Turma Formadores Certform 66

Thursday, August 29, 2013

"O Reino - Honra, Coragem e Glória" - José Manuel Marques

"O Reino" é um romance histórico baseado nos conhecimentos atuais sobre os factos que estiveram na origem da formação de Portugal. O livro retrata a vida de Dom Afonso Henriques e a complexa teia de relações que levou ao nascimento e reconhecimento de Portugal como um novo reino. Trata-se também de um olhar novo sobre a vida de Dom Afonso Henriques e através dele se propõem novas interpretações históricas sobre muitos dos episódios que estiveram na origem de lendas que ainda hoje conferem um estatuto de mito àquele que foi o primeiro rei de Portugal. Num enredo muito interessante esta estória apresenta-nos um Ibn Herrik  - o maldito de Deus - como era conhecido entre os sarracenos, numa visão bem diferente daquela que se apresentava na escola aos alunos da primária - hoje ensino básico - sobre o fundador de Portugal. Do lado mítico, até santo, que então nos era dado, vemos aqui um Afonso Henriques embusteiro, mestre da mentira e da ilusão, um soldado temido nos campos de batalha não só pela sua determinação, mas também, pela ferocidade com que tratava aqueles que eram aprisionados. Algumas das imagens do livro, leva-nos a olhar com um certo horror, aquilo que se passaria nesses campos de morte, onde se travavam as batalhas. Mas também não há dúvidas da sua intenção de formar um reino e ser rei de Portugal, mesmo contra as ideias que vinham de Roma. Assim se começou a fazer Portugal e este livro é bem ilustrativo daquilo que custou formar o reino. Quanto ao autor, José Manuel Marques, nasceu em Lisboa, em 1962. Formou-se em Biologia, na Faculdade de Ciências da Universidade de Lisboa, e especializou-se em Ecologia de Estuários. É um apaixonado pela história da Península Ibérica e um defensor da unidade cultural entre a Galiza e Portugal, que descobriu na sequência de trabalhos de campo, nos anos 80, como biólogo, no estuário do rio Minho. Resta acrescentar que a edição é da Marcador. Um livro recomendável a todos os que se interessam pela História de Portugal.

Wednesday, August 28, 2013

Göethe, Luther King e a crise!

"Todos os dias devíamos ouvir um pouco de música, ler um livro, admirar um quadro e, se possível, dizer alguma coisa sensata" afirmava o poeta alemão von Göethe que hoje comemora mais um aniversário. E é de facto de coisas sensatas que precisamos. Sabemos das dificuldades que assolam o país, sabemos das angústias que povoam a mente de muitos portugueses. Portugueses que não vendo saída no seu país, acabam por rumar a outras paragens. Normalmente jovens e qualificados, uma emigração bem mais preparada do que aquela que assolou o nosso país nos anos 60 do século passado. Gente jovem, o sangue novo dum Portugal a renovar, que vê assim essa renovação adiada sabe-se lá por quanto tempo. Gente desesperada que deixa para trás aquilo que mais lhes é querido, o país e a família, apenas e só porque não vislumbram um futuro nos tempos mais próximos. Se deste lado, o das populações este é o sentimento, do outro, do lado político parece que tudo corre bem. Ontem ouvimos um membro do governo afirmar que "Portugal vai crescer, não pensem que viveremos sempre em recessão". Claro que sim, essa é uma verdade absoluta à maneira de M. de la Palisse. Em sociedades de economia de mercado, dentro do modelo capitalista, todos sabemos que este modelo evolui em ciclo ondulatório, isto é, a seguir a uma expansão vem uma recessão, a que se seguirá um novo ciclo de expansão. Esta é uma verdade que tem muitos séculos e que foi muito estudada e detalhada por economistas como Adam Smith e David Ricardo. Por isso, senhor secretário de estado, esperávamos que nos dissesse algo mais porque isso já todos sabemos. O problema aqui é saber se o ciclo é mais longo ou mais curto, isto é, se a recessão é mais longa ou não do que a anterior e se o período de expansão é mais alargado ou não do que o que o precedeu. E isso é que não se consegue mensurar pela simples razão que não depende só dum país, e mesmo que assim fosse, mesmo assim seria difícil afirmá-lo porque a economia é baseada em expectativas e essas dependem sempre da maneira como cada agente económico olha para a realidade envolvente. E aquilo que os agentes económicos hoje afirmam é uma terrível desconfiança no futuro, e para isso, basta analisar o índice de confiança dos consumidores, estatística que regularmente é publicada pelo INE (Instituto Nacional de Estatística). E neste contexto, vem-nos à memória as palavras dum famoso discurso de Martin Luther King quando afirmou "I have a dream"! (Discurso que foi efetuado à precisamente 50 anos que se completam hoje). Sim ele tinha um sonho, um sonho de maior igualdade entre as pessoas, desde logo, entre as diferentes raças separadas pela cor da pele, mas a sua mensagem deve ser entendida numa maior abrangência, a do esbater, cada vez mais, as diferenças entre os vários estratos sociais. E aqui é que as coisas se tornam mais complicadas. Num envolvimento ultraliberal que campeia na Europa essa realidade é cada vez mais uma miragem. E aquilo a que assistimos é a uma concentração da riqueza na mão duns tantos - cada vez menos - enquanto um leque cada vez maior é atirado para as franjas da pobreza. Portugal é um bom exemplo disso e não pensem que é só por culpa da crise. Este modelo ultraliberal já fez o mesmo quando foi imposto noutras paragens e num outro tempo. O cerne da questão é o processo ideológico utilizado que gera um modelo macroeconómico assente nessas teses. A crise é apenas uma justificação, um "modus faciendas" que ajuda a implementá-lo duma forma sub-reptícia. E enquanto as classes não se vierem a aproximar de novo nunca poderemos dizer que vivemos em democracia. A menos que pensemos o contrário pelo simples facto de quatro em quatro anos irmos depositar um voto nas urnas.

