Turma Formadores Certform 66

Saturday, November 30, 2013

Nos 78 anos da morte de Fernando Pessoa

Fernando António Nogueira Pessoa nasceu em Lisboa a 13 de Junho de 1888 e viria a falecer também em Lisboa a 30 de Novembro de 1935. Fernando Pessoa, foi poeta, filósofo e escritor. É o mais universal poeta português. Por ter sido educado na África do Sul, numa escola católica irlandesa, chegou a ter maior familiaridade com o idioma inglês do que com o português e daí escrever os seus primeiros poemas nesse idioma. O crítico literário Harold Bloom considerou Pessoa como o "Whitman renascido", e incluiu-o no seu cânone entre os 26 melhores escritores da civilização ocidental, não apenas da literatura portuguesa mas também da inglesa. Das quatro obras que publicou em vida, três são na língua inglesa. Fernando Pessoa traduziu várias obras em inglês (e.g., de Shakespeare e Edgar Allen Poe) para o português, e obras portuguesas (nomeadamente de António Botto e Almada Negreiros) para o inglês. Enquanto poeta, escreveu sob múltiplas personalidades – os célebres heterónimos, como foram os de Ricardo Reis, Álvaro de Campos e Alberto Caeiro –, sendo estes últimos objeto da maior parte dos estudos sobre a sua vida e obra. Robert Hass, poeta americano, diz: "outros modernistas como Yeats, Pound, Elliot inventaram máscaras pelas quais falavam ocasionalmente... Pessoa inventava poetas inteiros." Pessoa nunca foi reconhecido em vida pelos seus pares nem pelo país. Esta sina portuguesa de não reconhecermos os nossos maiores levou a que mesmo no anterior regime ele fosse marginalizado - apesar de ser um nacionalista convicto - como um mero funcionário público viciado em álcool. Foi preciso o Brasil - mais uma vez o país irmão - a descobrir Pessoa para que ele se tornasse naquilo que é hoje. Nos nossos dias falar de Pessoa, gostar de Pessoa é uma moda que dá foros de cultura a qualquer um, embora muito poucos saibam do que falam ou até o tenham lido. Hoje completam-se 78 anos sobre a morte deste grande homem de letras da língua portuguesa. Para além dos congressos que por aí existem para celebrar a data, das exposições, do muito que se diz acerca de Pessoa, melhor será lê-lo. Essa será seguramente a maior homenagem que lhe podemos fazer. A sua obra maior é seguramente a "Mensagem", mas muitas outras existem com o nome dos seus heterónimos. Não esquecendo os "Poemas Ingleses" da sua juventude em Durbam que merecem uma leitura atenta, não só pela sua beleza, mas também, porque neles se indiciava já aquilo que Pessoa viria a representar para as letras portuguesas.

Friday, November 29, 2013

Equivocos da democracia portuguesa - 305

Esta semana que está prestes a terminar foi fértil em acontecimentos que mostram a degradação a que o nosso país chegou. Depois da "invasão" que a polícia fez das escadarias da AR - o termo é aquele que foi gritado na manifestação - em que mostraram bem a quem estamos a confiar a nossa segurança, as coisas não pararam por aí. Depois desta "invasão" dos polícias, os sindicatos não quiseram ficar atrás, e vai daí, também "invadiram" quatro ministérios. Não houve reação da polícia que por lá estava. Será porque foram apanhados de surpresa, ou tinham a consciência pesada e acharam que os sindicatos tinham tanto direito como eles para invadir o que quer que seja? Na sequência desta "invasão", os ministros talvez assustados fizeram o impensável que foi, perante a exigência dos sindicatos de marcarem reuniões, e elas foram marcadas logo na hora, sem mais demoras. Erro crasso. Que marcassem as reuniões achamos que era correto, marcá-las na hora e sobre pressão, dá a ideia dum Estado acossado, com medo, o que leva ao desrespeito das próprias instituições. Não sabemos se por esta sequência de acontecimentos ou não, o PR, sempre tão defensor do governo, acabou por mandar o diploma do corte das pensões para o TC, ou então porque se viu atingido por ele. Qualquer uma das respostas é sempre possível no estado de anarquia em que Portugal está a mergulhar. Mas as coisas não ficariam por aqui. Ontem mesmo, ou melhor esta noite e madrugada, a polícia tão determinada em fazer "invasões" quando se trata dos seus direitos, acabou por tratar duma forma bem pouco cordial, os trabalhadores do CTT que estão em greve a lutar, - eles também -, pelos seus direitos. A esta intervenção musculada não escaparam nem trabalhadores, sindicalistas e até deputados que, como se sabe, gozam, de imunidade parlamentar. O acontecimento que, ao que sabemos, será hoje levado à AR. É neste estado de aparente anarquia que Portugal está a viver este dias de ira. Depois das mentiras que o ministro da defesa andou a contar aos trabalhadores dos Estaleiros de Viana, acabou por colocar no desemprego mais de 600 e estes só souberam disso pela comunicação social e, embora ontem tenha sido recebida a CT dos Estaleiros de Viana, isso não corrige de todo a "gaffe" - mais uma - deste governo. Este desnorte que o governo mostra - e dele já falamos por diversas vezes - diz bem do estado de desgraça em que o executivo se encontra. As pessoas precisam de âncoras a que se agarrar, âncoras que não lhe foram dadas, ou melhor, aparecem nos partidos da oposição que, dada a sua desfragmentação, não têm ainda condições de ter uma maioria absoluta para contrariar esta política desastrosa que nos (des)governa. Este governo, que apenas cumpre ordens de Merkel, nunca foi capaz de defender os interesses de Portugal como fez a Irlanda em devido tempo. E o PR não deixa de ser a capa que vai abrigando o executivo. Talvez por consciência pesada também. Porque foi Cavaco Silva - para aqueles que já esqueceram - que, deslumbrado com a Europa e com o dinheiro a jorros que entrava no país, convenceu os pescadores a destruírem os seus barcos a troco de 10 mil contos (ainda não havia o euro), o mesmo que fez com os agricultores. E vai daí o peixe que comemos é quase todo vindo do estrangeiro. Agora apelam em sinal contrário mas é um erro grave. (Ao contrário da Espanha que não se deixou levar pelo canto da sereia). Isso já era afirmado nas Faculdades de Economia deste país à época, mas ninguém quis ouvir. O "El Dorado" estava ali à mão como o poderíamos deixar escapar? E ainda por cima, como era incentivado pelo homem que se autodenominava como sendo aquele que "nunca se enganava e dificilmente tinha dúvidas" as populações não desconfiaram. Agora aí está a realidade a demonstrar o grande equívoco político que o atual PR liderou. Ele também a seu tempo, foi um pau mandado de Bruxelas, como o é este governo. Será uma maldição do PSD? De tudo isto, reafirmamos aquilo que já atrás dissemos, Portugal está a viver um momento de anarquia que favorecerá a curto prazo o aparecimento dum qualquer "salvador" com todas as consequências que daí advirão. Porque as sociedades rejeitam o vazio, e é no vazio que estamos a viver. E quando se vê uma reunião das esquerdas na Aula Magna, quando assistimos à homenagem a Ramalho Eanes, não podemos deixar de sentir o que anda no ar. Keynes dizia que no médio/longo prazo "estamos todos mortos", e não era de morte física que ele falava, mas sim que o capitalismo ia-se regenerando após cada crise, mas haveria um momento em que tal não iria acontecer. Será que estamos a chegar a esse momento? Será que um dia Marx ainda pode vir a ter razão?

Monday, November 25, 2013

Nos 168 anos do nascimento de Eça de Queiroz

Comemoram-se hoje os 168 anos do nascimento de Eça de Queiroz. José Maria de Eça de Queiroz nasceu na Póvoa de Varzim neste dia 25 de Novembro de 1845 e viria a falecer em Paris a 16 de Agosto de 1900. Foi um dos mais notáveis escritores da língua portuguesa com uma imensa obra de grande qualidade e traduzida em várias línguas. Entre muitas das suas obras, quero aqui salientar os romances "Os Maias", "O Crime do Padre Amaro" e "A Cidade e as Serras", por serem porventura os mais conhecidos e concomitantemente os mais lidos. "O Crime do Padre Amaro" é considerado um dos melhores romances realistas portugueses do século XIX, com uma passagem a cinema que muita visibilidade lhe trouxe. Nestes dias de desencanto que são aqueles que vivemos, queria salientar um romance e um opúsculo. O romance é "Os Maias" que levou oito anos a ser escrito tendo sido concluído num período difícil - mais um - da economia portuguesa. Estávamos numa situação idêntica à que hoje vivemos, em que Portugal teve que contrair um empréstimo para solver as suas contas. A curiosidade é que a liquidação do empréstimo demorou 99 anos a ser feita, tendo terminado em 2001! Como não havia "troika" a austeridade foi mais branda, nem ouve sequer que se falar de reestruturação da dívida que era um conceito que na época não era conhecido. O opúsculo é "O 1º de Maio". Este pequeno opúsculo é difícil de encontrar mas acho que deveriam tentar obtê-lo pela curiosidade da situação que muito se parece com estes dias de descontentamento que vivemos atualmente. Na altura em que o escreveu, Eça de Queiroz era cônsul em Paris, e vivenciava uma situação bem triste da sociedade francesa da época. Em determinada altura escreve Eça sobre uma condessa que passava na sua carruagem e não percebi as necessidades do povo, ela teria dito, "se têm fome porque não comem brioche?" Como se ajusta este afastamento da realidade com aquele que vemos hoje entre nós, a coberto duma imposição de credores externos que justificam tudo até aquilo que são opções ideológicas dos governantes do momento. Por tudo isto, julgo que é necessário redescobrir a obra de Eça de Queiroz que, apesar do tempo volvido, tem uma atualidade que nos surpreende. Um dos "vencidos da vida" para citar o nome dum grupo a que pertenciam, para além de Eça de Queiroz, outros iminentes escritores da época. Esta celebração poderá ser o começo para ler, ou reler, a obra ímpar de Eça de Queiroz, uma das mais notáveis da literatura portuguesa.

