E depois do corte de "rating" da Moody's parece que o mundo se revoltou!!! Heiner Flassbeck, o ex-secretário das finanças alemão, que é o director da Agência das Nações Unidas para o Comércio Mundial e Desenvolvimento (UNCTAD) veio exigir a extinção das empresas de "rating", segundo o jornal alemão Berliner Zeitung. Afirmando, e muito bem, que estas agências de notação estão a retirar a capacidade de avaliação da "troika". O mesmo foi dito por Thomas Straubhaar, presidente do Instituto de Economia Mundial de Hamburgo, e citado pelo jornal Rhein-Neckar-Zeitung. Por cá, as coisas não se fizeram por menos. Desde logo, Mira Amaral, que considerou "infeliz e terrorista" a atitude da Moody's. Bem como os banqueiros que, em coro como é habitual, vieram carpir as suas desgraças mais do que as desventuras do país. Mas isso não faz esquecer que duas semanas após a tomada do poder, o governo de Passos Coelho atirou Portugal para o lixo. Esta é a nota mais baixa que alguma vez Portugal teve. Esta situação pode impedir - e de certo vai impedir - que algumas entidades que compravam dívida portuguesa o venham a fazer de novo, porque ficam impedidas, até estatutariamente, de o fazer. Mas vem-nos à memória um clamor que a oposição - hoje governo - dizia do anterior de Sócrates. Afinal este é um governo maioritário, mais credível (!?), mas ao que se vê não chega. E não chega porque a razão desta situação não está em Portugal e no seu governo, mas numa luta bem mais alargada, entre os EUA e a Europa, entre o dólar e o euro. Durão Barroso - o Mr. Nobody como é conhecido nos corredores de Bruxelas, dado o peso fraco que tem Portugal nos organismos internacionais - também veio condenar a acção, e bem, porque esta é uma má notícia não só para Portugal, a Grécia e a Espanha mas, sobretudo, para a zona euro. Ao que parece Bruxelas viu isso, mas só agora, muito tardiamente. É que o abaixamento do "rating" justificado pela não capacidade de atingir os objectivos, implica que estes fiquem mais distantes e, por sua vez, mais difíceis de atingir. Isto - para usar uma expressão popular - é uma pescadinha de rabo na boca. Até Cavaco veio a terreiro condenar tal acção, o mesmo Cavaco, que à uns meses atrás, dizia que "se deviam respeitar as agências de notação financeira e que se as combate-se-mos seria ainda pior", logo acompanhado em coro por uns tantos acólitos que o seguem fielmente. Mas afinal repetimos, o mal não estava em Sócrates e no seu governo. Foi fácil atacar o governo anterior, tentando mostrar que se o PM de então saísse as coisas mudariam para melhor com um simples truque de mágica. Não é assim, não foi assim, não vai ser assim. Já, por diversas vezes, o tinhamos afirmado neste espaço, e aí está a resposta. Como afirmou ontem o Prof. Dr. José Reis da Universidade de Coimbra - o mesmo que apresentou uma queixa contra as empresas de "rating" no passado recente - "o governo ultra-liberal de Passos Coelho levou em bandeja de prata o sacrifício dos portugueses e levou com a porta na cara ou, para utilizar a expressão do PM, um murro no estômago" (sic). Porque, reafirmamos, o problema é mais complexo do que pode parecer. A Europa foi minada por um "cavalo de Tróia" que a desconstruiu, como vemos, e que nos conduziu a isto. Nesta Europa em crise - a que as políticas ultra-liberais conduziram - leva a que o euro sobrevalorize face ao dólar numa Europa fragilizada e com cada vez menos capacidade de reacção. É preciso ter em conta que as agências de notação financeira manipulam mercados, elas próprias, encerradas em conflitualidades de interesses. O "downgrade" que Portugal sofreu ontem, não é mais do que uma etapa da guerra entre o dólar e o euro. E agora, não chega que deputados como Guilherme Silva (PSD), perante esta situação desastrosa em que Portugal caiu, vir dizer que o anterior governo é que foi o culpado. Para além da ignorância - em que não acreditamos - fica uma grande dose de má fé - essa sim verdadeira - de quem sempre disse, em