Monday, August 26, 2013

Equivocos da democracia portuguesa - 279

Durante a semana passada viemos a conhecer mais alguns elementos divulgados pelo INE e pela Comissão de Orçamento. Deles se pode concluir o óbvio. Mais défice, mais dívida, mais desemprego. E quando alguns destes dados parecem mais favoráveis, logo se conclui que estamos numa época de Verão e alguns destes elementos vêm influenciados pela sazonalidade que todos os anos se repete, como é o caso do desemprego. E mesmo que o governo se agarre a alguns "pozinhos" de melhoria, uma análise mais cuidada e comparada com o período homólogo logo deita por terra esse discurso otimista. Não o dizemos com nenhum sentimento de regozijo porque todos nós seremos as vítimas da não recuperação desta malfada crise que não nos larga. Tudo isto fruto de políticas desajustadas que não prometem o vislumbre da esperança por mais que a tentemos enxergar. Se a isso juntarmos a trapalhada dos "swaps" cujos documentos parecem ter sido destruídos (!), se juntarmos um discurso do PM carregado de promessas - mais promessas - que todos sabemos que não se concretizarão, se ainda por cima olharmos para este país a arder que perde muitas das suas riquezas todos os anos, num ciclo infernal de onde parece que também não conseguimos nos libertar, é caso para dizer que mais nos irá acontecer!? Não parece razoável que se tente criar expectativas nos portugueses - obviamente falsas - de que o oásis está aqui tão perto. Não é assim. Isto é fruto duma ideologia ultraliberal que tomou conta de Portugal como já tinha tomado conta da Europa. Os resultados estão à vista e não só em Portugal. As medidas nunca chegam, são sempre precisas mais e mais duras, numa espiral que leva ao empobrecimento dos povos e ao realinhamento por baixo da sociedade. Esse é o caminho que o ultraliberalismo traçou - afinal é inerente à sua própria ideologia - que fez escola nos EUA nos anos 70 do século passado e que teve como campo de experimentação a América Latina, especialmente o Brasil, Argentina e Chile, com as consequências que muitos de nós se lembrarão. E só quando colocaram de lado essa estratégia é que os povos conseguiram erguer-se de novo. Por isso, é que defendemos que não basta Portugal alterar a política - embora isso já fosse importante - mas será necessário que a Europa siga noutra direção, caso contrário, tudo mudará para que tudo fique na mesma. Esta ideologia também foi a que foi lançada por um consultor famoso do governo e que ontem tivemos a notícia do seu falecimento. Chamava-se António Borges. Não somos dos acham que quando alguém morre passou a ser uma boa pessoa, mas também, não seguimos o modelo de perpetuar e estigmatizar a memória de alguém depois da sua morte. António Borges foi responsável como consultor, mas não foi/é o único. António Borges foi, apesar de tudo, um brilhante economista que chegou a ser nomeado número dois do FMI por Dominique Strauss-Kahn. Afinal nunca escondeu ao que vinha. Era um homem de direita. Era um liberal assumido que defendia com vigor as suas convicções. Tivemos o prazer de o conhecer em vida e de assumirmos publicamente as nossas divergências com a ideologia que ele defendia em algumas conferências em que participamos. Mas isso não significa que nesta hora não o reconheçamos como um economista de valor e um dos mais brilhantes da sua geração. E mesmo para aqueles que acham que se deve estigmatizar o seu nome, não esqueçamos que a política defendida por um consultor pode ou não ser seguida por um governo. E isso já não é culpa do consultor mas do governo que afinal pensa da mesma maneira e a quem cabe a decisão final das políticas. Por isso não confundamos as coisas.

Thursday, August 22, 2013

Tempos de hipocrisia

Temos sido surpreendidos com as notícias que vêm do Médio Oriente, especialmente do Egito e da Síria. Culturas milenares que se imolam no altar do poder efémero, em guerras fratricidas, com imagens pungentes que nos entram pela casa adentro. Mas ontem, teve particular relevo aquelas que tiveram origem na Síria. Delas se falava e comentava que o governo sírio tinha utilizado gás tóxico para destruir o seu povo. As imagens mostravam muitas pessoas, especialmente crianças, que sufocavam ou que até já estariam mortas pelo efeito do tal gás. A UE veio dizer que era inaceitável, os EUA que não podia ser permitido e até a ONU achava que tal não fazia parte daquilo a que se usa chamar de "guerra limpa"! Como se houvessem guerras limpas e menos limpas. Guerras são guerras. Todas têm os seus cortejos de horrores onde as crianças e as mulheres são o alvo principal. Não há nobreza na guerra porque ela é bestialidade, sejam quais forem os tempos, sejam quais forem as motivações. Seja a brutalidade de Afonso Henriques que recorria ao empalamento dos seus prisioneiros sarracenos para desmoralizar os exércitos inimigos, sejam as atrocidades de Hitler, sejam a morte com gases - aqui também - no Iraque ou a homofobia do Irão. As guerras não são limpas. Nunca são limpas. E normalmente quem sofre as consequência não são os senhores que as fazem, mas as populações que, normalmente, nada têm a ver com estas questões, que se vêm no epicentro das atrocidades. Como se pode dizer que é cruel e desumano a utilização de armas químicas quando elas têm vindo a ser utilizadas desde há muitos anos? O seu uso maciço teve lugar logo na I Guerra Mundial, depois nas câmaras de gás da II Guerra Mundial, e desde aí, nunca mais se parou! Mas se é cruel morrer com gás, não o será também com um tiro, na guilhotina ou na terrível bestialidade dum empalamento? E que dizer daqueles que usaram a descoberta da desfragmentação do átomo para produzirem Hiroshima e Nagasaki? Os EUA que acham inadmissível o seu uso na Síria, não o utilizam também nas suas guerras hegemónicas? Não as utilizaram quando queimaram um país chamado Vietname? Não as utilizam hoje em dia? Afinal que moral é esta de guerras limpas e sujas? Quando se fala de guerra nunca se pode falar de serem limpas ou não, como as mãos de quem as provoca também não estão limpas. As mesmas mãos que vendem esses armamentos para ajudar a sua indústria que as confeciona. A hipocrisia é hoje em dia também uma arma de propaganda que esconde muita da sujidade que a mente humana é capaz de produzir. Quando se produziram armas químicas já as mentes que as conseguiram criar estavam toldadas pela sujidade da guerra onde seriam usadas porque não são só as pessoas que sofrem com elas, mas também os animais indefesos que nem percebem o que lhes está a suceder, como a natureza quando sofre com armas de desfolhamento para tornar o campo de batalha mais limpo como foi o caso do Vietname e do Cambodja. Já para não falar no napalm que foi usado nessas paragens ou até nas nossas antigas colónias.  Normalmente quem vem agora com a hipocrisia estampada no rosto falar do tema são aqueles que pior uso deram a tais armas e as suas palavras apenas escondem a lama que sai das suas bocas. Nem sequer servem para exorcizar consciências porque simplesmente já nem as têm.

