase, já mil vezes repetida, “Quando estiverem a ler estas linhas, é provável que o autor já não esteja vivo”.
São incontáveis os artigos, livros, documentários e filmes sobre pessoas que morrem de cancro. Nunca vi nenhum porque não aguento o stress mas ouvi dizer que alguns são eficientes e fazem os espectadores chorar muito. Não vou escrever aqui um artigo desse género, primeiro, porque não sou capaz, e em segundo lugar porque a história da minha doença e daquilo que tenho feito para lidar com ela tem algumas características muito peculiares que podem interessar a todo o género de pessoas que se preocupam com a vida e a morte e que pensaram com seriedade no tema deste número da Granta: “Falhar melhor”.
Tudo começou quando acordei uma manhã com um inchaço do tamanho de uma amêndoa no lado esquerdo do pescoço. Iludido por uma espécie de incredulidade optimista, pensei que se tratava do resultado de uma infecção nos dentes ou na garganta. Desenganou-me um médico especialista dessas áreas com quem fui falar alguns dias depois: “O senhor tem uma massa na garganta. É melhor ir ver isso rapidamente.” Estava muito grave e sossegado, ele. Percebi depois que nunca lhe tinha passado pela cabeça que alguém não soubesse o que quer dizer “massa” em termos orgânicos. Esta foi a única consulta médica a que a Patrícia, minha mulher e minha “curadoura”, não me acompanhou. Estava a ajudar a Rita a podar as videiras da Vinha Comprida. Quando lhe telefonei a transmitir a seca mensagem do médico, percebeu tudo e diz-me que ficou imenso tempo a olhar lá para o longe, para o pinhal sobre a várzea, com as lágrimas a correr-lhe pela cara.
Quarenta e oito horas depois fiz a obrigatória TAC cervical. Despi-me sem preocupações, coloquei aquela bata ridícula dos hospitais que faz qualquer pessoa parecer que sofre ininterruptamente dos intestinos, deitei-me na máquina. No fundo, esperava boas notícias: não tarda, iriam informar-me de que se tratava de uma chatice menor. Estivemos depois hora e meia debaixo da luz verde escura, crepuscular, da sala de espera. Quando o radiologista veio falar connosco, acabou nesse preciso instante a vida que levávamos juntos há mais de duas décadas. O radiologista tinha a expressão macambúzia de quem apresenta os pêsames a uma família enlutada: cancro na otofaringe com tumor na cadeia linfática cervical posterior e metástases no pulmão. Não operável. Tratamentos em doses muito altas de quimio e radioterapia para, daí a dois a quatro meses, deixar de poder comer ou respirar.
Decidimos que nunca me submeteria aos tratamentos da medicina oncológica, às suas armas: as clássicas (cirurgia), as químicas (drogas) e as nucleares (radioterapia). Estas armas destroem as defesas próprias do organismo e aceleram frequentemente a sua degradação. Já vi suficientes doentes de cancro entregues nas mãos da oncologia para tremer de horror ao pensar que poderia suceder-me o mesmo.
Quando voltámos para casa, não houve uma lágrima, um gesto de desespero, um queixume. Falámos muito pouco. As estradas por onde passávamos tantas vezes pareciam agora ter uma realidade inverosímil, como se fossem pinturas de paisagem antiga. Fazia calor e a luz era branca.
Durou vários dias seguidos, este silêncio emocional. As palavras que trocámos em casa foram reduzidas ao mínimo. Uma consulta com um médico do IPO confirmou tudo o que estava no relatório do radiologista. Mais tarde, algumas instituições com nomes que tilintam como lingotes de ouro vieram dizer-nos o mesmo: não havia nada que valesse a pena fazer.
Essas opiniões não nos importaram, porém. Numa estranha frieza, só quisemos saber o que faríamos para acabar com a minha vida quando essa altura chegasse. A Patrícia jurou que não me impediria de morrer, e até me ajudaria se fosse necessário. Como disse Plotia ao poeta em A Morte de Virgílio de Hermann Broch: “A morte fecha-se a quem está só, o conhecimento da morte apenas se desvenda à união de dois seres.”
Sucede que estes acontecimentos já me parecem um pouco perdidos no nevoeiro do tempo. Passaram mais de mil dias desde a tarde abafada de 23 de Maio de 2012, quando fiz a TAC, até à nebulosa e fresca tarde de Primavera em que estou aqui a escrever isto. Dois anos e onze meses.