Saturday, November 23, 2013

Equivocos da democracia portuguesa - 304

Anteontem, tivemos a noite da ira com os polícias a manifestarem-se pelas condições a que estão sujeitos. Polícias que por terem a condições que têm de ser uma força de segurança não podem deixar de ter o direito à ira quando os seus interesses são arrasados como qualquer outro cidadão. Quanto a isto pensamos que estamos todos de acordo. Já quanto à invasão - como foi gritado junto à Assembleia da República e depois de terem subido a escadaria - aí já as coisas mudam radicalmente de figura. Os cidadãos sem farda não deixam de continuar ligados às instituições a que pertencem e ninguém ali ignorava a condição de membro duma força de segurança. A subida das escadas, - ou melhor, "conquista degrau a degrau" como um dos membros que se manifestavam afirmou a um canal de televisão - já não é coisa de pouca monta. Primeiro, porque não respeitaram a lei, eles que deviam mais do que ninguém serem os seus guardiões; depois, porque abriram um perigoso precedente em manifestações futuras. Com que direito um grupo de polícias vai impedir - muitas vezes de forma violenta - que outros cidadãos subam as escadas do Parlamento, quando eles o fizeram e os seus colegas de serviço permitiram? (Será que agora ainda terão coragem para ter atitudes como a da foto anexa que correu mundo e envergonhou Portugal?) Um precedente grave que levará a que toda a gente esteja atenta ao que vai acontecer numa próxima manifestação nesse local. E vindo de membros das forças de segurança é, no mínimo, lamentável. O governo não poderia ficar indiferente, e chamou logo o chefe da polícia e dessa conversa, este veio a pôr o lugar à disposição, coisa que o governo aproveitou. O governo não poderia fazer diferente, o chefe da polícia, talvez, também não, embora se fique com a sensação que se tinha que encontrar um bode expiatório e o chefe da polícia ajustou-se a essa situação. Mas o mais insólito ainda estava para vir e que só foi conhecido ao final do dia. Foi nomeado para o cargo deixado vago, o polícia que chefiava o grupo de operações especiais, que afinal foi o que permitiu que os seus colegas subissem a escadaria! E aqui é que as coisas não batem certo. Se o chefe da PSP demissionário teve alguma responsabilidade, o novo chefe da PSP não a tem menor. E não basta dizer que foi por estratégia que isso se passou assim, pelo facto de se pensar que havia elementos armados entre os manifestantes. Aqui duas questões se colocam: se foi por estratégia, então pode ser que em nome dessa mesma estratégia se faça o mesmo no futuro; depois se se pensava que haviam elementos armados entre os manifestantes, aqui a questão ainda é mais grave, primeiro porque se deviam neutralizar esses elementos armados, ou tentar pelo menos neutralizá-los; depois não é comum os manifestantes irem armados para as manifestações, mesmo que isso diga respeito a membros de forças de segurança. Porque de futuro, basta alguém lançar o boato de que existem elementos armados no meio duma qualquer manifestação para logo, em nome da estratégia, a polícia recuar e dar a escadaria aos manifestantes. As afirmações que alguns elementos que se manifestavam são por isso demasiado graves. Na ânsia do seu minuto de fama criaram uma situação muito complexa, talvez até, sem terem a noção disso mesmo. Mas para além disto tudo, o que fica é a nomeação do novo comandante da polícia. Mas vindo dum ministro, que enquanto líder parlamentar do PSD, afirmava que a crise se resolvia em dois meses quando o PSD fosse governo, já ninguém espera nada. Depois de tanto disparate dito acabou ministro. Parece que esta nomeação está em linha - para usar uma expressão cara ao governo - com o ministro da tutela. E isso já todos perceberam.

Friday, November 22, 2013

Equivocos da democracia portuguesa - 303

Ontem foi um dia extraordinário, cheio de coisas extraordinárias, numa democracia doente que a cada dia que passa dá sinais de erosão. Desde logo, a manifestação das forças de segurança na Assembleia da República. A manifestação das forças de segurança é de todo legítima num país esmagado por uma carga de austeridade sem precedentes. E eles, os polícias, também têm famílias que têm que sustentar, casas ou rendas a pagar, contas que todos os meses se renovam para liquidar. A manifestação é por isso legítima dentro da situação excecional que o país está a viver. Já o mesmo não diríamos do rompimento do cordão policial. É certo que ouve alguma tensão mas, felizmente, tudo decorreu com civismo. (Para além duns petardos que foram rebentados, o que não deixa de ser irónico numa manifestação de forças de segurança!) . Mas perguntamos, será que existiria o mesmo civismo se fosse a manifestação duma outra qualquer classe profissional? É que o rompimento do cordão policial (dos polícias que estavam em serviço) pela parte dos manifestantes (os polícias que se estavam a manifestar) é um precedente muito grave. Com que legitimidade é que a polícia fica quando perante uma qualquer outra manifestação tentar subir as escadas e receber uma carga policial? Será que os polícias recuarão para junto da Assembleia da República como o fizeram ontem? Ou será que utilizarão a força, como já vimos por diversas vezes, até duma forma desmesurada e desproporcional, que serviu para nos envergonhar na Europa e no mundo por onde as imagens correram? Será que a partir de agora, os jardins e a escadaria do Parlamento serão terreno para os manifestantes ou não? Ou será que só quando são as forças de segurança a manifestarem-se é que tal é legítimo? "Foi criado um precedente muito grave" afirmava ontem Morais Sarmento no seu comentário na RTP1 em simultâneo com o que estava a acontecer no Parlamento. "Sinais excecionais e extraordinários de extrema gravidade" como diria Mário Crespo na SIC Notícias. Estes são sinais de que a democracia está a apodrecer por dentro, no seu seio, sem que ninguém aparentemente pareça notar. Exceção feita a alguns mais atentos e combativos, com provas dadas, desde logo, como Mário Soares que ontem pediu a demissão do Presidente da República e do governo. De facto, estão a criar-se as condições para que o desgaste das populações, a descrença, a desesperança se vão instalando na sociedade e levem à aparição dum qualquer "caudillo" à la carte. Convidamos a que leiam o que se escrevia nas vésperas do 28 de Maio de 1926, - que daria lugar à instauração da ditadura do Estado Novo -, e verão a similitude do que se está a passar nos nossos dias. A situação está a tornar-se perigosa, demasiado perigosa, para que olhemos para o lado. Este grupo de pessoas que hoje nos (des)governa está a levar Portugal para o abismo criando as condições duma saída musculada para "arrumar a casa" como costumam dizer os candidatos a ditadores que não faltarão por aí. Todos sabemos como as ditaduras começam, o que não sabemos é como e, sobretudo, quando acabam. É preciso que tenhamos consciência do perigo em que estamos, mas também temos que saber que existem outras saídas para esta situação, bem para além daquelas que este grupo de pessoas nos vende diariamente. O caminho pode ser outro. Todos o sabemos. E não basta utilizar as pressões sobre o Tribunal Constitucional para justificar o falhanço. Esta política falhou. Este governo falhou. (Mais uma vez apelamos a que leiam com atenção a acarta de demissão de Vítor Gaspar). Este Presidente da República falhou por querer manter o seu grupo no poder. É necessária uma mudança. Uma mudança urgente, enquanto é tempo.

No centenário de Benjamin Britten

Ontem, a quando do aniversário do falecimento de Henry Purcell falei da influência que este compositor inglês teve sobre outro, bem mais nosso contemporâneo, Benjamin Britten. E hoje nada melhor do que celebrar o centenário do nascimento deste mesmo compositor. Edward Benjamin Britten, OM, Barão Britten de Aldeburgh, foi compositor, maestro, violetista e pianista britânico. Nasceu a 22 de Novembro de 1913 - cujo centenário celebramos hoje - em Lowstoft no Reino Unido e viria a falecer a 4 de Dezembro de 1976 também no Reino Unido mas em Aldeburgh. Das suas obras mais significativas, ressalto as obras partilhadas por composições, óperas e temas religiosos: Peter Grimes, War Requiem, The Young Person's Guide to the Orchestra, Billy Budd, The Turn of Screw, Albert Herring, A Midsummer Night's Dream, A Ceremony of Carols, Simple Symphony, Gloriana, The Rape of Lucretia, Death in Venice, Curlwu River, Owen Wingrave, Paull Bunyan, The Little Sweep, Winter Words, Variations on a Theme of Frank Bridge, Spring Symphony, Sinfonia da Requiem, Serenade for Tenor, Horn and Strings, Les Illuminations, Six Metamorphoses after Ovid, Friday Afternoons, The Prince of the Pagodas, Canticle III: Still falls the rain, Cello Symphony, Cello suites, Diversions for Piano Left Hand and Orchestra, The Prodigal Song, Piano Concerto, A Birthday Hansel, The Burning Fiery Furnace, Nocturne, Missa Brevis, Cantata Academica, The Company of Heaven, The Miller of Dee, The Foggy, Foggy Dew, Cello Sonata, Nocturnal After John Dowland, Variations on an Elizabethan Theme, Prelude and Fugue on a Theme of Vittoria, The False Knight upon the road, 8 Folk Song Arrangements, The Lincolnshire Poacher. A sua educação processou-se no Royal College of Music no período de 1930 a 1933 e na Escola Gresham. Como se vê, Britten foi um prolixo compositor que percorreu muitos géneros de música dentro do mundo da música dita clássica. Contudo, e para mim, a sua obra maior foi o "War Requiem". Apesar disso, trago-vos hoje uma outra peça que podem ouvir aqui https://www.youtube.com/watch?v=4vbvhU22uAM e trata-se do The Young Person's Guide to the Orchestra. O porquê de o trazer aqui, é que este tema é baseado num outro do compositor que ele mais apreciava de que ontem falamos, Henry Purcell. Para os que não conhecem Britten, penso que esta celebração também é - como foi o caso ontem de Purcell - um bom pretexto para descobrir esta fantástica música dum compositor que é considerado um dos maiores do século XX. Obrigatoriamente a não perder.