Saturday, August 17, 2013

"As Cinquenta Sombras Livres" - E. L. James

E eis-me chegado ao fim da saga de E. L. James. No 3º volume e último da obra assiste-se ao "normalizar" desta relação tempestuosa entre Anastasia e Grey. É o casamento, é o nascimento dos filhos, mas é também, o tempo de velhos fantasmas aparecerem e de Grey, finalmente, abrir a sua mente e começar a falar sobre aquilo que o tem atormentado ao longo da vida. Ao falar vai exorcizando os fantasmas que lhe povoam a mente e vai criando condições para que a relação com Anastasia se "normalize" adquirindo um tom de maior cumplicidade entre os dois. Se no primeiro volume era a descoberta dos fantasmas de Grey e dos seus gostos bizarros face à timidez de Anastasia, no segundo volume começamos a perceber que ambos vão cedendo um pouco até encontrarem o equilíbrio porque tanto anseiam. Anastasia vai cedendo aos gostos extravagantes do seu amante e Grey vai suavizando as suas preferências para agradar à mulher que ama. Neste terceiro volume a relação está estabilizada. ambos sabem até que ponto podem ir e até onde podem invadir o território do outro, bem como a razão de ser, de tão estranhos gostos. Mas vai mais longe. Mesmo no final, a seguir ao epílogo, aparecem referências à visão de Grey face a Anaastasia e a impressão que ela lhe coloca a quando do seu encontro no seu escritório. A visão do outro lado, depois de no primeiro volume termos assistido ao como Anastasia o viu pela primeira vez e a impressão que lhe causou. Muito ao jeito de George Lukas na saga de "Star Wars" no final as pontas soltas unem-se e formam uma identidade própria e una, respondendo assim a muitas perguntas que ficam no ar quando se começa a ler a obra. Correndo o risco de parecer uma espécie de tratado sadomasoquista numa primeira e apressada leitura, a obra é muito mais do que isso no seu todo. E. L. James quando a apresentou entre nós afirmou que os seus pais achavam interessante mas com "sexo a mais". Porventura terão razão mas se não fosse assim todo o enredo se perderia. Mas para além desta visão quiçá apressada, acho que a obra é um verdadeiro tratado de psicologia. A batalha que se trava entre as mentes dos dois protagonistas é avassaladora desde o primeiro volume até ao último. Sem conceções esta é uma obra que nos tira o fôlego, que nos esmaga pela sua intensidade. E. L. James surpreendeu-me sem dúvida. E embora já tivesse visto a obra muitas vezes em exposição nunca me despertou a curiosidade até que mão amiga me fez chegar o primeiro volume, a quem agradeço, porque se assim não fosse nunca a teria lido. Depois é impossível parar até se chegar ao fim. Obra já considerada como das mais importantes do século XXI que ainda vai no seu início - os rótulos nos livros como noutras coisas são sempre exagerados e pautados pelo marketing - mesmo assim não deixo de a considerar um marco importante da literatura. Sobre a autora não tecerei comentários já feitos a quando da apresentação dos volumes anteriores. A edição é, como sempre, da Lua de Papel. Recomendo vivamente a sua leitura.

Friday, August 16, 2013

Equivocos da democracia portuguesa - 278

Como se vai vendo ainda é cedo, diríamos até, demasiado cedo para afirmar que os dados publicados pelo INE na semana passada são o fim da recessão e da crise. Achamos até que ainda estamos longe disso, embora os políticos continuem a iludir a questão por motivos óbvios. O relatório do Barclays que foi publicado a semana passada tem uma visão mais pessimista apontado até para a inevitabilidade dum segundo resgate. Achamos também que dele não escaparemos. Já por diversas vezes o enunciamos neste espaço e pensamos que não existem razões para o desdizer. O BEI (Banco Europeu de Investimento), que tem uma classificação de AAA, não vê com bom olhos o meter dinheiro em países com dificuldades como o nosso. E para que isso se verifique, será necessário que a UE crie uma agência "match making", isto é, uma agência de "rating" que facilite a aproximação das partes já tantas vezes defendida e nunca concretizada. Bem como, tire da gaveta as "project bonds" - que os tratados europeus permitem ao contrário das "euro bonds" - de que tanto se tem falado sem nada se ver de concreto. Porque se assim não for só nos restam duas alternativas para o ajustamento (bem como aos outros países em dificuldades): Uma alternativa por fora, com a diminuição dos salários para tornar as exportações mais competitivas, que leva invariavelmente a uma espiral de alinhamento por baixo, com o empobrecimento das populações - tese defendida pelo atual governo - ou, uma alternativa por dentro, com a nossa saída do euro, podendo Portugal ajustar a sua moeda como fez nos anos 80 e 90 - com riscos elevados de criar uma moeda própria que começa logo com uma forte desvalorização. E desde logo, uma das medidas será inevitavelmente a reforma do Estado que terá que ser feita, seja qual for a alternativa, coisa de difícil implementação. Veja-se que embora o executivo fale muito dela ainda nada de visível apareceu sobre a matéria para além dum relatório de quatro páginas (!) elaborado por Paulo Portas. E mais do que fazê-la no segredo dos gabinetes, deveria ser aberta à sociedade para que esta percebe-se o que está em causa e desse o seu contributo para que tal se efetivasse. Em vez disso, o governo achou por bem nomear um "conselho de sábios" que indicia, desde logo, que não andará tão célere quanto isso, e admitindo até que não tem ideias para levar a cabo tal tarefa, que é fundamental para o desempenho do país nos anos vindouros. Aquilo que se sabe são de medidas desgarradas que não enquadradas no seu todo. Desde logo, o abaixamento do IRC para as empresas. Sem deixar de considerarmos importante tal medida, ela peca por desajustada. Porque com a tentativa de baixar os custos das empresas e assim torna-las mais competitivas, esquecem que as empresas precisam de consumidores e estes não existem porque não têm poder de compra. Assim, dever-se-ia considerar um abaixamento também no IRS para que os cidadãos ficassem com mais meios disponíveis que seriam libertados no consumo aumentando a procura e, desde logo, a produção das empresas, ajudando a criar emprego e a potenciar investimento. Até porque nunca podemos deixar de chamar a atenção para que em Portugal já se atingiu a chamada "fadiga fiscal", isto é, à medida que os impostos aumentam a receita fiscal diminui, aquilo que tecnicamente encerra no conceito de "propensão marginal ao imposto", conceito tão caro aos economistas. Por tudo isto, pensamos que estaremos ainda por muito tempo nesta encruzilhada que nos vai devorando dia a dia. Mesmo com o aproximar de eleições (autárquicas) que leva a que os políticos pintem sempre de cor-de-rosa toda a realidade envolvente, pensamos que nem isso já será possível. Porque as populações estão desconfiadas, descrentes, desmotivadas. E isso também não é o melhor dos cenários para aquilo que nos espera nos tempos mais próximos, que serão, seguramente, tempos de grande exigência. Desde logo com o OE para 2014. Que fará, temos a certeza, correr ainda muita tinta. Por todos estes motivos reforçamos a nossa convicção de que estes dados mais animadores que o INE divulgou, não deixando de ser interessantes, ainda estão longe do necessário. E a prudência dos políticos, e desde logo do governo, são bem sintoma disso mesmo.