Não sei se nesta evolução, que não tem cessado de nos surpreender e a quem nos conhece, podemos adivinhar a lenta condensação de um milagre. Sei que há muita gente a rezar por mim e é com alegria que agradeço a todos.
Mas sei também que tenho recorrido a muitas medidas práticas para evitar a sorte ditada pelos oncologistas.
A primeira foi fazer-me acompanhar, desde algumas semanas depois da TAC, por um médico homeopático (os médicos encartados não acham graça nenhuma a que se chame médico a um homeopata, mas tenham santa paciência). Sob sua orientação comecei por mudar radicalmente de regime alimentar. Em vez de comer produtos tóxicos como faz a maior parte das pessoas, passei a alimentar-se com produtos que ajudam o meu sistema imunitário e alguns que combatem o cancro activamente. Além disso, o médico foi prescrevendo suplementos alimentares e medicamentos homeopáticos.
Devo à homeopatia a qualidade dos mais de mil dias de vida que levo de vantagem sobre os médicos oncologistas. Duas ou três semanas depois de começar a terapia já começava a duvidar de alguma vez ter tido cancro. Imaginem: um canceroso em estado grave, que pouco tempo antes estava arrasado de cansaço e pessimismo, foi à praia! Confesso que tive medo de entrar na água, eu que vivi junto ao mar e mergulhei nas suas ondas vezes incontáveis. Só no segundo dia consegui decidir-me, e foi tão grande a felicidade experimentada no corpo que percebi que a Idade do Gelo em que tínhamos vivido desde o diagnóstico tinha dado lugar a uma Primavera, incerta e frágil, é verdade, cheia de dias de nuvens, mas tempo de viver e não de morrer.
As semanas correram e fomos passear a Toledo, a Burgos, a Viseu. Participei em conferências, orientei alunos, fiz todos os dias companhia à minha mulher e aos nossos seis cães, andei com a minha neta aos saltos sobre os charcos de água da chuva. As minhas análises foram durante muito tempo boas, e o meu aspecto muito diferente da maioria dos desgraçados que frequenta os campos de morte da oncologia. Além disso, como os leitores e leitoras saberão, escrevi e publiquei três romances, uma colectânea de colunas escritas para jornais, e finalizei mais um romance e um livro de contos.
Todavia, não houve um único dia em que não tenha pensado na morte. Nem um. Ao princípio não receei mas também não compreendi essa Senhora de Negro e, portanto, ofereci-lhe de bandeja as inúmeras oportunidades que, demoníaca, busca dentro de nós para nos fazer a vida num inferno ou para nos levar. É verdade que a vontade de viver teve desde sempre mais poder sobre mim do que a desistência perante a morte ou a ida ao seu encontro – já não estaria aqui se assim não fora. Mas vida e morte estão por vezes demasiado próximas e o conflito entre elas que tem lugar no meu espírito é muito antigo e muito complexo. Sou acompanhado por psicanalistas há muito tempo. Aquele com quem trabalho desde há alguns anos, e que é uma das peças-chave do puzzle da minha não-morte, recebeu como uma pancada a notícia do meu diagnóstico e, depois de uma breve conversa entrecortada de angústia e silêncio, lembro-me de lhe ter dito com um ar quase triunfante: “Nem sempre se pode ganhar, doutor…”
Quem é que estava a falar assim pela minha boca? Quem é que experimentava em mim essa estranha alegria raivosa que emergira quando soube que tinha um cancro e que este era incurável? Que força psíquica queria que eu morresse, que as pessoas tivessem misericórdia de mim, se recordassem, me admirassem? Que parte de mim, velha e zangada, se aproveitava assim deste meu narcisismo para me arrastar para a morte?