sintonia com o seu partido, que não iria utilizar o argumento do governo anterior para justificar as dificuldades da governação actual. O mesmo deputado que veio elogiar o fim das "golden shares" assumidas anteontem pelo executivo. Este deputado será que ainda não percebeu que com esta decisão o Estado fica com um punhado de acções que valem zero? Não teria sido melhor o Estado tê-las vendido, e com isso arrecadado algum dinheiro, e depois abdicar das "golden shares"? O desnorte deste governo - que apenas tem duas semanas de vida - é evidente, com decisões avulsas onde não se vislumbra qualquer orientação. Estes senhores que tudo fizeram para chegar ao pote, talvez já estejam arrependidos, embora seja evidente o coro de apoio, nomeadamente, por aqueles que tudo fizeram para fazer cair o governo anterior, mergulhando o país numa crise enorme, donde não se vê a saída, desde logo, com Cavaco Silva à cabeça. Não basta vir dizer agora que é injusto que a Moody's tenha baixado o "rating" da República, quando antes proclamava - de cima da sua cátedra - que se deviam respeitar as decisões e não atacar estas empresas. A sem-vergonhice continua a fazer carreira entre nós, e Portugal e os portugueses é que vão pagar a factura. Os mesmo portugueses que acharam que Passos Coelho era a solução para o país, e que hoje se vê que, talvez, seja o problema. É preciso não esquecer que, apenas duas semanas após a tomada de poder, com um programa de governo mais "troikista" do que o da "troika", mesmo assim, Passos Coelho atirou o país para o lixo. Ele ainda não percebeu que não basta encarnar o papel do "bom aluno", isso não chega e o resultado é bem evidente disso mesmo. O problema é mais abrangente, é um problema da Europa e que só a Europa no seu conjunto será capaz de resolver. Talvez esta atitude desta agência tenha algo por trás mais importante como o de desvalorizar para melhor se ajustar ao plano de privatizações que por aí anda. Para sermos mais claros, esta atitude assemelha-se mais a uma desvalorização de activos do Estado para que eles sejam alienados ao desbarato. Não esqueçamos que estas agências representam interesses privados de investidores que vivem neste mercado especulativo. Por isso, já por diversas vezes temos defendido neste espaço que, a UE deveria emitir "eurobonds" - de que tanto se fala e que nada se faz - e vir a obter empréstimos nos mercados internacionais que depois facilitaria aos países em dificuldade. Mas isto, é uma posição ideológica que a UE não quer dar, porque aponta para uma Europa mais solidária, uma Europa federalista, tese que vai ao arrepio da ideologia ultra-liberal que hoje a determina. Mas os senhores de Bruxelas também devem pensar que, no actual contexto, existem meia dúzia de países - Irlanda, Grécia, Portugal, Espanha, Itália, Bélgica - que não podem aguentar a situação da zona euro. Ou saem do euro - e isso terá graves consequências para a própria UE e para o euro, já para não falar nos próprios países - ou, a manterem-se, tem que existir um mecanismo de compensação - com menos exigência - para proteger estes países. É insustentável que se mantenha um euro forte com economias fracas, nomeadamente, as dos países que atrás referimos. Esta é, a nosso ver, uma visão estratégica a seguir, e não a que está a ser seguida e que cremos ser errada, bem como, de políticas económicas da UE que tem a ver com a ideologia. Lá, como cá, a ideologia comanda este processo. E os portugueses que pensavam que iam resolver os seus problemas com as eleições vêem-nos agora agravados, numa torrente de desesperança que se vai instalando. Não era o governo anterior que era mau, o que era necessário é que tivesse existido solidariedade - que não houve -, unanimidade como hoje se vê, para levar o país em frente. E se as outras duas agências - Standard & Poor's e Fitch - seguirem o mesmo caminho da Moody's, então Portugal está definitivamente no lixo, duas semanas após Passos Coelho ter chegado ao ambicionado pote...