Thursday, August 15, 2013

Equivocos da democracia portuguesa - 277


Acabou a recessão técnica? Sim! Acabou a recessão? Não! Esta é a conclusão das estatísticas ontem divulgadas pelo INE. (Ironicamente não são alheios os chumbos do TC que potenciaram o consumo e  não podemos esquecer também que nos últimos 6 meses o governo não aplicou mais austeridade aliviando assim a pressão sobre a economia). Se nos temos que congratular pelo fim da recessão técnica, já o mesmo se não pode dizer do clima de recessão da economia portuguesa. Podíamos ir pelos caminhos de alguns economistas, ao afirmar que a recessão continua em Portugal por maior período do que a Grécia. É verdade! Mas pensamos que devemos seguir outro caminho, o de criar alguma expectativa na economia portuguesa. Sabemos que o efeito das economias mais abastadas, como a alemã e a francesa, que cresceram até acima das expectativas, - embora mesmo assim pouco -, mas com o efeito potenciador de arrasto que se nota dentro da zona euro. Se estamos perante o fim da crise, já tantas vezes anunciado, pensamos que não. Sabemos que este crescimento se segue a um primeiro trimestre desastroso, sabemos da sazonalidade de muitas atividades que contribuem para isto, sabemos que a Europa ainda continua mergulhada em muitas dificuldades. A prudência dos analistas e até do governo – que parece que já aprendeu a não deitar foguetes antes da festa! – é bem o exemplo daquilo que aqui dissemos. Se deixamos de estar tão mal como estávamos anteontem, pode não ser suficiente, mas é um indicador que deve ser lido com otimismo mas também, com prudência. Se temos vindo a criticar o governo pela política seguida – e continuamos a fazê-lo por pensarmos que está desajustada da realidade – tal não significa que não sigamos com uma prudente atenção os dados divulgados. Veremos o que os próximos trimestres nos revelam para vermos com mais clareza o rumo que as coisas estão a tomar. Ainda é cedo para se tirarem conclusões.

Wednesday, August 14, 2013

Tuxa - A sobrevivente

A Tuxa continua a sobreviver. De novo, novos tumores estão a aparecer pelo corpo todo. Alguns vão abrindo para drenar. Ajudamos à sua drenagem e ela logo fica melhor. Sobrevivente como é, até parece que não tem nada. Voltou a usar o colete com fraldas para absorver a drenagem. Tirando isso e um aspeto bem mais magro e fraco, até parece que a Tuxa está bem. Mas não está. Com a morte anunciada há muito, ela vai conseguindo iludi-la, mas chegará o dia em que não o conseguirá. Nós, que já estamos informados do que vai suceder, mesmo assim, entramos nessa ilusão. Nunca estamos preparados para o inevitável. E quando a hora derradeira chegar, sofreremos tanto como já o fizemos com os outros que povoaram a nossa existência. A Tuxa tem sido uma sofredora. Desde o abandono precoce, até às várias doenças que trazia com ela quando a resgatamos, o que nos levou a andar no veterinário cerca de um ano, com tratamentos agressivos e que não eram fáceis para nós fazer e para ela suportar, mas com amor e carinho lá fomos ultrapassando tudo. Agora a estória repete-se. Vamos-lhe fazendo o tratamento que a veterinária nos aconselhou, ajudamos à drenagem como ela nos ensinou. Não é fácil. Por vezes, liberta odores desagradáveis, mas o seu olhar vale tudo isso. A sua capacidade de sofrer e de sobreviver são enormes. Amámo-la muito e ela também nos retribui em maior dimensão. Um animal não é algo descartável. Quem não for capaz de tratar dum ser magnífico assim, como poderá tratar dum seu familiar com os mesmos problemas? Sei o que isso é. A minha mãe também morreu com um cancro! E a Tuxa afinal, não é nem mais nem menos, do que mais um elemento da família. Ela é a sombra protetora da nossa afilhada Inês, que também lhe retribui com muito carinho e amor. E quando existe amor e carinho, pode acontecer o milagre. Nem que seja o adiar a morte por mais algum tempo. Nem que seja mantê-la connosco mais umas semanas ou meses. E isso está a acontecer com a Tuxa. Não sabemos até quando, mas enquanto ela por cá andar tudo faremos para lhe minimizar o seu sofrimento. É isso que ela espera de nós, é essa a nossa obrigação. 

Friday, August 09, 2013

Equivocos da democracia portuguesa - 276

 
Ora agora atacou eu, ora agora atacas tu! Este pode ser o resumo do que se está a passar no nosso País nestes últimos dias. Um belisca dum lado e logo o outro, para não ficar atrás, belisca também. O fosso entre os dois maiores partidos cava-se cada vez mais e mais e a possibilidade de um entendimento - que seria benéfico para o país - fica impossível de se concretizar. E no fundo, estes dois partidos, que têm dividido a governação nestes quase 40 anos de democracia, são ambos responsáveis. Não adianta apontar o dedo ao outro porque ambos têm responsabilidades. Mas a maior de todas, foi o terem ajudado a esta promiscuidade entre o setor financeiro privado e o setor público. (Promiscuidade que tem vindo a lume com muita acutilância nos últimos tempos. Só por isso, apetece-nos dizer bem abençoada crise!) Porque era preciso proteger os seus filiados, ambos os partidos - e não só estes - criaram as condições para isso. Criaram uma espécie de Frankenstein incontrolável onde quem é controlado passa a controlar, para depois voltar ao ponto de partida. Num círculo infernal onde rodam as mesmas pessoas, os mesmos nomes, num clube de acesso restrito onde é difícil entrar sem que seja considerado um intruso. Neste carrossel de interesses, aparecem as parcerias público privadas, os "swaps", - temas hoje na moda - mas seguramente haverão outros que aparecerão na altura própria, como outros do passado como foi a reestruturação do ensino ou os solavancos do Serviço Nacional de Saúde. E ainda há quem venha falar em supervisão! Que supervisão resiste a esta teia de interesses, onde quem é controlado hoje é controlador amanhã, deixando as portas sempre escancaradas porque sabe que isso acontecerá e o seu papel se inverterá? Quem se aventura no controle de um banco que foi apoiado, e serviu de cobertura a gentes de determinado partido, que momentaneamente controlava? Quem se arrisca a voltar a trás quando sabe que um dia lhe irão também bater à porta para lhe pedir contas? Diz o povo que quem tem telhas de vidro não deve atirar pedras ao telhado do vizinho. E de facto não encontramos imagem mais adequada para aquilo que se passa neste democracia cada vez mais doente. Mas, como alguns questionam, será que ainda vivemos em democracia? Ou numa espécie de regime onde se vota de 4 em 4 anos para dar a ilusão às populações que a sua vontade ainda é escutada. Afinal quando se escolhe algo que, no essencial não deferirá muito do outro, entramos numa espiral de interesses donde é difícil sair. Quase 40 anos depois de estarmos em democracia parece que ainda não fomos capazes de sair da sua fase mais primária e infantil. Ainda nem à puberdade chegamos e a ser assim como queremos que os outros nossos parceiros, europeus ou não, ainda nos levem a sério? Quando afinal o tal famoso regresso aos mercados por nós próprios poderá não ser bem assim, como ontem o afirmava Miguel Frasquilho; que pensar da decisão de impor à Segurança Social a compra de dívida, decisão tomada por Vítor Gaspar horas antes de sair do ministério, apenas e só para camuflar o valor desta, que lá continua, que as novas gerações terão que pagar, que não desapareceu apenas por uma manobra contabilística para iludir o problema. Que pensar do "factoring" de Manuela Ferreira Leite para baixar o défice para os 3% à época? Afinal porque se discutem os "swaps" - onde se percebe que estiveram gentes dum lado e do outro envolvidas -  depois de tudo isto? Apenas por guerra política que as eleições (autárquicas) estão aí e nada mais do que isso. Afinal que democracia é esta onde a corrupção e o compadrio campeiam impunes? Se é que ainda vivemos em democracia...