A vida é muito menos cheia de prosápia do que a morte. É uma espécie de maré pacífica, um grande e largo rio. Na vida é sempre manhã e está um tempo esplêndido. Ao contrário da morte, o amor, que é o outro nome da vida, não me deixa morrer às primeiras: obriga-me a pensar nas pessoas, nos animais e nas plantas de quem gosto e que vou abandonar. Quando a vida manda mais em mim do que a morte, amo os que me amam, e cresce de repente no meu coração a maré da vida. Cada lágrima que me escorre por vezes pela cara ao adormecer, cada aperto de angústia na garganta que sinto quando acordo de manhã e me lembro de que tenho cancro, cada assomo de tristeza que me obriga a sentar-me por vezes à beira do caminho quando vou passear com os cães e interrompe a oração ou a conversa com o céu que me embalava o espírito, cada um destes sinais provém do falhanço momentâneo do amor dos outros em amparar-me, e sobretudo do meu em permitir-lhes que me acompanhem.
Quando, pelo contrário, decorre um dia em que consigo escrever e gosto daquilo que escrevo, em que me curvo sobre os canteiros para cortar ervas daninhas, em que admiro amorosamente a energia da Patrícia sentada ao computador ou a trazer lenha para casa, quando isto sucede, o meu tempo já não é o Tempo Comum mas antes um longo domingo de Páscoa: sinto a presença amorosa de todos os que precisam de mim e d’Aquele de quem eu preciso.
O médico homeopata nunca me prometeu um milagre, e a minha saúde começou a piorar em Janeiro de 2014, cerca de um ano e meio depois do diagnóstico oncológico. Pouca coisa, ao princípio: algumas dores no pescoço, na cabeça e na garganta, mais cansaço, problemas intestinais. Pouco a pouco, desapareceram ou tornaram-se-me impossíveis, um por um, todos os prazeres físicos de cujo timbre e tom já quase me esqueci: o sexo, beber um copo de vinho tinto antes do jantar, fazer uma viagem com mais de duas ou três horas, o gosto da comida sólida a percorrer-me o interior da garganta com os seus variados sabores e texturas, uma corrida com os miúdos ou os cães.
Houve semanas piores, outras melhores, mas o tumor do meu pescoço foi crescendo, rebentou como um pequeno vulcão de pus, e ficou pouco a pouco com um aspecto tão abominável que deixei de aguentar ser eu a mudar o penso todas as manhãs. O terrível panorama estragava-me o dia e a melancólica e repugnante tarefa de cuidar do tumor ficou adstrita à Patrícia, que sabe fazer tudo e não tem nojo de nada. Mais tarde, alternando com ela, começaram a vir regularmente a minha casa as enfermeiras dos serviços continuados de saúde.
E, de repente, ia morrendo: uma grande hemorragia despertou-me a meio de uma noite de Julho de 2014, encharcado no sangue que brotava de uma veia que o tumor do meu pescoço pôs a descoberto e enfraqueceu. Desmaiei imediatamente e a Patrícia, não conseguindo ao princípio acordar-me, pensou que tudo estava acabado.
Ganhei depois, com lentidão e a custo, uma relativa saúde. Passei dias inteiros deitado. Depois, devagarinho, melhorei. Uma nova hemorragia, em Dezembro, embora não tenha atingido a violência da anterior, obrigou-me a considerar uma transfusão de sangue que fiz num hospital que estava, como quase todos nessa época, mergulhado num tal caos que passei um dia simultaneamente divertido e ofendido a observar a desordem que grassava à minha volta.
As duas perdas de sangue fizeram pender a balança para o lado da minha morte interior: regressei à melancolia com que me sentava à sua cabeceira conversando com ela nas duríssimas semanas do Verão de 2012 que se seguiram ao veredicto do cancro. Como é que vou morrer? Exactamente como?, perguntava-lhe.
Não me referia à chamada morte natural, que nunca me tinha ocorrido desde o primeiro dia da doença. Falava da morte infligida por mim próprio.
Entretanto, porém, o cristianismo, que estava quase esquecido desde o meu baptismo, irrompeu pela minha vida através da palavra de um Padre que é outra peça-chave do puzzle, mas desta vez, e ao invés do psicanalista, do puzzle do meu encontro feliz com a morte.
O suicídio é uma ofensa frontal à vontade de Deus que quer que a morte de cada cristão seja a sua disponibilidade para de se entregar à Cruz no momento em que Cristo quiser e da maneira que Ele decidir. Mas eu e a Patrícia tínhamos jurado que eu morrerei aqui, em minha casa, e que nada me fará embarcar no carnaval de luzes da ambulância para ir morrer a um hospital. Esse juramento mantém-se.