Thursday, November 21, 2013

No aniversário do falecimento de Henry Purcell

Henry Purcell  nasceu em Londres a 10 de Setembro de 1659 e viria a falecer a 21 de Novembro de 1695, celebrando-se hoje os 318 anos do seu falecimento.  Foi um brilhante compositor inglês que apesar de uma vida relativamente breve, permanece um dos mais importantes compositores da velha Albion. A sua facilidade em compôr para todos os géneros e públicos, a sua popularidade na corte durante reinados de três monarcas e a sua vasta produção de odes cortesãs, música cénica, anthems' sacros, canções e catches' seculares, música de câmara e "voluntaries" para órgão são uma prova clara de seu prodigioso talento. Ficou célebre por algumas das suas obras, desde logo, as óperas "Dido and Aeneas", "The Tempest" - baseada na obra homónima de William Shakespeare - e "The Fairy Queen". São famosas as suas lições para cravo, as suas odes, hinos, composições religiosas e bem assim, sonatas e fantasias para viola. É precisamente com a abertura de "The Fairy Queen" que gostaria de vos deixar aqui um registo que podem escutar em https://www.youtube.com/watch?v=ipCpNvnkQQw . Grande compositor do barroco inglês e figura cimeira da música do seu tempo, continua a influenciar compositores dos nossos dias, donde destaco o nome de Benjamin Britten, o célebre autor do "War Requiem". Para os que não conhecem penso ser esta celebração da sua morte um bom pretexto para o descobrirem.

Wednesday, November 20, 2013

O estranho vírus do futebol

Depois da ressaca da noite de ontem em que Portugal se apurou para o Mundial de 2014, gostaria de deixar algumas reflexões sobre aquilo que chamo de vírus do futebol. (Isto sem que me regozije com o apuramento para o mundial do Brasil que não está aqui em causa). Não vos vou falar de futebol "tout court", estejam descansados, mas daquilo que à sua volta se passa e que transforma pacatos cidadãos educados em autênticos "hooligans". A quando da primeira mão do "play-off" disputado no estádio da Luz, assistimos a que pacatos cidadãos suecos, gente dum nível cultural bem superior ao nosso, a fazerem uma festa enorme nas esplanadas de Lisboa, mas nunca ultrapassando o comportamento civilizado e educado que é timbre dos nórdicos. Mas depois de entrarem no estádio, tudo muda e não para melhor. Ontem assistimos ao impensável num país com o grau de educação da Suécia, - que conheço bem -, que foi os apupos bem audíveis a quando do hino português. Para além do desporto, há uma educação que urge preservar o que não foi o caso. Afinal que estranho vírus é este que transforma as pessoas? Um jogo de futebol não passa disso mesmo. O país não fica melhor nem pior depois dele, a crise continua, o desemprego não diminui, a dívida também não. Então por quê tudo isto? Tenho alguns amigos suecos que vivem em Portugal a quem coloquei esta questão e à qual não me souberam responder. Porque a Suécia não é a Inglaterra com toda uma tradição de arruaça que percorre os estádios do mundo. Os países nórdicos, queiramos ou não, são bastante diferentes. E então que dizer do que se passa intramuros. Todas as semanas vemos o que se diz e escreve depois de mais uma jornada, sobretudo, em torno dos clubes mais significativos. E porque são mais importantes também arrastam mais paixões. Assistimos a que pessoas educadas de fino trato até, publiquem nas redes sociais os comentários e as frases mais sórdidas, dignas de qualquer rufia saído do West End, que muito devem envergonhar os seus progenitores. A menos que estes não tenham cuidado da educação dos filhos duma forma convincente na altura própria. E isto espanta-me porque o futebol já foi um desporto de cavalheiros, como hoje é o ténis, por exemplo. É certo que já muito tempo passou, que muita coisa no mundo mudou, mas a pergunta mantém-se, afinal que raio de vírus é este que se instalou no futebol? Para mim a resposta é clara porque não sou um seguidor deste desporto. Mas a questão deve ser colocada essencialmente a todos aqueles que frequentam os estádios ou, duma forma ou de outra, se envolvem no fenómeno do futebol. O desporto que deveria ser uma escola de virtudes, afinal passa a ser uma escola de vilanagem do mais baixo quilate. É certo que os seus protagonistas, por mais dinheiro que ganhem, não conseguem esconder a sua fraca condição. Gente normalmente simples, de educação débil, gente que na maioria dos casos saiu das ruas diretamente para os estádios. Mas aqui os clubes têm um trabalho a fazer. E alguns até o tentam. Vimos que os jogadores quando são entrevistados dizem sempre as mesmas frases com os mesmos tiques que aprendem uns com os outros. Mas se os clubes, apesar de tudo, ainda fazem um trabalho junto dos seus atletas, já dos seus adeptos a coisa é diferente. Essa aprendizagem, essa educação do modo de comportamento, aprende-se em casa ou não se aprende. O mais grave é que muitos até aprenderam, mas quando confrontados com um simples jogo de futebol, esquecem todos os valores que lhes foram transmitidos. E a pergunta continua sem resposta. Afinal que vírus é este que atinge o futebol - que até é considerado o desporto rei! - um pouco por todo o mundo?

Sunday, November 17, 2013

O fim dum sonho ou a "implosão" europeia?

Li com atenção este artigo publicado no Jornal i que o publicou na passada sexta-feira dia 15. Vinha assinado por Ana Sá Lopes. Nem sempre me revejo nas análise desta jornalista mas este artigo põe o dedo na ferida. Um artigo que qualquer um de nós, atentos ao que se passa à nossa volta, defensores duma Europa forte, unida e solidária - afinal os pilares da sua criação - vêm que esta se está a desvirtuar dia a dia, melhor dizendo, até parece que está a implodir. Isso preocupa-me, deve preocupar-nos a todos. Algo vai mal. Algo está, definitivamente, muito mal. Deixo aqui o artigo para que o leiam, analisem e reflitam sobre ele. Diz assim: "Sociais-democratas e democratas-cristãos morreram e o velório está a ser prolongado. A Europa passou meses em suspenso por causa das eleições alemãs. O sonho de que as "coisas" iriam mudar atravessou as fronteiras do Sul fustigado. Se calhar a senhora Merkel não se mexia porque tinha uma campanha eleitoral para ganhar - e um novo partido eurocéptico para enfrentar. Mas as "coisas" iam mudar, tinham de mudar. Afinal o SPD tinha feito metade da campanha a criticar o excesso de austeridade que Merkel tinha imposto ao Sul. A "grande coligação" ainda não está fechada, mas os dois partidos já estão de acordo sobre a política europeia. E o que nos diz esse acordo? Que vai ficar tudo na mesma. O SPD reduziu-se à sua insignificância: voltará a apoiar a política da bastonada. Não há eurobonds para ninguém nem garantias da união bancária. Depois da falência do socialismo francês - e do desaparecimento de François Hollande do cargo de combatente da austeridade para o qual foi eleito - é a vez dos sociais-democratas europeus de levarem com mais um tijolo na cabeça. O SPD, um dos primeiros partidos socialistas europeus a converter-se à terceira via, não irá dar qualquer contributo para a resolução dos problemas estruturais da Europa e da arquitectura do euro. O Sul continuará entregue aos bichos e à ditadura de uma união monetária concebida para os mais fortes. Estamos a viver uma espécie de fim dos tempos - embora muita gente finja ainda não ter dado por isso. Os dois partidos fundadores da União Europeia - os sociais-democratas e os democratas-cristãos - foram capturados pelos interesses financeiros, pelos negócios, pela miséria ideológica do individualismo selvagem. Na prática, socialistas e democratas-cristãos morreram e o que vemos à nossa frente é um velório prolongado. Nenhum europeu teve ainda a coragem de lhes fazer o enterro, mas é urgente fazer esse funeral e o luto subsequente. Mais vale desligar a máquina que continuar neste estado comatoso a fingir que ainda existem partidos social-democratas, valores social-democratas ou democratas-cristãos. O que sabemos que existe, neste momento, é uma extrema-direita a crescer e a organizar-se. Marine Le Pen deverá ganhar as eleições europeias em França e já prepara activamente uma aliança com os extremistas da Holanda, com a Liga Norte e com outras companhias do género. Estes senhores têm um programa, sociais-democratas e democratas-cristãos não têm nenhum. As coisas não vão correr bem." Depois de o ler-mos devemos pensar sobre tudo isto. Quando acabei de o ler, veio-me ao pensamento as palavras do cardeal Suenens: "Felizes os que têm a audácia de sonhar e estão dispostos a pagar o preço necessário para que o seu sonho tome corpo na história dos homens". O problema é que não sei se temos ainda pessoas com audácia para sonhar e, sobretudo, que estejam dispostos a pagar o preço dos seus sonhos. Se calhar por isso, estamos como estamos, Portugal mas também a Europa, nestes dias de desalento, de descrença, de desesperança que são estes que hoje vivemos.