Thursday, August 08, 2013

Ruy Belo - 35 anos sobre a data da sua morte

Hoje passam 35 anos sobre a morte de Ruy Belo. Nasceu em São João da Ribeira em Rio Maior a 27 de Fevereiro de 1933 e faleceu em Queluz a 8 de Agosto de 1978. Poeta português de muitas andanças que muito aprecio. Em sua memória deixo-vos aqui um dos meus poemas preferidos "Tu estás aqui". (Podem escutá-lo no link http://www.youtube.com/watch?v=Jh-fK-DNIgM). Neste dia de celebração da sua memória aceitem este meu desafio. Não deixem de ler Ruy Belo, aliás, não deixem de ler, simplesmente, para não nos deixarmos cair na ignorância que assola este país, apesar de muitos cursos universitários com ou sem equivalências...

George Duke a morte aos 67 anos

George Duke foi muitas coisas. Um músico de ouvidos bem abertos e sem temperamento ou paciência para as “capelinhas” em que se divide a música popular urbana. Morreu segunda-feira, 5 de Agosto, aos 67 anos, em Los Angeles. Segundo o Huffington Post, estaria a receber tratamento para uma leucemia linfática crónica. Começou a tocar piano aos 4 anos, depois de ver um concerto de Duke Ellington. Gravou o seu primeiro álbum de alguma notoriedade com o violinista francês Jean Luc-Ponty. Foi músico de jazz respeitado que produziu e tocou com Miles Davis, Billy Cobham ou Cannonball Adderley. Integrou os Mothers of Invention de Frank Zappa e construiu uma carreira a solo que, nos anos 1970, o levou aos lugares cimeiros das tabelas de vendas com canções apaixonadas pelo funk e em flirt com o disco sound. As imagens mais icónicas de Duke mostram-no de sorriso largo a tocar o keytar [o teclado, popularizado na década de 1980, tocado a tiracolo como uma guitarra]. Tal imagem representa-o bem. Porque o keytar é visto genericamente como o instrumento que o bom gosto esqueceu, uma bizarria que nos habituámos a ver nas mãos de ídolos pop caídos no esquecimento, como uns Modern Talking. Em Duke, porém, o keytar acaba por fazer todo o sentido. George Duke, músico de jazz, estrela pop, (colaborou de perto com Michael Jackson)criador de funk devidamente pecaminoso, só era coerente na sua aparente incoerência. Aparente porque não havia nada de incoerente no seu percurso, antes uma imensa curiosidade (a que o levou, por exemplo, ao Brasil, no final dos anos 1970, para gravar com Milton Nascimento ou Flora Purim o jazz tropicalista de Brazilian Love Affair). Curiosidade e a noção muito moderna, sabemo-lo agora, da inexistência real de uma hierarquia separadora da alta e baixa cultura. Nesse sentido, o músico que se iniciou nas lições de piano depois de ver Duke Ellington foi fiel à sua inspiração primeira, ao homem que afirmou um dia “só existem dois tipos de música, a boa e a má”. Nascido em San Rafael, Califórnia, a 12 de Janeiro de 1946, George Duke formou-se no Conservatório de São Francisco em 1967, onde estudou trombone, composição e contrabaixo. Dois anos depois, gravou com Jean Luc Ponty o álbum The Jean-Luc Ponty Experience with the George Duke Trio. O ensemble cumpriu algumas datas na Costa Oeste americana e, numa delas, Duke foi seguido atentamente, na assistência, por Cannonball Adderley e Frank Zappa. Nos anos seguintes, tocou regularmente com ambos (ouvimo-lo em Chunga’s Revenge ou Apostrophe, de Zappa), iniciou uma banda com Billy Cobham, trabalhou com Sonny Rollins, e começou a firmar-se a solo enquanto nome destacado do jazz de fusão, bem próximo do fervor funk que, recordava, o havia marcado desde criança enquanto frequentador da igreja local em San Rafael. Álbuns como Liberated Fantasies ou Reach for It cimentaram o seu estatuto e canções como Dukey stick asseguraram que seria ouvido pelas gerações seguintes. E foi realmente: encontramos samples da sua obra em canções dos Daft Punk, de Common, MF Doom, Ice Cube ou Mylo. Dividindo-se entre trabalho de produção e a carreira a solo, George Duke  manteve-se activo em ambas as áreas até ao fim. Em Julho do ano passado foi obrigado a parar. Corine, sua mulher há quarenta anos, morria na sequência de um cancro e Duke, devastado, sentia-se incapaz de se dedicar à música. Quando conseguiu fazê-lo novamente, gravou DreamWeaver, álbum que dedicou à mulher. Foi editado há apenas três semanas, dia 16 de Julho. Na obra de George Duke encontramos também os álbuns Deja Vu, Illusion, Cool ou Guardian of the Light apenas para citar alguns. R.I.P. George Duke!...