Tomámos esta decisão mal tínhamos saído do parque de estacionamento da clínica onde fiz a TAC e ouvi o diagnóstico. No meu espírito doente, a morte celebrava jubilosamente a vitória desse momento e era-me tão impossível controlar ou combater este sentimento como invocar a luz da esperança, encolhida num canto de mim como um miúdo paralisado de terror. Enquanto regressávamos a casa, eu pensava na dificuldade e nos riscos envolvidos no modo como morreu o meu irmão, pensava no salto de uma ponte, pensava na agonia do veneno, na ignorância sobre medicamentos letais, mas sobretudo no facto de que todos estes caminhos da morte ainda concedem ao suicida o tempo suficiente para se arrepender, precisamente aquilo que eu não queria na altura, mergulhado num tumulto mental que julgava mais voluntário e corajoso do que de facto era.
Experimentei por vezes os movimentos da dramatização da minha morte, uma espécie de novela sem invenção e sem vida cujo maior óbice era o de saber se, na altura definitiva, teria a certeza absoluta de não haver outra solução. Conseguiria deitar fora como se fossem trocos sem valor os restos de vida que continuam a cintilar dentro de mim? E se me enganasse? Se não fossem meros desperdícios? Se valessem mais do que a escuridão silenciosa do túmulo onde vou apodrecer?
Aquando da segunda hemorragia, cheguei-me muito próximo de encontrar uma resposta sem alternativa a estas questões. Depois de fechar os cães e de me despedir brevemente da Patrícia, sufocada de pavor e lágrimas, ajoelhada no chão sem conseguir olhar para mim, saí de casa transportando a arma e uma cadeira de plástico onde me sentar com a coronha da arma apoiada no solo. Quase não tinha forças e tremiam-me as pernas. A minha camisa estava empapada em sangue e, tendo passado a mão pela cara e os óculos, vi as árvores, os arbustos, a casa das ferramentas e do tractor, a encosta, a vinha, através de um nevoeiro vermelho. A decisão com que, apesar da fraqueza física, andei sem hesitar algumas dezenas de passos, surpreendeu-me a mim mesmo. Pronto, ia morrer. Aspirei o cheiro intenso, quase ridente, de uma hortelã-pimenta que nascera ao pé do pinheiro grande sem que, até então, alguém tivesse dado por ela. Coloquei a cadeira junto a uns troncos cortados, sentei-me e, já com os canos da arma na boca, o dedo aflorou o gatilho. Senti o metal como uma coisa sem qualidade, cálida, mortiça, dócil. Tudo me pareceu vagamente ridículo, o meu gesto, os objectos de que me rodeara. Veio até mim mais uma vez o cheiro da hortelã. Ergui os olhos que tinha fixados na guarda do gatilho e vi um pinhal que o sol, através de uma abertura nas nuvens, isolava, dourado, do verde-escuro da encosta. Ocorreu-me de repente uma vaga de alegria inexplicável, como se fosse um sinal da presença de Deus à semelhança daqueles que os textos sagrados referem por vezes. Cheguei à mais simples conclusão do mundo: estava vivo e, enquanto assim estivesse, não estava morto. Fiquei verdadeiramente contente, a vida a fervilhar em todas as veias, mesmo as estragadas. Pousei a arma no chão e regressei a casa. Não olhei para trás, para a cadeira branca e a arma, que ficaram ali completamente indiferentes à minha sorte. Ao abrir a porta, a Patrícia, sem conseguir dominar a torrente de lágrimas que lhe corria pelo rosto, caiu-me nos braços. Ficámos muito tempo agarrados um ao outro, quase imóveis, como se fôssemos o tronco de uma grande árvore.
Não há muito mais a contar. A saúde vai piorando pé ante pé.
Deixei para trás a ideia de suicídio por uma razão muito simples que levou demasiado tempo a descobrir. Ei-la nas palavras que Mateus atribui a Cristo (Mt 10, 39), palavras que iluminaram como um relâmpago – e finalmente resolveram no meu coração – a maneira hesitante como lidei com o sofrimento nestes mais de mil dias:
“Aquele que conservar a vida para si, há-de perdê-la; aquele que perder a sua vida por causa de mim, há-de salvá-la”.
S. Domingos, Podentes, 10 de Abril de 2015
Paulo Varela Gomes,
revista GRANTA - n.º5"