Friday, November 15, 2013

Gregorian - "Epic Chants"

Com a proximidade da quadra natalícia, começam a aparecer os novos discos que apelam à sonoridade da época, dentro duma estratégia comercial já há muito conhecida. E é neste espírito que vos trago aqui um magnífico CD dos Gregorian. Não se trata dum disco de Natal, mas cria algumas envolvências da época, desde logo, pela sonoridade que apela ao cântico gregoriano dentro duma tradição ancestral dos rituais eclesiásticos que ainda hoje perduram. Os Gregorian transportam em si essa sonoridade que põem ao serviço de canções duma outra índole, nomeadamente, próximas dum som pop. Este disco não é exceção. Só que desta feita os Gregorian resolveram seguir no trilho de algumas canções épicas - para parafrasear o título do CD - a que dão um brilhantismo que já não víamos há muito tempo. Percorrendo universos que vão desde "Bright Eyes" a canção mais emblemática de Art Garfunkel, passando por "Against All Odds" que se deu a conhecer pela voz de Phil Collins, até ao extraordinário "Conquest Of Paradise" de Vangelis, aqui apresentado numa versão cantada, aliás, como todas as outras. Não esqueceram "She" ou "Unchained Melody" que foram autênticos hinos no seu tempo e que ainda hoje se ouvem com agrado e emoção. Durante 14 temas, os Gregorian fazem desfilar uma parada de canções de alta qualidade, trabalhadas com muito rigor num certo formato "concept album" que  formou escola noutros tempos no universo do vynil. Um disco poderoso e interessante que espero que não passe ao lado de todos vós. Para além duma certa mediocridade que vai fazendo escola por aí é sempre interessante ver-mos um registo desta qualidade e interesse. Um disco que nos eleva o espírito, um disco que, porque não dizê-lo, trilha os caminhos da fé, essa fé que é o abismo ascendente para o Eterno, para usar uma metástase do ritual místico judaico. Por tudo isto, este disco é uma referência. Porque estamos a aproximar-nos do Natal, talvez fosse de considerar este CD no vosso cabaz de prendas que pretendem oferecer. Este é, provavelmente, um dos melhores registos dos Gregorian, não só pela seleção dos temas, mas também pelo trabalho de orquestração (sempre criativa), bem como, pela produção rigorosa com que foi concebido. Um registo fantástico que deve merecer a vossa atenção. Resta dizer que este CD dos Gregorian, com o título "Epic Chants" (Cânticos Épicos), foi gravado no Nemo Studios e aparece com a distribuição da Sony Entretainement. Verdadeiramente imperdível.

Thursday, November 14, 2013

"À la Recherce du Temps Perdu" - Marcel Proust

Comemora-se hoje o aniversário da primeira edição da "À la Recherche du Temps Perdu" de Marcel Proust. É assim este desfiar de memórias e vidas, distribuído por sete volumes, que o francês Marcel Proust deixou como testamento de uma época e de uma filosofia particular e o poeta Pedro Tamen traduziu com delicadeza. Como afirmou o poeta e tradutor Pedro Tamen em entrevista a Maria da Conceição Caleiro (Público, Mil Folhas, 21/6/03), «não é possível contar ["Em Busca do Tempo Perdido"] a ninguém, não existe como história, há meia dúzia de peripécias, de personagens. Ao nível das peripécias há muitas coisas apaixonantes. As mutações quase rocambolescas das personagens, o que era Odette e o que Odette vai sendo ao longo das 3000 páginas... Mas não é isso que interessa. O que interessa é o que isso significa, é o facto de a vida, o mundo, o tempo correr mais depressa do que nós, e no fundo só podermos descobrir o sentido disso quando o tornamos arte, quando o concretizamos em literatura. (...) ["Em Busca do Tempo Perdido"] é a criação de um universo, no sentido mais universal que a palavra possa conter, através da linguagem.» Valentin Louis Georges Eugène Marcel Proust nasceu em Auteuil a 10 de Julho de 1871 e morreu em Paris a 18 de Novembro de 1922. Proust foi um grande escritor francês, mais conhecido pela sua obra "À la Recherche du Temps Perdu"  (Em Busca do Tempo Perdido), que foi publicada em sete partes entre 1913 e 1927. Uma celebração que poderá e deverá ser um pretexto para se descobrir a obra e ampliar ou criar o gosto pela leitura.

Equivocos da democracia portuguesa - 302

Quando desde à dois anos vimos falando em que esta crise e esta austeridade levará uma geração para se diluir, acabamos sempre por nos ver confrontados com rótulos de pessimistas ou pior. Numa conferência feita à cerca de um ano e meio numa instituição de ensino superior, acabamos confrontados - curiosamente por alguns professores - perante as afirmações proferidas que, segundo eles diziam, eram um sinal de desesperança e não de incentivo aos mais jovens. Na altura afirmamos que seria assim que as coisas se passariam e que não valia a pena estarmos a iludir as questões e esses mesmos jovens, alunos dessa instituição. Passado todo este tempo, a razão foi-nos dada pelo evoluir da situação. Austeridade sobre austeridade, num modelo desajustado da realidade, que nos colocou dentro duma espiral de empobrecimento donde dificilmente sairemos. (Aliás, quando o primeiro-ministro afirmava no início do seu mandato de que "Portugal e os portugueses tinham que empobrecer", ele estava a encarnar uma realidade trágica, talvez sem saber a dimensão daquilo que dizia). Depois de muitas vezes o fim da crise ter sido "decretado" por alguns iluminados, o certo é que ela, bem pelo contrário, se foi agravando. Todos sentimos isso no dia-a-dia. Agora tivemos acesso ao relatório do FMI sobre Portugal que ontem foi divulgado. E a receita que lá transparece é, nada mais nada menos, do que a já conhecida de continuação da austeridade - leia-se empobrecimento - do país e das suas gentes. Mas agora, já não é até Junho de 2014 - altura em que o programa da "troika" termina - mas vai por 2015 adentro e 2016 e assim por diante. Perante isto que dizer? Duas ilações são desde logo evidentes. A primeira é que a reestruturação da dívida tem que ser feita o mais rápido possível e a segunda é que o definhar desta terra lusa continuará por muitos e maus anos. Mas uma outra questão nos assalta o espírito que é a de não compreendermos esta insana contradição entre as palavras dos dirigentes políticos das instituições que neste momento nos tutelam - desde logo, o FMI - e a "praxis" daqueles que no terreno ditam e impõem uma estratégia contrária ao que afirmam os seus dirigentes. Contradição insana que todos pagamos com juros bem elevados, e aqui não nos estamos a referir só aos que derivam da dívida, mas a todo o cortejo de esmagamento de que a sociedade portuguesa tem vindo a ser alvo. Já em tempos idos, aqui trouxemos uma comparação desta situação com a altura em que o livro "Os Maias" de Eça de Queiroz foi escrito. Tempos difíceis também aqueles, em que estivemos, mais uma vez, sobre assistência, e cuja dívida demorou 99 anos a ser paga ao banco inglês nosso credor de então tendo terminado apenas em 2001! Daí o concluir-se que quando muita gente vinha falando na reestruturação da dívida e o governo desdizia, isso só demonstrou que este governo vem mentindo ao país desde que tomou posse. Aquilo que primeiro começou por ser uma agenda ideológica, depressa saiu do controle desta gente ultraliberal que nos esmaga, e passou a ser a cartilha que os nossos credores impõe. Já aqui falamos há dias das afirmações de Paul de Grauwe e escusamo-nos a repeti-las de novo. A austeridade sobre austeridade não resolveu - nem irá resolver - a situação. Não será pela via do empobrecimento, da perda de empregos e, sobretudo, dos baixos salários que Portugal - o crescimento deve ser feito pelo lado da procura e isso não está a acontecer - irá sair deste abismo em que, diariamente, para lá nos empurram.  É preciso muito mais. Desde logo, a força negocial dum governo que este já demonstrou não ter. Não basta - não bastou - ser o "bom aluno". Quando o relatório do FMI afirma que "não deverão ocorrer outras crises políticas como a de Junho passado" está a dizer tudo. Culpa Portas e o seu grupo e ainda por cima dá um puxão de orelhas ao governo. Isto é inadmissível num país soberano. E não basta falar em "protetorado" como o faz Portas amiúde e depois provocar uma crise política apenas por ânsia de poder. É preciso um governo respeitável e que se faça respeitar. E seguramente esse governo não é aquele que hoje nos (des)governa. E não basta os pequenos passos que o governo transforma em grandes conquistas. Sabemos a importância de mobilizar as gentes, mas também sabemos que a descrença alastra cada vez mais. Hoje soube-se que saímos da recessão técnica. É importante mas não é suficiente. Primeiro há que saber se este crescimento do PIB é sustentado - apesar de terem passado três trimestres consecutivos com a mesma tendência -, depois é preciso reestruturar a dívida rapidamente porque não geramos riqueza nem para pagar o serviço da dívida muito menos amortizá-la. (E não esqueçamos que a economia não cresceu com este indicador, o que acontece é que está a cair a ritmo mais lento). Porque para além de tudo isto as gentes continuam a sentir que vivem mal. Como lembrava há dias um deputado da oposição "um português dirá que se tudo está tão bem como o governo diz porque será que vivo tão mal?" A frase é eloquente e encerra em si aquilo que os portugueses pensam. Tudo o resto são palavras que, como é suez dizer-se, o vento as leva. E como questionava ontem Bagão Félix na SIC Notícias: "O que o relatório encerra em si, é a austeridade necessária ou antes uma opção ideológica?" A pergunta aqui fica. Compete a cada um dar a resposta.