Wednesday, August 07, 2013

Equivocos da democracia portuguesa - 275

Ontem o governo anunciou que antes do dia terminar teria esclarecido todo o incómodo em volta de Pais Jorge! Ontem no habitual "briefing" - agora bissemanal - Pedro Lomba demite em direto o seu colega do Tesouro por "inconsistências problemáticas"! Ontem na SIC Notícias o líder parlamentar do CDS/PP, Nuno Magalhães, afirmava que se fosse ele que estivesse no lugar do secretário de Estado do Tesouro, "faria o que parecia óbvio", isto é, demitia-se! Ontem Pais Jorge parece ter posto o lugar à disposição dada a trapalhada em que está envolvido! Ontem antes que o dia termina-se o governo vem dizer que afinal o documento em que se basearam para acusar Pais Jorge "foi forjado"! Ontem a oposição dizia que a equipa das Finanças estava no grau zero! Depois de tudo isto, seja qual for a justificação que arranjem para ajudar Pais Jorge, este está ferido de morte. Sem condições para exercer o cargo que assumiu e que, talvez, devesse ter rejeitado quando o mesmo lhe foi oferecido. Desde a saída de Vítor Gaspar que o ministério das Finanças está ao deus dará, sem rumo, sem estratégia, afogando-se em contradições, mentiras, ou seja lá o que for mais, que o descredibilizam quando era necessário que se passasse precisamente o contrário. O silêncio de Portas - atual PM em exercício - é deveras ensurdecedor. O seu líder parlamentar já tinha dado a resposta... Ontem ainda na SIC Notícias, Mário Crespo afirmava que este tipo de situações põe desde logo em causa o próprio (Pais Jorge), descredibiliza do governo, afronta a República! Ontem, afirmamos neste espaço que para além de tudo estava o regime e o País! Ontem, Óscar Mascarenhas, Provedor do Leitor do DN, afirmava que "Poiares Maduro e Pedro Lomba são tão-somente o fascismo a bater-nos ao de leve à porta"! (Ver entrevista na íntegra em  http://sicnoticias.sapo.pt/programas/jornaldas9/2013/08/06/scar-mascarenhas-provedor-do-leitor-do-diario-de-noticias-no-jornal-das-9).   Ontem, foi assim! Hoje há quem queira reescrever a História! (Talvez pensando que os portugueses são todos estúpidos e mentecaptos!). Assim se vai afundando Portugal que vai consumindo as suas energias nestas lutas sem sentido em vez de enfrentar os enormes problemas que se lhe deparam pela frente. E foi o que fizeram de Portugal! E como diz ainda Mário Crespo, "até amanhã e que todos tenhamos boa sorte"!

"Comboio Noturno para Lisboa" - Billie August

Já tinha ouvido falar deste filme, mas estava longe de perceber o que ele encerrava. O "Comboio Noturno para Lisboa" é mais do que um filme de entretenimento, é uma viagem ao nosso passado mais obscuro e sombrio duma certa História ainda demasiado recente. Baseado no livro homónimo de Pascal Mercier este filme lida com os fantasmas que as gerações mais velhas ainda não exorcizaram totalmente, fala dos nossos medos e receios dum passado ainda ao dobrar da esquina e do qual ainda hoje não falamos com total abertura. Ainda tentamos ignorar, esquecer, mas esses medos estão bem inculcados lá no fundo de todos nós. Os mais jovens que já nasceram em liberdade, terão dificuldade em digerir tudo isto, afinal para eles não passa de mais um filme, e aquelas cenas mais brutais que eram a imagem de marca da brutalidade dum regime, para as novas gerações são apenas um enredo num filme que logo esquecem enquanto se afogam num balde de pipocas - que péssimo habito! - e que nada ou pouco lhes diz. Para eles isso são coisas dum outro tempo, dum outro mundo que felizmente não é o seu, nem o conheceram. Este filme de Billie August coloca-nos frente ao espelho, um espelho que reflete imagens que não gostamos, que tentamos rejeitar como sendo dum outro país que não o nosso. Só por isso, já teria valido a pena ver este filme, mas ele é muito mais. É a imagem dum país - quase todo ele é filmado em Lisboa - dum outro país bem diferente daquele que temos hoje apesar da crise. E é um alerta, para que em nome duma crise não justifiquemos soluções que depois se tornam monstruosidades que teremos dificuldade em afastar. Com um elenco de luxo, onde surgem nomes como Jeremy Irons, Christopher Lee, Charlotte Rampling, e portugueses como por exemplo, Nicolau Breyner entre outros, com uma bela fotografia e uma banda sonora etérea, o "Comboio Noturno para Lisboa" é um filme a merecer a nossa atenção. Uma atenção desperta, não só pelas imagens que se sucedem no ecrã, mas por outras, aquelas que estão subjacentes à nossa memória coletiva. Um filme a merecer a nossa atenção e interesse. Recomendável a todos os títulos. Também se encontra disponível em edição de DVD.

Tuesday, August 06, 2013

"As Cinquenta Sombras Mais Negras" - E. L. James

Depois de ter livro o primeiro volume desta saga que mão amiga me fez chegar, não descansei em prosseguir a leitura pelos outros dois volumes que completam esta estória. Aqui vos trago o segundo volume, onde se aprofunda o duelo psicológico entre Grey e Steele. Se no primeiro volume Steele é surpreendida por uma pessoa com uma mente estranha dentro daquilo que são os padrões convencionais, neste segundo volume parece haver uma interpenetração em que ambos vão cedendo um pouco até buscarem o seu verdadeiro equilíbrio. Grey vai abdicando aos poucos dos seus desejos bizarros e Steele vai entrando num mundo que a princípio ela considerava negro para ir aceitando alguns dos gostos do seu amante. Para utilizar uma certa linguagem poética, parece que Grey caminha do negro para o cinzento e Steele da luz para um certo crepúsculo e é nesse cinzento crepuscular que ambos se encontram, amadurecem a sua relação e vão descobrindo aquilo que de melhor o outro tem para oferecer. Esta saga que para muitos parece ser uma espécie de tratado sadomasoquista na realidade encerra um drama psicológico pungente que leva a que cada um, à sua maneira, vá descobrindo universos que pensavam inexistentes, embora estivessem bem presentes na mente de cada um deles.  A exemplo do primeiro volume, este livro deve ser lido com um espírito aberto tentado ler nas entrelinhas aquilo que não aparece evidenciado ou que aparece esbatido nas escaldantes cenas de sexo que são uma constante na obra. E se o primeiro volume aguçou o apetite para a voragem com que se lê o segundo, com certeza que, parto para o terceiro e último volume ainda com mais interesse, quanto mais não seja para ler o desfecho da obra. Contudo, repito, devemos fazer uma abordagem desta obra de espírito muito aberto, sem preconceitos e, sobretudo, analisando este duelo psicológico entre as duas personagens principais que, apesar de tudo, se vai estendendo a todas as outras que vão preenchendo os espaços e lhe dão ritmo de ação. E. L. James continua a surpreender-me pela profundidade a que leva a ação num dos romances, que já é considerado por muitos, como um dos mais importantes, mais ousados e polémicos deste século XXI que ainda vai no seu dealbar. Livro que recomendo, mas onde a necessidade de ler o anterior é determinante para se perceber todo o desenvolvimento do enredo. Para quem escreveu esta obra praticamente como sendo a primeira, tirando alguns ensaios sob a capa do pseudónimo, não deixa de surpreender a capacidade da autora para perceber e dissecar a complexa mente humana. A edição é da Lua de Papel.

