George Duke foi muitas coisas. Um músico de ouvidos bem abertos e sem temperamento ou paciência para as “capelinhas” em que se divide a música popular urbana. Morreu segunda-feira, 5 de Agosto, aos 67 anos, em Los Angeles. Segundo o Huffington Post, estaria a receber tratamento para uma leucemia linfática crónica. Começou a tocar piano aos 4 anos, depois de ver um concerto de Duke Ellington. Gravou o seu primeiro álbum de alguma notoriedade com o violinista francês Jean Luc-Ponty. Foi músico de jazz respeitado que produziu e tocou com Miles Davis, Billy Cobham ou Cannonball Adderley. Integrou os Mothers of Invention de Frank Zappa e construiu uma carreira a solo que, nos anos 1970, o levou aos lugares cimeiros das tabelas de vendas com canções apaixonadas pelo funk e em flirt com o disco sound. As imagens mais icónicas de Duke mostram-no de sorriso largo a tocar o keytar [o teclado, popularizado na década de 1980, tocado a tiracolo como uma guitarra]. Tal imagem representa-o bem. Porque o keytar é visto genericamente como o instrumento que o bom gosto esqueceu, uma bizarria que nos habituámos a ver nas mãos de ídolos pop caídos no esquecimento, como uns Modern Talking. Em Duke, porém, o keytar acaba por fazer todo o sentido. George Duke, músico de jazz, estrela pop, (colaborou de perto com Michael Jackson)criador de funk devidamente pecaminoso, só era coerente na sua aparente incoerência. Aparente porque não havia nada de incoerente no seu percurso, antes uma imensa curiosidade (a que o levou, por exemplo, ao Brasil, no final dos anos 1970, para gravar com Milton Nascimento ou Flora Purim o jazz tropicalista de Brazilian Love Affair). Curiosidade e a noção muito moderna, sabemo-lo agora, da inexistência real de uma hierarquia separadora da alta e baixa cultura. Nesse sentido, o músico que se iniciou nas lições de piano depois de ver Duke Ellington foi fiel à sua inspiração primeira, ao homem que afirmou um dia “só existem dois tipos de música, a boa e a má”. Nascido em San Rafael, Califórnia, a 12 de Janeiro de 1946, George Duke formou-se no Conservatório de São Francisco em 1967, onde estudou trombone, composição e contrabaixo. Dois anos depois, gravou com Jean Luc Ponty o álbum The Jean-Luc Ponty Experience with the George Duke Trio. O ensemble cumpriu algumas datas na Costa Oeste americana e, numa delas, Duke foi seguido atentamente, na assistência, por Cannonball Adderley e Frank Zappa. Nos anos seguintes, tocou regularmente com ambos (ouvimo-lo em Chunga’s Revenge ou Apostrophe, de Zappa), iniciou uma banda com Billy Cobham, trabalhou com Sonny Rollins, e começou a firmar-se a solo enquanto nome destacado do jazz de fusão, bem próximo do fervor funk que, recordava, o havia marcado desde criança enquanto frequentador da igreja local em San Rafael. Álbuns como Liberated Fantasies ou Reach for It cimentaram o seu estatuto e canções como Dukey stick asseguraram que seria ouvido pelas gerações seguintes. E foi realmente: encontramos samples da sua obra em canções dos Daft Punk, de Common, MF Doom, Ice Cube ou Mylo. Dividindo-se entre trabalho de produção e a carreira a solo, George Duke manteve-se activo em ambas as áreas até ao fim. Em Julho do ano passado foi obrigado a parar. Corine, sua mulher há quarenta anos, morria na sequência de um cancro e Duke, devastado, sentia-se incapaz de se dedicar à música. Quando conseguiu fazê-lo novamente, gravou DreamWeaver, álbum que dedicou à mulher. Foi editado há apenas três semanas, dia 16 de Julho. Na obra de George Duke encontramos também os álbuns Deja Vu, Illusion, Cool ou Guardian of the Light apenas para citar alguns. R.I.P. George Duke!...