Wednesday, November 13, 2013

Uma memória aos 91 anos

Hoje o meu pai faria 91 anos. Faria, porque há um quarto de século que vai engalanando a minha galeria de ausentes. Contudo, a memória sempre fica. E não queria deixar de o lembrar aqui, neste dia. Partiu cedo, tinha apenas 66 anos de idade, mas isso não significa que ficasse retido nas brumas da memória. Hoje queria aqui trazê-lo para esta pública e modesta homenagem. Não fostes esquecido. Não estás esquecido. Lá onde estiveres, descansa em paz!

John Taverner (1944-2013)

Fui hoje surpreendido pela notícia da morte de John Tavener que terá ocorrido ontem dia 12 de Dezembro de 2013 na sua residência na cidade de Dorset, no sudoeste da Grã-Bretanha. John Tavener nasceu a 28 de Janeiro de 1944 em Wembley no Reino Unido. Faleceu assim com 69 anos de idade. Foi um compositor famoso homenageado pela rainha em 2000 pela sua atuação no meio musical. John Tavener converteu-se à Igreja Ortodoxa nos anos 60 encetando assim um caminho de "diálogo com a alma" como costumava dizer. Foi o primeiro compositor de inspiração clássica a ter um tema no top de música pop (!) - "The Protect Veil" - o que muito o sensibilizou porque achava que era um indicador de que a sua música tinha chegado até aos mais jovens. O responsável da Chester Music, James Rushton afirmou que Tavener "foi o uma das mais inspiradas e singulares vozes na música nos últimos 50 anos”.   E acrescentou ainda que “o seu trabalho é uma das contribuições mais significativas para a música clássica do nosso tempo”. Sobre a sua religiosidade Rushton disse que “para todos os que tiveram a sorte de o conhecer, John [Tavener] era um homem de profundas crenças, de grande afetuosidade, lealdade e humor, que fará muita falta”.  Das suas composições mais célebres saliento: "Song for Athene", "The Protecting Veil", "The Whale", "Tavener: Lamentations"; "Praises" e "Celtic Requiem (Requiem For Jenny Jones)". Para aqueles que não conhecem a música de Tavener deixo aqui um link - https://www.youtube.com/watch?v=BkgN9OjMXgw - onde podem escutar, precisamente, a peça "The Protect Veil" que esteve nos top musicais de inspiração pop como atrás já fiz referência. R.I.P. John Tavener!

"A Confiança no Mundo - Sobre a Tortura em Democracia" - José Sócrates

José Sócrates figura incontornável da política portuguesa aparece agora num registo completamente diferente. Desta feita, com um ensaio - a sua tese de mestrado - com o título "A Confiança no Mundo - Sobre a Tortura em Democracia". Um livro muito interessante e bem escrito sobre o fenómeno da tortura e a sua legitimação em regimes democráticos. Se em regimes totalitários essa é a prática, em democracia parece ser um pouco mais difícil de aceitar e justificar. Depois de lermos este ensaio ficamos com a ideia de que esta embaraçante questão começa essencialmente pela mão da França no conflito que teve que gerir na Argélia. Se antes, - depois do fim da II Guerra Mundial -, em que vieram a lume as enormes atrocidades feitas pelos nazis, o certo é que os Aliados não enjeitaram o mesmo caminho depois da vitória. O caso mais paradigmático foi o da França de De Gaulle a quando da resistência e depois, cm todo o saber acumulado, o aplicou nas suas colónias como a Argélia. Esta só foi eliminada da França quando houve uma ameaça de golpe de Estado. Mas depois, estas situações não pararam no mundo. "Desde as guerras coloniais até à guerra fria, hoje pretende legitimar-se na guerra contra o terror".Camuflada para evitar os olhares do mundo ela sempre foi existindo, até que chegados aos nossos dias, assistimos ao paradoxo duma das democracias de referência, como é o caso da democracia americana, estas práticas serem legalmente legitimadas o que levou a enormes atrocidades em Abu Ghraib no Irão, e depois em Guantánamo em Cuba. Fora os outros casos de que não se tem registo, mas que se sabe existirem, nas prisões fantasmas (secretas) mantidas pela CIA. Como foi isto possível? Como é que uma democracia foi capaz de gerar no seu seio estas atrocidades? Estas e outras questões são o objeto deste livro onde José Sócrates pretende cimentar informação baseado em alguns dos mais prestigiados autores que abordaram esta problemática. Um livro muito bem escrito, de leitura fácil, onde as referências às fontes utilizadas estão muito bem assinaladas e transcritas. Um livro que nos leva a uma reflexão profunda sobre um tema tão importante nos nossos dias. Afinal, a democracia que parecia ser uma espécie de regime perfeito, quiçá, redentor, também tem os seus pecados de que não se pode eximir. Com o prefácio assinado pelo ex-Presidente da República do Brasil, Lula da Silva, este livro deve merecer a nossa atenção e, sobretudo, a nossa reflexão, nestes dias de ira em que parece que o mundo está mergulhado. Como escreve o autor: "A linha vermelha da dignidade humana é uma defesa da democracia face a ela própria. Nos momentos de pânico e de descontrole, a democracia precisa de continuar a respeitar-se, ela não pode ter vergonha de si mesma nem acanhar-se dos seus valores. Mesmo em exceção, a democracia deve ser capaz de se 'reconhecer' como uma democracia". A edição é da Babel. Um livro a todos os títulos recomendável.

Tuesday, November 12, 2013

Porque é que a deflação é catastrófica para Portugal?


 A surpresa da descida da taxa de juro de referência do Banco Central Europeu para novo mínimo histórico (0,25%) encontra na evolução da inflação na Zona Euro um importante justificação. Mesmo nas economias mais dinâmicas da zona euro, como a Alemanha, a evolução dos preços tem sido de forte desaceleração. Com as perspetivas de crescimento económico a serem revistas em baixa e com o risco de se entrar num processo de descida (e não de subida) de preços, ou seja, de deflação, o BCE terá antecipado este estímulo que visa dinamizar a atividade económica desincentivando a poupança e estimulando o consumo. Perguntar-se-á: Se os preços começarem a descer em vez de subir não é bom? Pois a resposta está precisamente no artigo com esse título que aqui publicámos já este ano quando se começaram a detetar os primeiros sinais de que o risco de deflação em Portugal é real. Recorde-se que, em 2009, já tivemos um ano em que ocorreu uma efetiva descida dos preços de 0,8%. Mas acrescentemos alguns detalhes. No caso português, país devedor, a inflação poderia contribuir para ir facilitando progressivamente o pagamento da dívida precisamente porque esta está contratada num valor fixo e, como tal, vai-se tornando menos árdua de pagar à medida que os preços (do que exportamos, por exemplo) forem subindo. Na prática, a inflação funciona como um imposto escondido sobre os credores pois erode a taxa de juro que cobram pelo que emprestaram e pode até erodir o próprio capital. Como? Vejamos um exemplo: Se alguém empresta 100 a uma taxa de 3% no período mas durante esse mesmo período do empréstimo a inflação for de 5%, isso significa que no final do prazo, para comprar o mesmo cabaz que comprava com 100 no início, precisará de 105 e, contudo, só receberá 103. Ou seja, os 100 que emprestou e os 3 de juro (esquecemos aqui os impostos para simplificar). Ao mesmo tempo, o devedor pode ter conseguido que aquilo que vendia a 100 possa ter passado a ser vendido a 105 e, consequentemente, terá libertado mais capital para pagar a dívida, os juros e ainda reter alguma coisa extra, tudo apenas por efeito da variação dos preços (esquecemos aqui também o retorno do investimento feito com o empréstimo para simplificar). Ora se em vez de inflação existir deflação, o efeito é precisamente o oposto, constituindo esta uma sobrecarga sobre o devedor que recebe cada vez menos pelo que produz e continua a ter uma dívida contratada num valor imutável e, em termos práticos, cada vez mais difícil de conseguir pagar. Um cenário de deflação ou mesmo de inflação baixa é particularmente dramático para um país, empresa ou família que esteja a tentar pagar a sua dívida. Vários economistas antecipavam este cenário como consequência do esforço unilateral de ajustamento feito pelos países do sul da Europa (esmagando salários e procura interna) combinado com a coincidência temporal de alguma austeridade em países do centro, mesmo entre os que registam excedentes sucessivos há vários anos. Do efeito contracionista conjunto sobre o consumo privado pode ter nascido esta evolução que levou os preços para crescimentos muito baixos, com risco de se tornarem negativos. A reação de há dias do BCE denota algum alarme com esta queda rápida dos preços de forma generalizada na Zona Euro. Bastará? Provavelmente, de forma isolada, não. Mas voltemos à deflação. Se um alemão lhe pode explicar quais os riscos da hiperinflação (recordando o que aconteceu há cerca de 100 anos no seu país), um japonês pode explicar-lhe os riscos de acreditar que amanhã o preço vai ser sempre mais baixo do que hoje, recordando-se do que se passou no Japão nos anos de 1990 até praticamente hoje. Em rigor, o Japão ainda está a tentar ultrapassar definitivamente o fantasma de um regresso à deflação que abandonaram marginalmente há alguns anos atrás. Mas o alerta aqui fica. Pela primeira vez desde pelo menos 1978, o deflator do PIB caiu em Portugal para valores negativos. Se o fenómeno se prolongar, o país pode arriscar-se a cair na armadilha da deflação e aí as coisas tornar-se-ão ainda mais difíceis para Portugal, bem mais difíceis do que o que temos sentido até agora. O risco de deflação existe e ameaça apresentar-se como o clímax inevitável da tragédia anunciada.