Monday, August 05, 2013

Equivocos da democracia portuguesa - 274

Os últimos acontecimentos que têm envolvido o governo e têm trazido a público temas muito polémicos, como o caso da ministra das finanças e os "swaps", que também envolvem agora o seu secretário de Estado do tesouro, bem como, o caso do ministro dos negócios estrangeiros na polémica em torno do BPN e já antes no mal-estar face a parceiros estrangeiros como são os EUA, vêm colocar o dedo na ferida sobre a péssima imagem dos políticos e das instituições junto das populações. Como se dúvidas ainda subsistissem a última sondagem que o Expresso publicou no passado sábado é disso um bom exemplo. A descrença num governo gasto e sem ideias, no seu bom relacionamento futuro, uma certa desconfiança nos políticos, a falta de crença nas instituições, aparece tudo isto espelhado nessa sondagem. Os portugueses querem é ver esta crise ultrapassada, que terminem estes seus (nossos) dias de angústia, que se faça algo para que seja mais fácil seguir em frente e aligeirar a carga que pesa sobre os ombros de todos nós. Tudo o resto, mesmo aquele sentimento de clubite aguda sobre os partidos começa a esbater-se. Se o reclamar um certo consenso para que o país caminhe num determinado rumo é uma coisa importante, já a descrença generalizada nos políticos e nas instituições é algo mais grave. Por vezes, também nós já aqui fizemos eco desses sentimentos e os tentamos incorporar. Mas a democracia faz-se de partidos e aqui é que está a questão. Não existe democracia sem partidos. Embora não tenhamos bem a certeza de ainda vivermos em democracia, de facto, sentimos que o ir mais longe afeta os pilares do próprio regime. E isso começa a ser por demais evidente quando escutamos o que se passa nas ruas, nos anseios e desilusões das populações, na desesperança que nos vai corroendo lentamente. Este desencanto que vai abrindo portas - quiçá até justificando - outras saídas de que nos arrependeremos mais tarde. E chegados aqui, o que pensamos é que as instituições têm que se adaptar rapidamente a esta nova situação, caso contrário, será a rua a impor esse realinhamento. Não por uma qualquer revolução. Mas criando condições para que se justifiquem saídas messiânicas de que depois nos vamos arrepender. Já tivemos destas situações ao longo da nossa História, mais longínqua e mais recente, e não gostaríamos que, de novo, nos víssemos envolvidos em situações confrangedoras. As novas gerações poderão ter essa tentação porque apenas conhecem esses casos dos livros de História, mas as gerações mais velhas sabem o que é passar por regimes onde nem é admitido o dizer não. A História repete-se é usual dizer-se. Mas nem sempre do mesmo modo, acrescentamos nós.

Sunday, August 04, 2013

Uma triste estória que se repete

“Queria pedir, por favor, a quantos ocupam cargos de responsabilidade no âmbito económico, político ou social, a todos os homens e mulheres de boa vontade: sejamos GUARDIÕES da criação, dos ANIMAIS, do desígnio de Deus inscrito na natureza, guardiões do outro, do ambiente; não deixemos que sinais de destruição e morte acompanhem o caminho deste nosso mundo”. Estas palavras foram proferidas pelo Papa Francisco nas Jornadas da Juventude que tiveram lugar no Rio de Janeiro no Brasil na semana passada. E decidi hoje invocar as palavras do Papa porque pode ser que assim elas calem mais fundo no coração das pessoas. Neste tempo de Verão que por cá se vive, é terrível verificar a quantidade de animais abandonados. Basta palmilhar alguns quilómetros para termos a noção desta triste e terrível situação. Os animais continuam a ser considerados entre nós como objetos, brinquedos que se descartam quando deles já nos cansamos. Não percebemos que os estamos a conduzir a uma morte certa. Que eles são serem sensitivos que sofrem como nós, que têm dores, medos, angústias como qualquer ser humano. Mas as férias são mais importantes e por isso há que se livrarem destes pobres animais que foram a companhia desta gente e que logo comprarão no regresso um outro numa loja de renome que no próximo Verão terá o mesmo destino. Isto é o nosso país, a cultura das nossas gentes que não foi educada, nem educa os seus filhos, a respeitar estes seres nobres que, tal como nós, também têm direito à vida. Embora todos, ou muitos pelo menos, concordem com tudo isto que aqui escrevo, será que em situação idêntica não terão comportamento semelhante? Que fazem quando vêm um animal abandonado? Prestam-lhe socorro? Dão-lhe de comer e beber? Ou refugiam-se na estafada frase "não tenho condições senão..." e por aí se ficam com a consciência mais leve, embora duvide que fiquem com ela mais tranquila. Dizia Albert Schweitzer que foi Prémio Nobel da Paz que "quando o homem aprender a respeitar até o menor ser da criação, seja animal ou vegetal, ninguém precisará ensiná-lo a amar seus semelhantes". Talvez por isso, é que existem tantos conflitos, tantas guerras, tantas incompreensões. É que para além da soberba humana que destrói nações e aniquila povos, não sabemos como amar o nosso semelhante tão só porque ninguém nos soube ensinar a amar os animais e a natureza. Se não somos capazes de o fazer como poderemos respeitar-nos a nós mesmos?