Monday, November 11, 2013

Equivocos da democracia portuguesa - 301

É sina dos portugueses apenas considerarem algo depois de ouvirem essa ideia repetida por alguém estrangeiro enquanto a foram ignorando quando era um português (ou vários) a expô-la. Vem isto a propósito da entrevista que o economista belga Paul de Grauwe deu sobre a austeridade em Portugal. Atacando a teoria do "bom aluno", passando pela "austeridade excessiva", de Grauwe passou em revista os temas mais determinantes do nosso percurso dos últimos dois anos e meio dentro da linha do que muitos já vinham afirmando há demasiado tempo. Nós também já tínhamos feito eco destas ideias vai para mais de um ano - ver crónicas anteriores - porque era por demais evidente o caminho que as coisas estavam (estão) a tomar. E isso não significa que quem o fez fosse um génio assumido, um vidente de provas dadas, bastava para isso estar atento à realidade e saber um pouco de economia e finanças. Era por demais evidente que a receita já tinha falhado há muito, e quem disso fez eco foi o anterior ministro das finanças, Vítor Gaspar, na sua carta de demissão. (Já aqui por diversas vezes dissemos que seria bom que lessem com atenção essa carta, sobretudo, quem tem responsabilidades governativas. Parece que não levaram a sério o conselho e vai daí o abismo profundo para que Portugal está a ser empurrado é claro, sem que nada pareça evitar o colapso. E não basta umas décimas para que se diga que tudo está a correr bem. Porque não é verdade e, ainda por cima, porque fica mal a quem tais afirmações profere. “O governo português fez o grande erro de tentar ser o melhor da turma no concurso de beleza da austeridade. Não havia razão para Portugal fazer isso, podia não ser o melhor da turma, podia ser mesmo o pior e isso seria melhor para economia”, afirmou Paul de Grauwe na entrevista que deu à Lusa. E sem papas na língua afirma: “O capitalismo é um sistema fantástico, mas muito instável, que produz altos e baixos, períodos de otimismo e pessimismo, e nos baixos o Governo tem de juntar as peças e os défices necessariamente aumentam. Precisamos de Governos que protejam os cidadãos, que os ajudem. Se não o fizerem, a legitimidade dos Governos fica em causa”. Assim, sem mais, o economista belga diz aquilo que muitos de nós pensamos de tudo isto. E enfatiza aquilo que muitos andam a afirmar há demasiado tempo: “Não acho que consiga sair do problema hoje sem uma reestruturação da dívida”. Mas Paul de Grauwe não se fica pelas críticas e adverte: “Dizem aos portugueses que têm de fazer mais sacrifícios. Para quê? Para pagar a dívida aos países ricos do Norte [da Europa]. Isto será explosivo, os portugueses não vão aceitar isso indefinidamente”,  e ainda reforça mais a ideia quando diz: “Um novo programa de austeridade vai empurrar Portugal para a insolvência”. Agora é caso para perguntar como vai o governo lidar com isto? E o presidente da República que tem sustentado esta estratégia? Será que o professor da London School of Economics ao afirmar que há uns anos Portugal era um país solvente, mas que, as políticas de austeridade levaram à recessão económica e aumentaram de tal forma o endividamento que agora corre o risco de não conseguir pagar a sua dívida, passou a ser não um eminente economista, mas mais um elemento de perturbação, um qualquer líder duma qualquer oposição com interesses mesquinhos e com ganas do poder? Será que este conselheiro da União Europeia passou a integrar a lista, cada vez maior, dos "masoquistas" à la Cavaco Silva? Será que ainda o governo não percebeu o caminho errado que está teimosamente a percorrer? Que interesses estão por trás de tudo isto? “Vocês [em Portugal] fizeram reformas estruturais, flexibilizaram, reformaram o mercado trabalho e não resultou. Porque o problema está do lado da procura”, e será que isto é tão difícil de entender? Ou será que este economista belga que tem um pensamento coincidente com o de Joseph Stiglitz, prémio Nobel da Economia em 2011 e antigo vice-presidente do Banco Mundial, afinal nada percebe disto e apareceu a dar esta entrevista a pedido de qualquer "inimigo" do governo! Meus senhores, na política como na vida é preciso decoro. Coisa que não vemos há muito entre nós. Será que agora, à boa maneira lusa, alguém presta atenção a estas palavras ou, pelo contrário, virá alguém desvalorizá-las em nome duma qualquer estratégia salvadora digna dos deuses? Podemos ter as leituras que quisermos sobre tudo isto, mas quando estas políticas mexem com a vida das pessoas e destroem um país o caso é mais grave e não se pode ficar indiferente e muito menos silencioso.

Equivocos da democracia portuguesa - 300

Ainda a semana está a começar e já está embrulhada em polémica! Agora, e de novo, Rui Machete no epicentro do problema. Depois das polémicas afirmações sobre as "desculpas" a Angola, agora Rui Machete irrompe pelo ministério das finanças adentro e vai daí, afirma que "a hipótese de um novo programa de apoio financeiro a Portugal - leia-se segundo resgate - dependerá de as obrigações da dívida pública a 10 anos se situarem numa taxa de 4,5%". "Se [a taxa] estiver acima [dos 4,5%], não é possível. Não sendo possível, teríamos de encontrar vias alternativas, que normalmente se designam como um novo resgate", acrescentou o ministro. Rui Machete estava na Índia quando produziu estas afirmações. Parece que sempre que Rui Machete sai do país, o governo deve tremer de aflição porque nunca se saberá qual a polémica afirmação que fará e que embaraços irá causar à urbe. Se a polémica sobre Angola em nada veio ajudar às relações entre os dois países, como se viu, estas que agora faz não ajudam em nada o país. Para um governo que tanto fala em dar uma imagem externa de união e de alargamento da coesão nacional em torno das medidas que estamos obrigados a cumprir, não deixa de ser estranho este embaraço que o seu ministro de Estado e dos negócios estrangeiros anda por aí a causar. Porque se existe algo que os mercados não quererão ouvir serão afirmações como estas de Rui Machete. Afinal que quer dizer o primeiro-ministro quando fala em consenso alargado em nome dos mercados? De que servem essas ideias quando de dentro do seu próprio seio saem afirmações como estas? Todos sabemos que o que disse não deixa de ter um lado de verdade, como não se pode ignorar que, enquanto a economia não crescer acima dos 2% não irá alavancar, isto é, não existirá crescimento sustentável que crie emprego e normalize a economia. (Daí que quando se fala em crescimento dumas décimas tal não passe duma "blague", uma de muitas em que este governo cai com frequência). Mas uma coisa é termos essa noção, outra é vir debitá-la em público - ainda por cima num país estrangeiro - e vindo dum alto dirigente do governo português. Desde o início que assistimos a um governo que fala demais e a várias vozes e verificamos a incapacidade do primeiro-ministro em ter mão nos seus próprios ministros. Mas convenhamos que se está a ir longe demais. Para além da descoordenação do executivo, para além do falhanço da estratégia seguida, ainda temos que lidar com ministros que falam a destempo, sem medirem as consequências do que dizem. E o caso é tanto mais grave vindo do ministro de Estado e dos negócios estrangeiros. Desde logo porque o ser ministro de Estado já lhe acarreta algum dever de responsabilidade e recato para andar por aí a falar do que lhe vem à cabeça, depois porque ministro dos negócios estrangeiros o que mostra a falta para saber lidar com questões sensíveis. É caso para dizer a quem está entregue a diplomacia portuguesa! Mais uma vez, o amadorismo do governo vem à tona, depois de tantos episódios rocambolescos que desde o início o executivo alimentou. Depois de tudo isto será que ainda há espaço para se falar em consenso? Em pedir consenso a outros partidos em nome de Portugal? Muito caminho ainda tem o governo que percorrer para poder afirmar com clareza meridiana aquilo que pretende porque para já apenas vimos depauperação, miséria e desesperança.

Friday, November 08, 2013

Homenagem a Mia Couto


Mia Couto, é o pseudónimo de António Emílio Leite Couto, escritor moçambicano e biólogo de formação. O escritor moçambicano natural da Beira, Moçambique, recebeu há dias o prémio Neustadt International Prize for Literature, prémio que, segundo o próprio, lhe chegou num momento difícil da vida, onde ele e a sua família vivem a ameaça do novo terror que recentemente se abateu sobre este país, o de se ser raptado a qualquer momento. Aos 58 anos de idade, Mia Couto é um dos mais notáveis e conhecidos escritores desse país e um digno divulgador da língua portuguesa. Em homenagem a este grande escritor moçambicano quero aqui deixar um pequeno trecho dum dos seus livros para que, quem aqui me segue neste espaço, veja ampliada a curiosidade de vir a conhecer a obra - caso ainda não a conheça - deste grande homem de letras.  Escolhi um trecho do seu livro "O Fio das Missangas". A estória tem por título "A despedideira" e diz assim: "Há mulheres que querem que o seu homem seja o Sol. O meu quero-o núvem. Há mulheres que falam na voz do seu homem. O meu que seja calado e eu, nele, guarde meus silêncios. Para que ele seja a minha voz quando Deus me pedir contas. No resto, quero que tenha medo e me deixe ser mulher, mesmo que nem sempre sua. Que ele seja homem em breves doses. Que exista em marés, no ciclo das águas e dos ventos. E, vez em quando, seja mulher, tanto quanto eu. As suas mãos as quero firmes quando me despir. Mas ainda mais quero que ele me saiba vestir. Como se eu mesma me vestisse e ele fosse a mão da minha vaidade. Há muito tempo, me casei, também eu. Dispensei uma vida com esse alguém. Até que ele foi. Quando me deixou, já não me deixou a mim. Que eu já era outra, habilitada a ser ninguém. Às vezes, contudo, ainda me adoece uma saudade desse homem. Lembro o tempo em que me encantei, tudo era um princípio. Eu era nova, dezanovinha." Este pequeno trecho dá uma ideia do tipo de escrita de Mia Couto, sempre tendo o seu povo, - o povo moçambicano -, no centro da ação tecendo sobre ele as suas estórias. Uma literatura que por vezes nos passa ao lado aqui em Portugal, talvez fruto ainda dum certo sentimento "colonialista "que marcou as gerações com mais anos. Por tudo isso, até para exorcizar fantasmas antigos, nada melhor do que mergulhar nestas páginas e vir a conhecer uma outra literatura que também é nossa irmã, fruto da convivência que forjamos ao longo de séculos, nem sempre pelas melhores razões. Aqui fica o repto à (re)descoberta deste grande escritor moçambicano, e os parabéns a Mia Couto por mais este prémio que vem abrilhantar a sua já longa e prolifica carreira de escritor consagrado.

Thursday, November 07, 2013

No centenário de Albert Camus (1913-1960)

Cumprem-se hoje cem anos sobre o nascimento de Albert Camus, escritor, romancista, ensaísta, dramaturgo e filósofo francês de origem argelina, nascido na cidade de Mondovi na Argélia, precisamente a 7 de Novembro de 1913. Para além de ser um eminente homem de letras, não deixou de ter também uma consciência social em tempos bem difíceis, o que o levou a colaborar com a Resistência Francesa na altura em que desempenhava as funções de jornalista, um jornalista empenhado nos problemas do seu tempo, bem como, nas discussões morais que emergiram do pós-guerra. Da sua vasta obra, queria aqui trazer um dos seus livros mais aclamados, "L'Étranger" (O Estrangeiro), - que viria a ser passado ao cinema -, e quero aqui fazê-lo por uma dupla razão. Para além de ser uma obra impressionante que me marcou muito quando o li ainda na minha juventude, mas porque foi devido a ele que Camus viria a conhecer um dos filósofos mais importantes da modernidade francesa, Jean-Paul Sartre, o filósofo do "existencialismo" que viria a marcar várias gerações, - a minha também -, e que tive o prazer de conhecer numa visita que ele fez a Portugal após o 25 de Abril de 1974. Os grandes génios acabam sempre por se encontrar, às vezes, em encontros difíceis porque disputam os mesmos territórios da intelectualidade, o que não foi aqui o caso, - pelo menos até o pós-guerra -, felizmente para os seguidores de um e de outro, como é o meu caso. Essa amizade que depois viria a estiolar precisamente após o fim da II Guerra Mundial deu lugar a um ensaio fantástico de Ronald Aronson de título "Camus e Sartre: O fim de uma amizade no pós-guerra" (2007), que vos aconselho vivamente. Camus viria a frequentar a Université des Algières nos anos de 1936-1937. Albert Camus deixou-nos a 4 de Janeiro de 1960, quando vivia na cidade de Villeblevin em França. Este centenário, para além, da celebração da efeméride, é também uma oportunidade de lembrar o nome e a obra de Camus, um dos mais influentes escritores de expressão francesa do século XX. Uma boa oportunidade para descobrir, ou quiçá, reler a fantástica produção literária de Albert Camus.

Equivocos da democracia portuguesa - 299

Nesta encruzilhada em que nos encontramos e que teimamos em não encontrar uma saída é tempo para algumas reflexões sobre o futuro que nos espera. Com a chegada ao poder dum governo de matriz ultraliberal era sabido que a vida não iria ser fácil, desde logo, pelo memorando da "troika" que nos iria/está a condicionar e depois porque era claro - até por afirmações anteriores do atual PM - que se iria implementar essa agenda ultraliberal a coberto do memorando, ambição duma direita que nunca deixou de pensar nisso, com a maioria e um PR da mesma matriz, sonho acalentado há muito e que até então não tinha tido expressão. Mas para além disto, que já todos sabemos e duma forma bem dura, resta refletir para o futuro. O que este nos reservará e que medidas teremos que ir ajustando. É certo que, desde logo, o estado social não será mais aquilo que foi porque muito foi destruído e dificilmente recuperável, depois porque não temos dinheiro para o assegurar com qualidade. E por mais que outros partidos digam o seu contrário, pensamos que isto será uma inevitabilidade. Se há partidos que podem afirmar o que quiserem porque não terão que enfrentar as responsabilidades da governação, já do maior partido da oposição não se pode dizer o mesmo. Compreendemos que no âmbito da luta política se façam afirmações que caem bem junto do potencial eleitorado, mas se analisarmos friamente a situação, veremos que não será assim. Isto não significa que não defendamos o estado social, (porque necessário, porque importante), como já aqui o fizemos por variadíssimas vezes. E por mais "lobbies" que se apresentem, estes não conseguirão alterar a realidade. Sabemos da força que estes representam entre nós, desde logo, o dos médicos, dos juízes, dos professores e dos transportes, mas também temos que ter a consciência de que nada será como dantes, seja com este governo ou com outro, numa matriz de condicionamento financeiro que nos irá acompanhar durante muito e muito tempo. Ontem vimos como a UE já está a projetar a austeridade para 2015 - ano eleitoral e que este governo, (se até lá se mantiver), quereria que fosse diferente - mas esta irá manter-se para que o défice acordado com Bruxelas atinja os valores pretendidos. O problema é que depois de 2015 a saga continuará, num país empobrecido, envelhecido, com cada vez mais baixa produtividade, fruto até do próprio envelhecimento populacional, e assim sendo, este caldo em que nos movemos não irá ser libertador a curto prazo. Desenganem-se aqueles que pensam o contrário. Por mais greves que se façam - e isto não significa que não consideremos as greves um direito importante de quem trabalha - mas, só por si, estas não vão condicionar nada, porque a pobreza do nosso país falará sempre mais alto, infelizmente para todos nós. Apenas se sacrificam as populações que são as que mais sofrem em momentos de desespero, e o país que se vê mais enfraquecido e necessitará de mais apoio. É nesta espiral de perturbação que, sobretudo nesta semana de muitas greves, se vê com clareza meridiana, seja qual for o ponto de vista que a olhemos. O contrário só poderá ser defendido por quem não percebe a realidade ou por quem, egoisticamente, pensa apenas no seu próprio umbigo. E isto parecendo uma afirmação dura, quando a descodificamos vemos que não é tanto assim. Temos assistido a frequentes greves de setores que até estão muito bem pagos e não querem abdicar de algumas mordomias quando temos um país a desmembrar-se caído na miséria e na ignomínia. Já não é só uma questão de visão, mas sim, dum egoísmo a toda a prova. E, o que é mais grave, isso não alterará a matriz que nos condiciona. Passamos a vida a clamar para que se atue do lado da despesa e depois não queremos que os funcionários públicos sejam afetados. Um paradoxo irresolúvel. Porque com os valores da dívida sempre a crescer, a possibilidade de a pagar-mos não passa duma miragem. Daí que esta situação nos irá condicionar por muitos anos, mesmo depois da saída da "troika". Com um estado social que não voltará a ser o mesmo, com um condicionamento financeiro que se arrastará por várias gerações, o futuro não nos parece muito risonho. Muitos já o perceberam e buscaram, - de novo -, os caminhos da emigração, sobretudo, aquela que também nos irá condicionar no futuro porque se trata de emigração de jovens e, para além disso, muito qualificados, que não regressarão mais ao seu país, sobretudo, no momento em que Portugal mais irá precisar deles. (E por isso, cuidado com as análises que se fazem sobre as estatísticas em torno do desemprego!). Assim, quando muitos vêm defendendo um largo consenso, pensamos que não estão errados. Erradas estão as premissas de que partem quando o fazem porque no atual contexto tal não será possível sem que para isso o país seja chamado a eleições. Penso que todos já percebemos isso, mas depois das eleições, a questão vai manter-se e a inevitabilidade desse consenso terá que existir a bem do país. Com um programa cautelar, ou segundo resgate, ou seja lá o que vier por aí, os nossos credores imporão um largo consenso, pelo menos aos partidos do arco da governação, que terão que pôr de lado as suas divergências e convergir naquilo que os aproxima, desde logo, o bem de Portugal e dos portugueses. Daqui se deduz que o futuro risonho não passa duma parábola que pode ser usada nos discursos hiperbólicos que a política tece e em que é fértil, mas a realidade acabará por impor a sua decisão. Como dizia um político na semana passada a quando do debate do OE 2014, "a "troika" vai-se embora mas os problemas ficam". Pensamos chegada a altura de se pensar o futuro, sem medos, sem condicionalismos, sem constrangimentos, porque ele está aí, porque todos esperamos que rememos num mesmo sentido que nos liberte, o mais rápido possível, dos grilhões que nos tolhem os movimentos desde que esta crise anunciada se abateu sobre todos nós. O bom senso há-de imperar, assim o esperamos. E não tentem separar a política de algumas considerações morais porque por aí a solução não virá. Como afirmava Jean-Jacques Rousseau: "Aqueles que querem tratar separadamente a política e a moral nunca entenderão nenhuma das duas" (in "Émile ou de l'Education"). Deixemos que o bom senso impere porque é nos momentos decisivos, nos momentos de rutura que se veem os grandes homens, os grandes estadistas. E Portugal tem alguns desses - alguns que ainda estão entre nós - que souberam pôr o amor à pátria acima dos interesses mesquinhos e sempre pontuais da pequena política do momento.