Saturday, August 03, 2013

Equivocos da democracia portuguesa - 273

Terminamos a nossa última crónica antes de férias afirmando que as trapalhadas seguiam dentro de momentos! Quando o afirmamos não esperávamos que tal viesse a acontecer em tão curto espaço de tempo. Bastaram apenas alguns dias e elas aí estão de novo. Se Rui Manchete já era polémico pelo que dele pensam algumas instituições internacionais, logo tal foi esquecido porque apareceu mais enfatizado os seus negócios com o BPN! Mais um envolvido na trama de compra e venda de ações com elevadas mais-valias, reavivando o caso que envolveu Cavaco Silva e a sua filha, onde estas assumiram o extraordinário valor de 350.000 euros! Para Rui Manchete tudo parece normal, para os portugueses não. A inabilidade deste governo para lidar com estes casos é verdadeiramente extraordinária. Com certeza que o executivo poderia ter encontrado pessoas com um passado mais impoluto, pelo menos, não tão polémico. Todos sabemos que o caso BPN tem conotações extremas junto dos portugueses e ir buscar mais uma pessoa que por lá andou, até como administrador, é verdadeiramente polémico. A menos que o governo já não tenha ninguém a quem recorrer e que esteja disposto a dar a cara por este executivo. Mas as trapalhadas não ficaram por aí. Depois da polémica nomeação de Maria Luís Albuquerque para a pasta das finanças, que provocou muito desconforto mesmo junto de pessoas do PSD, - como por exemplo Rui Rio, que foi muito contundente sobre o caso -, agora a polémica amplia-se com o seu atual secretário de Estado do tesouro que ainda nem aqueceu o lugar. Joaquim Pais Jorge afinal, quando foi quadro superior do Citybank, andou por aí a tentar vender uns "swaps" até junto do governo de Sócrates - que os recusou - e que agora é a pessoa escolhida para gerir a sua anulação passando para o outro lado da barreira! A sua aparição no "briefing" de ontem do executivo em vez de esclarecer ainda toldou mais as mentes e a atrapalhação bem como o silêncio precipitado a que se remeteu criaram ainda mais questões do que aquelas que esclareceu. (Para além das graves falhas de memória que até dão jeito). Não deixa de ser estranha uma situação destas. Se já todos temos a ideia de que Portugal vive atolado num colossal pantanal, mas vemos que este cada vez vai mais longe e mais fundo. A fragilidade duma pasta tão importante nos tempos atuais como é a das finanças, está deveras fragilizada e descredibilizada. Se achamos estranho que o executivo se vá reunindo de pessoas tão polémicas e ligadas ao que de mais problemático existe entre nós, ainda ficamos mais perplexos pela aceitação do Presidente da República. Não há dúvidas nenhumas de que algo de muito estranho se passa neste executivo e que todos temos imensa dificuldade em digerir. Mas convenhamos que deste governo já esperamos tudo embora ainda nos continue a surpreender. Até as últimas afirmações de Passos Coelho são curiosas quando disse que "afinal depois da crise política que Portas criou, os juros aumentaram de imediato". Acrescentando que isso só vem provar que afinal ele sempre tinha um papel a representar contrariamente ao que a oposição dizia!!! Não faremos qualquer comentário sobre estas palavras porque elas falam por si. Agora que está a banhos na Manta Rota - sítio com nome bem adequado ao estado em que colocou este país - talvez os banhos lhe façam bem e regresse com mais alguma lucidez para bem da nação. Depois de tudo isto já nada dizemos sobre trapalhadas porque parece que semana após semana o governo há-de eleger uma talvez para se afirmar que existe e está em funções. E agora vamos a banhos na expectativa de que não sejamos interrompidos por mais umas trapalhadas que pelos visto, andam por aí!...

Thursday, August 01, 2013

Equivocos da democracia portuguesa - 272

Depois de termos assistido às interpelações de Vítor Gaspar e Maria Luís Albuquerque chegamos à conclusão de que para os deputados apenas interessa saber quem mentiu, se mentiu e porque mentiu. Gaspar lá foi dizendo que a atual ministra conhecia bem o caso, "até é especialista" afirmou Gaspar. Maria Luís diz que não sabia de nada. Neste jogo do empurra penso que o mais importante é esclarecer que tipo de operações são estas. Já o fizemos há algum tempo atrás, contudo, voltamos à questão para que as coisas fiquem mais transparentes. Como já afirmamos há tempos idos, os "swaps" são operações normais que qualquer estudante de economia conhece lá para o meio do seu curso, e nada tem a ver com a diabolização que se lhes quer dar. Qualquer economista que tenha trabalhado numa qualquer grande organização certamente já contratou este tipo de operações. Os "swaps" fazem parte dum grupo de produtos a que chamamos "derivados" e estes são apenas um desses produtos entre muitos outros. Os "swaps" são uma espécie de contratação de uma taxa de juro e só são feitos depois de haver um financiamento prévio. Estas operações têm mais dum século e não são tão exóticas assim. E quando se falam de "swaps tóxicos" é bom dizer que os "swaps" podem ser tóxicos ou não e a fronteira que os separa é muito ténue, como podem ser tóxicos simples depósitos a prazo, veja-se os casos do BPN e do BPP. Mas vamos explicar então o que são estas operações recorrendo a um simples exemplo comezinho. Vamos supor que contratamos um determinado empréstimo para comprar casa e depois negociamos um "swap" para fazer face ao eventual aumento da taxa de juro. Se a taxa aumenta não pagamos mais por isso, mas se ela diminui então pagamos o mesmo que está contratado - que já é um prejuízo - ainda agravado com um "fee" de comissão bancária. (É por esta razão que existe a polémica da contratação de "swaps" depois de 2009 quando as taxas de juro já estavam a baixar por intervenção do BCE). O inconveniente está precisamente aqui. Quando o Estado ganhou pelo aumento das taxas de juro o problema não se colocou. Este só se tornou relevante quando a situação se inverteu. Ou seja, aquilo que era bom passou a ser mau. Quem o fez passou de "bestial" a "besta" apenas e só pela variação das taxas de juro! O problema está no "mark to market", isto é, no valor que a taxa adquire num determinado momento. Este tipo de operações começaram a rarear não fruto duma estratégia diferente da tutela, mas tão só, porque com o aumento do risco os bancos queriam reduzir a sua exposição o mais possível, desincentivando a contratação deste tipo de operações. Claro que estas podiam ser contratadas numa qualquer empresa de "vau de escada", a que se costuma chamar operações OTC (over the counter), mas com as empresas públicas isto nunca seria de efetivar. Depois desta explicação muito sumária para que todos entendam resta a pergunta, afinal porque algumas empresas públicas contrataram "swaps"? A resposta é simples. Porque estas operações permitiam às empresas financiarem-se fora do perímetro orçamental, numa altura em que o OE já não tinha dotação para elas, o ministério das finanças também não e o país estava a sofrer congestionamentos mesmo a nível internacional para o seu financiamento. Daí talvez a justificação do despacho polémico de Costa Pina - o anterior secretário de Estado do tesouro - de dar abertura às empresas para recorrerem a este tipo de operações, alertando para que evitassem dar garantias reais! Independentemente das polémicas de quem mentiu, penso que é mais importante para o público em geral perceber este tipo de operações para melhor fazerem o seu julgamento. Pensamos que esta muito resumida e singela explicação poderá contribuir para isso.