Monday, November 04, 2013

Equivocos da democracia portuguesa - 298

A OIT - Organização Internacional do Trabalho fez um relatório com algumas considerações sobre Portugal. O jornal Público insere na sua edição online de hoje esses considerandos: "O diagnóstico é conhecido: desde o início da crise, em 2008, perdeu-se um em cada sete empregos em Portugal e os trabalhadores jovens e as famílias com crianças pequenas foram os mais afectados. Num relatório divulgado nesta segunda-feira, a Organização Internacional do Trabalho (OIT) propõe soluções. Com custos para o erário público mas que seriam compensados a curto prazo, defende. Uma das questões que a OIT considera fundamentais é a adequação dos benefícios da protecção social, que passaria por um reforço do Rendimento Social de Inserção (RSI) e um aumento do salário mínimo, algo que a organização tem vindo a defender. Assim, "reforçar o RSI significaria alterar a tendência recente de reduções no orçamento atribuído a esta política de combate à pobreza e à exclusão social extremas, reforçando-se sobretudo a atenção dada aos agregados familiares com crianças. Poderá ser eventualmente considerada a articulação do RSI com os programas já existentes de protecção social para crianças", diz a OIT. Quanto à componente salarial, a organização considera que "poderia ser considerada a actualização do salário mínimo nacional de modo a evitar um novo aumento das desigualdades salariais e, indiretamente, das desigualdades de rendimento. Do mesmo modo, o IAS (Indexante de Apoios Sociais) deveria ser actualizado no mesmo sentido." No relatório é dado também enfoque às mudanças introduzidas no Código de Trabalho no que diz respeito às negociações laborais. "A reforma da negociação colectiva de 2011 visou promover acordos ao nível da empresa, entre os empregadores e os trabalhadores. No entanto, até ao momento, a reforma resultou numa redução geral da cobertura dos convenções colectivas, aumentando assim a pressão para a redução dos salários e contraindo ainda mais a procura interna." Por isso, a OIT defende uma nova abordagem da negociação colectiva, não voltando ao que existia, que era muito centrado nos salários e pouco no desenvolvimento de competências e de mobilidade, mas de forma a "construir um ambiente que permita que os salários e as condições de trabalho evoluam em linha com a produtividade, ao mesmo tempo que favorece a recuperação do emprego." Outra das medidas passa por lidar com os constrangimentos financeiros que pesam sobre as pequenas empresas, ultrapassando-se a relutância dos bancos em conceder empréstimos. "Mais de um quinto das pequenas e médias empresas referem que o acesso ao crédito é o seu problema mais premente – daí resultando menores oportunidades para a criação de emprego -, e, quando obtêm novo crédito, vêem-se obrigadas a pagar sobre esses financiamentos taxas de juro que rondam os 5,5%, comparativamente com os 2% o que são cobrados na Alemanha e noutros países da zona euro." Para resolver esta situação, era importante "um avanço célere para uma união bancária na zona euro que desencadearia um progresso rápido", refere a organização. E mais recursos para as políticas de promoção do emprego. Além disso, a OIT sublinha a importância de disponibilizar mais recursos para as Políticas Activas do Mercado de Trabalho, criando e facilitando condições para que os desempregados voltem a trabalhar. Parte das soluções passa por opções políticas. A primeira seria a diminuição da taxa de juros em 1,5 pontos percentuais, o que estimularia o aumento do investimento e do consumo. Em resultado do aumento da procura, o emprego aumentaria em 64.500 postos de trabalho e a taxa de desemprego diminuiria 1,2 pontos percentuais até final de 2015. A segunda opção política seria um aumento das despesas com medidas activas do mercado de trabalho. O emprego aumentaria em cerca de 43.500 e a taxa de desemprego diminuiria 0,8 pontos percentuais até finais de 2015. Esta medida aumentaria as despesas do Governo e os défices fiscais a curto prazo. "No entanto, à medida que o desemprego for estabilizando e posteriormente diminua, as despesas com subsídios de desemprego diminuirão e a base fiscal aumentará." O efeito combinado das duas opções políticas – a redução das taxas de juro e o reforço das políticas de mercado de trabalho – "seria uma diminuição do rácio da dívida pública/PIB de 5,9 pontos percentuais até 2015". No relatório, a OIT refere que há sinais animadores, como a estagnação do desemprego e o aumento das exportações, o que alimenta as previsões de uma recuperação económica em 2014. "Porém, à luz das actuais tendências, a recuperação esperada revelar-se-á demasiado incipiente para provocar qualquer efeito positivo no desemprego", alerta. E explica porquê: "A política orçamental tem sido orientada para uma rápida redução dos défices, os quais haviam atingido proporções alarmantes. As medidas de restruturação do sector público contribuíram directamente para o desemprego. Os cortes nos salários e nas prestações sociais, combinados com certos aumentos fiscais, desgastaram os rendimentos das famílias e a procura interna. Também as empresas foram afectadas pelas condições macroeconómicas excepcionalmente apertadas que prevaleceram desde 2011." " Um relatório que dá que pensar quando olhamos para o nosso país e parece que tudo foi feito ao contrário. Um relatório com considerando que deve ser analisado por todos e, desde logo, pelo governo.

Saturday, November 02, 2013

Equivocos da democracia portuguesa - 297

Terminou ontem mais um debate na generalidade sobre o OE 2014. Um documento que continua a saga do empobrecimento do país e das suas gentes, em nome do pagamento duma dívida que, a menos que venha a ser renegociada, será impossível pagar. Agora liberto das suas funções governativas, Álvaro Santos Pereira afirmou que "a dívida terá que ser reescalonada em 30 ou 40 anos, caso contrário, Portugal não a poderá liquidar". Assim, singelamente, o ex-ministro da economia do governo ultraliberal de Passos Coelho, vem dizer aquilo que muita gente já vem afirmando há já muito tempo. Daí que este OE 2014 seja um documento que para além de continuar com o empobrecimento generalizado do país, nada mais trás de novo. Agora que o país está afundado num abismo - por mais que o neguem os governantes, por alguns sinais infelizmente conjunturais, que vão aparecendo, - é que o executivo se lembrou do PS. (Já agora, convém dizer que estes sinais de pretensa melhoria foram induzidos, ironicamente pelos chumbos do TC. Que fez com que crescesse a procura, e a economia só crescerá pelo aumento desta). Ostracizando este como todos os outros partidos da oposição, este governo ultraliberal, achando que se bastava a si próprio, colocou tudo e todos à margem. Rapidamente verificou que não poderia continuar com esta saga sozinho e vem clamar pelo consenso (leia-se apoio) do PS para subscrever estas políticas. Mesmo assim, e porque os velhos hábitos não se perdem rapidamente, ao mesmo tempo que lhe pedia a mão, ridicularizava as medidas que este apresentava, como ainda ontem foi visível na AR. Na confusão reinante, o governo ultraliberal ainda tentou meter no mesmo saco o OE 2014 e a pretensa reforma do Estado. Coisa que não conseguiu, porque o documento tardio, apenas reflete um emaranhado de generalidades que Portas conseguiu arrebanhar, mais baseado em artigos de opinião do que em bases bem fundamentadas. Manuela Ferreira Leite chamou-lhe um "documento inócuo e sem sentido", o que é de todo verdade, dada a expectativa criada, que levou a que este documento fosse atrasado na sua execução, apenas e só, porque era útil que assim acontecesse para que o executivo pusesse em prática as medidas mais avassaladoras. E a confusão é tal, que levou a que Ribeiro e Castro fizesse um discurso alinhadíssimo com o governo - ele que até tem mostrado a sua discordância com ele - para que a quando da votação vir apresentar uma declaração de voto, sendo seguido pelos deputados da Madeira! Mais coerente foi o deputado do CDS-Madeira que votou contra, tal como tinha acontecido no ano transato. Mas o mais insólito estava ainda para vir. Não nos referimos de todo ao burburinho nas galerias, coisa que até começa a ser habitual, mas na aprovação do documento que não foi sublinhado por uma única palma! Até parece que os deputados da maioria tinham vergonha da sua aprovação e, se calhar, até foi esse o caso. Mais um OE que continua na senda da destruição de direitos, na destruição do estado social, na destruição dos serviços públicos, como o caso da saúde e da educação, que está a transferir-se, despudoradamente, para o setor privado. Apetece-nos aqui citar, adaptando, as palavras de Hemingway,  "por quem os sinos dobram meus amigos. Não vos apoquenteis, são por vós".